JUSTIÇA

Defensorias entram com ação para que o Recife crie abrigos emergenciais durante pandemia do novo coronavírus

Medidas como a vacinação de servidores também fazem parte da ação; confira as dez medidas requeridas

Cássio Oliveira
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Cássio Oliveira
Publicado em 02/04/2020 às 13:00 | Atualizado em 03/04/2020 às 12:20
BOBBY FABISAK/JC IMAGEM
O serviço será oferecido por três meses ou até ter o controle do avanço do coronavírus. - FOTO: BOBBY FABISAK/JC IMAGEM

A Defensoria Pública da União (DPU) no Recife e a Defensoria Pública do Estado de Pernambuco (DPPE) impetraram uma ação civil para que a Prefeitura do Recife e o Governo do Estado cumpram várias medidas de proteção à população em situação de rua na capital pernambucana diante da pandemia do novo coronavírus.

Entre as medidas, as defensorias requerem que seja disponibilizado abrigamento, não compulsório, "em condições de dignidade, salubridade e com a finalidade de garantir o isolamento temporário, a todas as pessoas em situação de rua que solicitem abrigamento ao Município, com preferência às incluídas em grupos de risco". De acordo com a ação, em caso de impossibilidade, é sugerido que sejam utilizados outros equipamentos que estejam com as atividades suspensas em decorrência da pandemia, a exemplo das unidades do Compaz, escolas municipais, ginásios.

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De acordo com o defensor público Henrique da Fonte, do Núcleo de Defesa e Promoção de Direitos Humanos, o melhor caminho não seria a judicialização, mas após reunião com representante da gestão municipal e com representante da gestão estadual, não foram apresentadas medidas ou um planejamento com prazos para ampliar o fornecimento de abrigamento para as pessoas em situação de rua que assim desejassem.

Ainda assim, na ação, as defensoria fazem questão de destacar que a Prefeitura adotou, sim medidas para a essa população vulnerável como a ampliação do acesso à higienização dos usuários nos dois Centros Pops, com a disponibilização de sabão para higiene pessoal, além da garantia da oferta de vinte vagas para isolamento domiciliar no Abrigo Emergencial para a população em situação de rua, para os casos que venham a ser encaminhados pelo serviço de saúde.

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"Até por questão de competências e por repasses, o Estado também é responsável, junto com o município, em situações emergenciais, por essas medidas. Mas a ação trata especificamente das pessoas no Recife e o município é o mais responsável pela execução desse política pública. Tivemos uma reunião com o Estado e outra com o município, precisávamos ouvir e dialogar sobre as medidas adotadas. Mas depois da reunião entendemos que é preciso adotar medidas de forma urgente. A solução extrajudicial é sempre melhor, mas vimos que seria melhor", explicou Henrique.

A ação foi distribuída para a 4º vara da Fazenda Pública no Recife. "Sabemos que o município não tem como abrigar toda essa população. Por isso, sugerimos equipamentos públicos que não estão sendo utilizados, pelo menos de forma emergencial. Pois, caso aconteça uma explosão desses casos (de coronavírus), precisamos estar preparados. Sabemos que a prefeitura tem tomado medias, mas entendemos que algumas outras não estão sendo tomadas", reforçou o defensor público.

No Recife, conforme dados da prefeitura, cerca de 1600 pessoas encontram-se em situação de rua, sendo que 200 delas têm abrigo em casas de acolhida municipais. Alguns ainda possuem residência, mas passam os dias nas ruas da capital pernambucana em busca de trabalho ou doações. Outros, não têm onde dormir. Nas calçadas da área central da cidade, não é difícil encontrar idosos, adultos e crianças - muitos deles doentes - sem acesso à água limpa, sabão ou álcool em gel, itens essenciais para se evitar o contágio do coronavírus.

Além de abrigamento outras ações são pedidas como a garantia de prioridade para vacinação contra gripe dos servidores e das servidoras que trabalham direta ou potencialmente com população em situação de rua no serviço da assistência social, notadamente das unidades de acolhimento da cidade, excetuando-se o abrigo noturno Irmã Dulce, cujos profissionais foram vacinados.

Confira as dez medidas requeridas

a.1) Manter todos os equipamentos da rede de assistência social em funcionamento, dada a essencialidade do serviço, incluindo sobretudo a oferta dos restaurantes populares, garantindo as refeições que já eram fornecidas em momento anterior à pandemia, e os dois Centros Pop, ofertando a possibilidade de banhos e lavagens de roupas, sem prejuízo das demais medidas já anunciadas para o Antigo Liceu e o Armazém 14, sendo estas iniciativas protagonizadas pela sociedade civil;

a.2) Manter a disponibilização de insumos para proteção dos trabalhadores/as e da população, tais como: álcool em gel 70%, máscaras faciais de proteção descartáveis, copos descartáveis nos bebedouros, produtos de higiene pessoal (sabonete, shampoo, pasta de dente, escova de dente), além de outros que sejam indicados pelos gestores de saúde pública e órgãos integrantes do Sistema Único de Saúde;

a.3) Disponibilizar abrigamento, não compulsório, em condições de dignidade, salubridade e com a finalidade de garantir o isolamento temporário, a todas as pessoas em situação de rua que solicitem abrigamento ao Município, com preferência às incluídas em grupos de risco (as pessoas idosas, gestantes e pessoas com doenças crônicas, imunossupressoras, respiratórias e outras comorbidades preexistentes que possam conduzir a um agravamento do estado geral de saúde a partir do contágio, com especial atenção para diabetes, tuberculose, doenças renais, HIV e coinfecções), garantindo a assistência adequada conforme estado de saúde e o cumprimento às recomendações sanitárias de distanciamento, em imóveis com destinação especial a esse fim e, em caso de impossibilidade, sejam utilizados outros equipamentos que estejam com as atividades suspensas em decorrência da pandemia, a exemplo das unidades do Compaz, Escolas Municipais, Ginásios, em tudo contando com a voluntariedade e sensibilização das pessoas interessadas;

a.4) Para as pessoas às quais não seja recomendado o abrigamento ou que não apresentem o desejo para abrigamento, disponibilizar a opção de concessão de BENEFÍCIO EVENTUAL, viabilizando a locação de imóvel para fins de moradia, flexibilizando a documentação exigida para a obtenção do benefício;

a.5) Ampliar as vagas destinadas para as pessoas em situação de rua sintomáticas, com confirmação ou suspeita de infecção, sem necessidade de tratamento hospitalar, para além das 20 (vinte) vagas inicialmente disponibilizadas pelo Município, seja no Abrigo Emergencial da Travessa do Gusmão, seja em outros equipamentos ou imóveis destinados a essa finalidade, a exemplo de hoteis e estabelecimentos congêneres, por meio de pagamento de diárias ou requisição de serviços com indenização posterior, conforme dispositivos legais apresentados;

a.6) Garantir o fornecimento de água potável, banheiros com chuveiros e espaço para lavagem de roupas nos Centros POP e, sem prejuízo deste serviço, implantar mais pontos de cuidados, seja por meio de imóveis públicos ou de outra natureza, com acesso à água potável, banheiros com chuveiros, espaço para lavagem de roupas e outras medidas de higiene necessárias, além dos já noticiados pelo Estado e Município (antigo Liceu, Armazém 14 e junto aos Atitudes de Campo Grande e Jaboatão dos Guararapes), garantindo-se a descentralização do serviço pelas regiões político administrativas do Município do Recife, para além da Região Político Administrativa 1 (RPA1), conforme concentração e distribuição da população em situação de rua;

a.7) Ampliar o fornecimento de alimentação gratuita, consistente em três refeições diárias, sem vinculação a prévio cadastro, garantindo-se a descentralização do serviço pelas regiões político administrativas do Município do Recife, para além da Região Político Administrativa 1 (RPA1), conforme concentração e distribuição da população em situação de rua;

a.8) DISTRIBUIR material informativo e realizar ações educativas, em linguagem clara e acessível, sobre a doença e meios de evitá-la, sem prejuízo das estratégias de comunicação oral já adotadas;

a.9) GARANTIR prioridade para vacinação contra gripe dos servidores e das servidoras que trabalham direta ou potencialmente com população em situação de rua no serviço da assistência social, notadamente das unidades de acolhimento da cidade, excetuando-se o abrigo noturno Irmã Dulce, cujos profissionais foram vacinados;

a.10) AMPLIAR atendimento às crianças e adolescentes em situação de rua, articulando com entidades da sociedade civil que já trabalham com esse público, inclusive por meio de apoio financeiro e/ou logístico, a fim de promover acolhimento especializado, viabilizando abrigamento e medidas de saúde e higiene direcionados, de modo específico, a essa população;

CONFIRA RESPOSTA DO ESTADO

A Procuradoria Geral do Estado de Pernambuco (PGE-PE) informa que o Estado não foi intimado da ação, mas que prestará todas as informações que venham a ser requisitadas.

Ressalta ainda que o Governo do Estado já vem realizando uma série de ações para atendimento à população em situação de rua, por meio da Secretaria de Políticas de Prevenção à Violência e às Drogas, conforme divulgado.

A PGE lembrou ainda que o governo de Pernambuco iniciou uma ação apoiar população em vulnerabilidade que visa atender até 500 pessoas diariamente durante a semana. A campanha "Pernambuco Solidário contra o Coronavírus", teve início na terça-feira (31/03), no bairro do Recife Antigo, conta com apoio de voluntários e tem como finalidade proporcionar instalações para a população tomar banho, receber alimentação e ter orientações sobre como se prevenir da Covid-19.

A Prefeitura do Recife não respondeu a reportagem.

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