ESTAGNAÇÃO

A atual década será perdida em termos de crescimento econômico

Em 120 anos, esta será a década que o Brasil vai ter o menor crescimento econômico, segundo um levantamento feito pelo economista do IBRE/ FGV Marcel Balassiano

Angela Fernanda Belfort
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Angela Fernanda Belfort
Publicado em 05/07/2020 às 11:06 | Atualizado em 06/07/2020 às 15:03
Biana Gens/ Divulgação FGV/IBRE
É uma crise mundial e, praticamente, a maioria dos países terá PIB negativo. A grande questão é como as economias vão se recuperar sem os estímulos que foram implantados na pandemia", analisa o economista da FGV Marcel Balassiano, sobre o auxílio emergencial no Brasil - FOTO: Biana Gens/ Divulgação FGV/IBRE

O Brasil vai amargar uma década sem crescimento econômico. “Será a década mais perdida dos últimos 120 anos. Até mais do que a década de 1980, que ficou conhecida como a perdida”, resume o economista Marcel Balassiano, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas e autor de um estudo que compara o crescimento do País, por décadas, desde 1901. A atual década vai apresentar um crescimento médio de -0,1% ao ano.Na conclusão do trabalho, ele cita a necessidade de “agendar” reformas, como a tributária e a administrativa, que podem contribuir para a retomada da economia tão necessária depois da pandemia.

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A expectativa do Ibre é de que ocorra uma queda de 6,4% do PIB brasileiro em 2020. “Essas reformas podem aumentar a produtividade, fazer com que surjam mais empresas e mais empregos”, comenta o economista. “A questão tributária complica muito o ambiente de negócios no Brasil”, fala Marcel.

Num primeiro momento, a reforma tributária vai simplificar a cobrança dos impostos nas três esferas (União, Estados e municípios), mas não vai diminuir a carga tributária, atualmente em torno de 35% do Produto Interno Bruto (PIB) do País. “Mesmo sem o coronavírus, a atual década já seria perdida. Antes da pandemia, a previsão era de um crescimento de 2% este ano, o que resultaria num aumento médio de 0,8% ao ano entre 2011 e 2020”, afirma Marcel.

Na década de 1980, este crescimento ficou em 1,6%, em média, ao ano. Na atual década, o Brasil ainda cresceu, em média, 3% ao ano entre 2011 e 2013. E os últimos sete anos foram desastrosos, como afirma o estudo "Década Cada Vez Mais Perdida na Economia Brasileira e Comparações Internacionais".

O economista cita alguns fatos que contribuíram para a década perdida: a eleição “até então a mais polarizada”, de 2014, a recessão entre 2014 e 2016, o Brasil gastando mais do que arrecada desde 2014, o impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT), uma denúncia envolvendo o então presidente Michel Temer (MDB), que praticamente paralisou a administração um ano antes do seu término, a gestão até agora do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) – que em um ano e meio passou por várias crises políticas, incluindo críticas do presidente e seus seguidores ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal (STF) – e, por último, a recessão provocada pelo coronavírus, com o inevitável isolamento social.

“Esse último atingiu um dos principais setores da economia brasileira: o de serviços”, argumenta Marcel. “A incerteza dificultou a retomada do crescimento do Brasil. Grande parte dessa incerteza veio da política. Muitas das reformas estruturadoras que precisamos têm que passar pelo Congresso Nacional. Não pode ocorrer essa demonização da política. O atual governo tem que conversar com o Centrão, como fizeram os ex-presidentes Lula (PT) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB). O Brasil tem muito a ganhar com uma relação harmoniosa com o Congresso para avançar na agenda de reformas. Centrar nas reformas seria mais produtivo para o País do que ficar discutindo se vai ter impeachment, se o ministro da Educação tem doutorado e por aí vai...”, opina Marcel.

Para ele, a principal consequência dos anos de crise desta década foram os 70 milhões de brasileiros que ficaram numa situação econômica vulnerável antes da pandemia.
Para o economista-chefe da Austing Rating, Alex Agostini, as reformas mais importantes são a administrativa e a tributária. “A administrativa pode deixar as três esferas do governo com mais recursos para investir em áreas importantes, como saúde, educação e segurança. Nesta década, o ambiente político atrapalhou mais do que ajudou ao Brasil. Nesse período, o mundo cresceu, e o Brasil, não”, analisa. Ele também diz que o Brasil tem que ajustar as suas contas, parando de gastar mais do que arrecada.

CONGRESSO

O deputado federal Danilo Cabral (PSB) acredita que as reformas podem ajudar na retomada do crescimento em 2021. “A reforma tributária praticamente não andou no Congresso este ano. O Brasil vai ter um aumento da dívida com a covid-19. Não se pode deixar o mesmo sistema tributário que penaliza quem está na base. Nem vai se conseguir aumentar a carga tributária de 35% que é alta para o custo benefício que oferece ao contribuinte”, resume o parlamentar.

O Brasil se endividou mais para implantar as ações emergenciais de enfrentamento ao coronavírus e já está no vermelho – gastando mais do que arrecada – desde 2014. Por isso, Danilo sugere que o Congresso Nacional poderia estudar outras iniciativas, como a retirada das desonerações (de impostos) dadas pelo governo federal, que somam R$ 400 bilhões por ano. “Não há indicação de que essa desoneração esteja preservando a economia nem beneficiando o emprego”, conclui.

Para retomar o crescimento, Danilo cita que o governo deve continuar dando atenção à educação. “Os países que optaram pela educação no pós-guerra se desenvolveram. É um caminho estratégico para a reconstrução do Brasil”, defende. Outra reforma que promete aquecer a discussão política é a administrativa. “Ela vai ter que passar por uma discussão sobre o tamanho do Estado brasileiro. Uma parte do governo defende um Estado mínimo. Com a pandemia, percebemos que o Estado vai ter que fortalecer o braço que responde pela proteção social e desenvolve ações na área de saúde, educação e assistência social”, comenta o socialista.

Ainda na reforma administrativa e no pacto federativo também deve ser discutido o alto custo do Estado brasileiro. No Brasil, uma parte do poder público faz licitações que fogem dos preços aceitáveis na compra de bens e serviços.

O deputado federal Sílvio Costa Filho (Republicanos) defende o aumento do repasse dos recursos dos impostos para os Estados e municípios no novo pacto federativo. “Essa proposta (do pacto) já chegou ao Senado para 2021. Estamos analisando a possibilidade de criar indicadores de boa gestão na área de educação, saúde e previdência. Teriam uma bonificação maior de recursos os que tirassem notas boas”, explica Sílvio, ao ser questionado se vai haver uma cobrança de eficiência no uso do dinheiro público.

Segundo Sílvio, “é preciso focar na agenda das reformas que o Brasil precisa. É importante que o presidente (Jair) Bolsonaro (sem partido) tenha a compreensão que ele precisa, cada vez mais, dialogar com as instituições para que o Brasil avance”, argumenta. Ele cita estudos que projetam um crescimento de 1,5% a 2% do PIB no primeiro ano da implantação da reforma tributária.


Já o deputado federal Fernando Monteiro (PP) considera que a aprovação das reformas tributária e administrativa contribuíriam para retomada do crescimento porque “sinaliza um País com mais segurança jurídica atraindo investidores”.

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