Entrevista

''Ciclo PT/PSB entrou em colapso em Pernambuco", diz Bruno Araújo, presidente do PSDB

Durante entrevista, o tucano ainda defendeu o nome de Mendonça Filho (DEM) para a corrida à Prefeitura do Recife e disse que sairá da vida pública em 2021

Renata Monteiro
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Renata Monteiro
Publicado em 09/08/2020 às 12:26 | Atualizado em 09/08/2020 às 12:31
RICARDO B. LABASTIER/ACERVO JC IMAGEM
TERCEIRA VIA Segundo Araújo, legendas buscam construir uma candidatura única; Doria tem 3% nas pesquisas - FOTO: RICARDO B. LABASTIER/ACERVO JC IMAGEM

Há pouco mais de um ano no comando nacional do PSDB, o pernambucano Bruno Araújo é firme ao defender as diretrizes do partido nas eleições de 2020 e 2022. Sobre o Recife, por exemplo, não titubeia ao defender o nome do ex-governador e ex-ministro da Educação Mendonça Filho (DEM) na corrida à prefeitura pelo grupo de oposição que tentou - sem sucesso - tirar o governador Paulo Câmara (PSB) do poder na última eleição. Ao falar sobre o cenário nacional, faz críticas ao governo de Jair Bolsonaro (sem partido) e diz que o núcleo tucano se prepara para apresentar uma nova proposta de gestão ao País, mas afirma não se arrepender de ter votado no capitão da reserva em 2018. Com um histórico de mais de 20 anos na vida pública, tendo sido deputado estadual, deputado federal e ministro de Estado, Bruno conta ao JC que assim que deixar o comando do PSDB, em maio de 2021, se dedicará “exclusivamente à vida privada”, encerrando um ciclo que ele diz ter cumprido com “muita dedicação”.

JORNAL DO COMMERCIO - Atualmente, no grupo de oposição do qual o PSDB faz parte em Pernambuco, duas pré-candidaturas estão postas, a do deputado federal Daniel Coelho (CID) e a do ex-governador Mendonça Filho (DEM). Já há uma previsão de quando o grupo vai decidir o nome que será oficializado? Na sua opinião, qual dos dois deveria encabeçar a chapa?

BRUNO ARAÚJO - Nós vivemos um momento muito difícil em Pernambuco, porque além da crise econômica e do coronavírus, o Estado perdeu o encanto. Até o final do ciclo de 16 anos de Jarbas (Vasconcelos, MDB) e Eduardo Campos (PSB) no poder, Pernambuco vinha esquecendo aquela comparação com a Bahia, mas depois dessa fase a comparação começou a se recompor na mente do pernambucano. A Bahia que, tanto na administração estadual quanto na gestão da capital, está nadando de braçada em relação ao que Pernambuco tem feito nos últimos anos. Pernambuco perdeu o encanto, saiu da vitrine de um Estado queridinho do investimento nacional. Recife perdeu muito o brilho, sobretudo se você a compara com o que está acontecendo no salto qualitativo da administração de uma cidade como Salvador. E tudo isso nos leva a ter uma preocupação muito maior com essa eleição, não apenas porque sou um dirigente partidário, mas porque sou pernambucano e recifense. Nós fizemos uma opção por Mendonça, não só pela aliança nacional entre o PSDB e o DEM, mas pela compreensão de que, neste momento, ele é o quadro mais preparado para o enfrentamento do que será 2021, o ano fiscal mais grave da história do Brasil, enquanto República. Nós teremos um colapso das finanças públicas em 2021. Em 2020 o mundo autorizou a emissão do dinheiro necessário, mas em 2021 virá a realidade fiscal. E o Recife, assim como todas as cidades brasileiras, vai sentir isso na pele. E Mendonça tem as características e a experiência pública mais preparadas para esse momento. Mas nós estamos ainda em um processo de construção da possibilidade de consolidar uma segunda candidatura nas oposições e mantermos duas, a de Patrícia (Domingos, Podemos), já posta, e uma segunda, que eu espero que possa ser a de Mendonça, para enfrentar um dos momentos mais graves pelo qual o Recife vai passar ao longo do ano que vem e evitar um ciclo de 24 anos de alternância entre PT e PSB, que entrou em colapso. Está na hora de termos outra alternativa e, sobretudo, começar a trilhar um caminho para o Recife recuperar o que teve, a partir do início dos anos 2000, e voltar a ser uma cidade competitiva, pois tem perdido um espaço muito importante para Salvador e Fortaleza.

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JC - Na sua avaliação, o lançamento de pelo menos três candidaturas da esquerda (PSB, PT e PDT) no Recife beneficia ou prejudica o grupo de oposição? Politicamente, como o senhor enxerga esse momento de fragmentação da Frente Popular?

BRUNO - Há, sim, uma pulverização da esquerda e, antes da pulverização da esquerda, há uma pulverização da família Arraes. Os dois principais quadros que se lançaram até agora já dividem votos dentro da disputa de quem herda o ativo da esquerda na história de doutor (Miguel) Arraes. Então essa divisão começa antes, com a pulverização dentro da própria família, com a divisão desse protagonismo e com uma outra pulverização, que está se dando no campo da esquerda. Na oposição há uma pulverização também, o que torna o jogo competitivo, com a possibilidade de um candidato que represente a esquerda pernambucana, mais provavelmente do ciclo PT/PSB, que é esse mesmo ciclo dos herdeiros da história de Miguel Arraes, encontrando-se com um candidato do campo da oposição no segundo turno. Acho que isso pode tornar a oposição favorita num segundo turno, na compreensão de que o pernambucano tende a interromper um ciclo tão longo de alternância de poder entre PT e PSB.

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JC - Em uma entrevista recente, o senhor disse que o caminho do PSDB é a oposição ao governo federal. O senhor se arrepende de ter apoiado o presidente Jair Bolsonaro no segundo turno, em 2018?

BRUNO - Não tenho nenhum arrependimento, porque nós não podemos julgar a história pela leitura do presente. Nós tivemos uma eleição plebiscitária em 2018. Tínhamos três alternativas: votar no PT, votar em Bolsonaro ou abstenção. Eu nunca me abstive de qualquer posição política na minha vida. Eu fiz oposição a vida toda ao PT. Eu fui um líder, junto com Rodrigo Maia (DEM), Mendonça Filho (DEM) e alguns outros parlamentares no processo de impedimento da presidente Dilma Rousseff (PT). Nós já sabíamos quais eram as consequências de uma nova gestão do Partido dos Trabalhadores. Então fizemos uma aposta, uma aposta com um grau de esperança. O governo Bolsonaro demonstrou-se, depois disso, extremamente agressivo, com comportamentos que não têm nada a ver com a nossa formação política. Do ponto de vista econômico, contou com o PSDB para as mais importantes reformas que precisou fazer. Na reforma da Previdência teve o PSDB como relator na Câmara e no Senado. E no marco legal do saneamento, agora aprovado, contou com a minha iniciativa, enquanto ministro das Cidades, que encaminhei o texto ao presidente Michel Temer (MDB). Da Medida Provisória apresentada no governo Temer sobre o tema nasceu a negociação do PL (Projeto de Lei) do marco legal do saneamento, que inclusive foi muito criticado à época pelo governo de Pernambuco e pela Compesa, mas depois vieram os elogios. Então não há arrependimento. Hoje, com as informações que eu tinha em 2018, eu votaria de novo em Bolsonaro. A minha esperança foi muito maior do que a entrega produzida até aqui pelo governo federal. É bom lembrar que, antes do isolamento, antes de 17 ou 15 de março, o Brasil já tinha o PIB negativo do 1º trimestre formalizado pelos órgãos que acompanham esses índices econômicos. De modo que, mesmo do ponto de vista econômico, antes da pandemia o governo já deixava muito a desejar.

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JC - Não é segredo que o PSDB desenha um projeto para 2022, possivelmente encabeçado pelo governador de São Paulo, João Doria. Como está ocorrendo essa construção no partido? Como a sigla tem trabalhado possíveis alianças?

BRUNO - O PSDB é um partido que disputa a presidência desde 1994 e em duas eleições venceu no primeiro turno para Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O PSDB, eu tenho dito, não vai entregar prato feito, vai discutir com o campo do centro, a centro-esquerda, a centro-direita, um espectro ideológico mais largo, a possibilidade de encontrar um candidato que possa chegar ao segundo turno com o Bolsonaro, e isso significa que não vamos chegar com um candidato pronto, mas obviamente que internamente nós temos o protagonismo do governador João Doria (São Paulo), nós temos quadros importantes como o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, nós temos senadores conceituados, como Tasso Jereissati. O governador João Doria obviamente desponta como o favorito nesse processo, mas nós vamos discutir nesse campo, do centro, um centro de espectro largo, alternativas para que tenhamos o menor número de candidatos possível para evitar, inclusive, um segundo turno com o PT. O nosso projeto é nos manter distante de Bolsonaro e distante do PT.

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JC - Na sua concepção, está ocorrendo uma reorganização do centro político no Brasil? Qual sua opinião sobre os movimentos suprapartidários que vêm se estruturando nos últimos meses? Nomes do PSDB, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, inclusive, fazem parte de de alguns deles. Há espaço para diálogo entre o PSDB e partidos de esquerda?

BRUNO - Esse movimento é natural. O bolsonarismo e o petismo estão, naturalmente, fazendo com que esse campo (centro), que não toca nesses extremos, dialogue. Esse diálogo tem crescido e o PSDB tem, institucionalmente, inclusive, participado de muitas dessas discussões ao centro e até um pouco mais à esquerda, embora seja necessário relembrar que há grupos consistentes de discussão de centro-direita que estão afastados do bolsonarismo e participam da mesma forma desse ambiente. Mas tudo isso precisa ser melhor articulado, melhor discutido entre os partidos políticos, para que as candidaturas que nasçam desses movimentos sejam pouco pulverizadas, para garantir ou dar uma chance mais exitosa de participação em um segundo turno contra o presidente Bolsonaro, que já mostra crescimento no Nordeste por conta do pagamento do auxílio emergencial. Tudo isso vai influenciar o processo de 2022.

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JC - Recentemente figuras históricas do PSDB, como o ex-governador Geraldo Alckmin e o senador José Serra viraram alvo da Polícia Federal. Como o partido está lidando com essas questões, já que, no passado, foi alvo de duras críticas com relação ao seu posicionamento em relação a acusações contra o deputado federal Aécio Neves?

BRUNO - Os partidos de grandes democracias do ocidente viveram crises e, com o tempo, suas reformulações foram o remédio para isso. Nós assistimos na história de Pernambuco, por exemplo, o PSB viver uma grande crise no ano de 1998, um dos momentos mais difíceis da história do partido. Oito anos depois, porém, o PSB se tornou a maior força política do Estado. O PSDB não funciona na pessoa física, funciona na pessoa jurídica. Em 2018, mesmo ano em que nós tivemos um resultado pífio na eleição nacional, nós elegemos os governadores do Rio Grande do Sul, de São Paulo, do Mato Grosso do Sul. O PSDB governa, neste momento, 48 milhões de munícipes. Prefeitos do partido governam 48 milhões de brasileiros. Nós temos mais de 1200 candidatos a prefeito. Somos o partido favorito nas capitais do País. Segundo pesquisas, somos o partido favorito nas 100 maiores cidades do Brasil. Por que? Porque o PSDB nunca teve em seus quadros ninguém maior do que o partido. Não há prisão perpétua na legislação brasileira nem há condenação perpétua pelos erros que o PSDB pode ou não ter cometido. Eu digo sempre que obviamente cada eleição é uma eleição, acho que o PSDB já pagou uma conta política em 2018. Em 2020 há quadros novos e o que mantém o PSDB vivo é a qualidade dos seus quadros, as alternativas que são colocadas à disposição dos eleitores e é isso que vai manter o PSDB com resultado eleitoral importante. Nós estamos confiantes de ganhar a eleição na maior cidade da América Latina, São Paulo, o que é uma demonstração de que o PSDB continua vivo. Eu tenho a missão de fazer a melhor entrega possível para esse resultado eleitoral. Eu deixo vida pública no momento em que entregar a presidência do PSDB, no mesmo dia. E quero que, na minha passagem pela vida pública, poder ter entregue resultado não igual a 2016, mas mostrar que o PSDB continua sendo uma alternativa de qualidade para enfrentar os problemas reais da vida do País.

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JC - Seu mandato no PSDB vai até 2021. Pensa em concorrer à presidência do partido novamente?

BRUNO - Não penso. Penso em concluir o meu mandato em maio e, no dia em que deixar a presidência do partido, eu deixo de forma definitiva a vida pública e espero ter dado a minha contribuição ao meu Estado, ao meu País e para o partido no qual militei em todos os meus mandatos e tive a honra de presidir.

JC - E por qual razão deixará a vida pública, sendo ainda tão jovem (48 anos)?

BRUNO - Foram seis eleições, cinco mandatos de deputado, ministro de Estado, líder de partido, presidente de Assembleia, entregas importantes feitas no País, como regularizações fundiárias, o próprio marco legal do saneamento, que agora foi concluído, o código nacional de ciência, tecnologia e inovação brasileiro, milhares de obras entregues pelo Ministério das Cidades, uma contribuição longa, de 20 anos de vida parlamentar, e minha contribuição de vida pública foi devidamente entregue. A partir daí eu passo a me dedicar exclusivamente à vida privada e acho que pude cumprir o meu ciclo entregando com muita dedicação a minha passagem pela vida pública.

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