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Requerimento com possível ilegalidade é aprovado na Câmara do Recife; vereadores devem entrar com mandado de segurança

De acordo com parlamentares, a solicitação em si é legal, o que a torna ilegal são os projetos do Executivo que devem ser apreciados a partir dela

Alice Albuquerque
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Alice Albuquerque
Publicado em 21/12/2020 às 16:05 | Atualizado em 21/12/2020 às 16:20
Chico Porto/JC Imagem
Vereadores devem entrar com mandado de segurança com pedido de liminar contra o presidente da Casa, Eduardo Marques (PSB) por ter colocado em pauta requerimento que aprovou a convocação extraordinária para "votar ilegalmente" os PLEs 24 e 25/2020 - FOTO: Chico Porto/JC Imagem

Além da aprovação do novo Plano Diretor, a Câmara do Recife também aprovou, na última sessão ordinária do ano, um requerimento de autoria do líder do governo Eriberto Rafael (PP) para realização de sessões extraordinárias no período de 23 a 30 de dezembro para a votação de três projetos de lei. A discussão entre os parlamentares foi acerca da possível ilegalidade de duas matérias do Executivo dispostas a serem votadas nas reuniões extraordinárias. De acordo com o regimento interno, os projetos deveriam ter sido protocolados até 18 de novembro. Os vereadores Renato Antunes (PSC) e Ivan Moraes (PSOL) devem entrar com um mandado de segurança com pedido de liminar contra o presidente Eduardo Marques (PSB).

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Os projetos do Executivo previstos para serem discutidos nas sessões extraordinárias são o 5/2020, que dispõe sobre o desmembramento e posterior ampliação da Zeis Ibura e Jordão, na Casa desde 12 de março de 2020, o PLE 24/2020 que acrescenta o art. 15-A da lei municipal nº 16.719 de 30 de novembro de 2001, protocolado em 16 de dezembro de 2020, e o PLE 25/2020 que visa promover a reestruturação da administração direta e indireta do município do Recife, extingue e transforma cargos comissionados e funções gratificadas e dá outras providências, protocolado no dia 18 de dezembro de 2020. 

Logo no pequeno expediente o vereador Ivan Moraes (PSOL) solicitou ao presidente da Câmara, Eduardo Marques (PSB) a retirada da matéria de pauta, mas teve o pedido indeferido. "O requerimento sugere que a gente faça ainda esse ano sessões extraordinárias esse ano para aprovar Projeto de Lei do Executivo (PLE) que foram protocolados nesta Casa fora do prazo a que indica o nosso regimento".

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Em seguida, Ivan discutiu a matéria e apontou a problemática da proposição, "estamos prestes a cometer um ato de ilegalidade". "Não vou nem entrar no mérito dos projetos, temos três que devem ser demandados numa extraordinária, um deles é bom, o PLE 05, que já foi protocolado no prazo, passou o tempo das comissões e podem muito bem ser votado numa extraordinária. Mas temos outros dois projetos, os PLEs 24 2 15 que foram protocolados nos últimos dias e não dá mais tempo para que a gente possa discuti-los nas comissões e votar nessa reunião extraordinária".

O parlamentar explicou as disposições do regimento interno e da Lei Orgânica do Recife sobre a apreciação das duas matérias do Executivo. "O art 241 do nosso regimento é muito eloquente, fala que todas as proposições sujeitas à deliberação do plenário, com exceção de requerimentos e comissão executivo, somente serão despachadas pela presidência da Mesa às comissões técnicas até 18 de novembro de cada ano. Ou seja, qualquer projeto que a gente venha a votar e não seja requerimento ou da mesa diretora, teria que ter sido protocolado até 18 de novembro para que pudesse seguir às comissões, mesmo em regime de urgência, e que elas pudessem expor seus pareceres. No seu art 285, diz que toda proposição recebida será numerada, datada e despachada das comissões os requerimentos e proposições, iniciativas da comissão executiva. Nem o PLE 24, que trata de um tema bastante difícil que a gente discorda sobre a flexibilização de coeficientes construtivos em Zonas de Interesse Social (ZEIS), ou seja, a destruição do programa de regularização das Zeis".

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"Mesmo se não fosse pelo mérito, esse PLE acabou de ser protocolado na última sessão que fizemos (na quinta-feira, 17). Não dá para ir às comissões e não dá para ter parecer no tempo que manda o regimento. É preciso que se diga: essa sessão extraordinária pode ser convocada, mas não podem ser votados nem o PLE 24 nem o 25, nosso regimento não permite. Trago mais uma vez ele no art 120 que diz que pode convocar, sim, uma reunião extraordinária, o que não pode é nenhum projeto ser votado e nem ir para as comissões. Sugiro que a gente rasgue o mesmo regimento e escreva um que diz 'se fará nessa Casa a vontade do prefeito', porque parece que essa é a grande tábua sobre a qual se escoram várias decisões que têm sido tomada nesta Casa. Isso cabe mandado de segurança e o nosso mandato está disposto a fazer isso, cabe todo tipo de ação judicial que tornará nula essa sessão". Ao JC, o Ivan Moraes informou que o pedido de liminar contra o ato do presidente da Câmara já estava sendo redigido pela sua equipe. 

Em aparte, o líder da oposição Renato Antunes (PSC) corroborou com a colocação de Iavn e criticou a matéria, "não podemos votar projetos de leis que entraram fora do prazo", pediu vistas da matéria e também afirmou que correrá atrás das medidas legais para impedir a votação. "O requerimento é muito claro quando diz quais são os projetos que serão votados. A gente faz um apelo ao presidente Eduardo Marques pelo bom senso, um vereador de sete mandatos, que não permita que essa Casa legislativa incorra à legalidade, e de antemão já reforço a ideia de que entraremos com todas as medidas legais para impedir essa votação, em respeito a esta Casa e ao poder legislativo. Isso não é uma fala de oposição, é de vereadores que prezam pelo regimento e pela lei orgânica".

A vereadora Aline Mariano (PP) pediu prudência à votação para que posteriormente a matéria não seja anulada. "Entendemos a urgência, mas não a capacidade que tem os ex-vereadores de aprovarem uma matéria que evidencia algo notoriamente acerca do ano seguinte, de uma legislação nova. Portanto, é importante que essa Casa possa fazer as considerações que foram levantadas pelos vereadores Ivan Moraes e Renato Antunes do risco que corremos de ter esse ato nulo. Não me lembro durante os 12 anos como vereadora de ter votado uma reforma dessa forma, sodada, no apagar das luzes de uma legislatura para a outra".

O líder do governo, Eriberto Rafael (PP) defendeu a sua proposição e comentou uma situação parecida que aconteceu em 2012. "A justificativa para apresentar essas sessões foi baseada no art 210 do regimento interno, onde diz que no período de recesso as reuniões serão convocadas pelo prefeito, presidente da Câmara, maioria absoluta dos vereadores ou iniciativa popular de 1% dos eleitores, obedecido o disposto no inciso 1º do art 30 da lei orgânica, em todos os casos, com maioria absoluta dos vereadores. Temos já um precedente que ocorreu em 2012, justamente para votar essa reforma administrativa, que foi para a gestão de Geraldo Julio (PSB) e a lei está aí vigente, o que nos dá essa segurança jurídica de fazê-lo novamente", disse. Por sua vez, Ivan ponderou que descumprimento da lei uma vez "não quer dizer que pode descumprir de novo".

De acordo com André Régis (PSDB), à época mencionada por Rafael, o prefeito eleito já queria assumir com uma nova estrutura. "Acredito que a razão da discussão é o prefeito querer assumir em conformidade com o projeto que ele submeteu às urnas. Quanto a legalidade, a discussão é pertinente se fere ou não o regimento interno e a lei orgânica. É conveniente para a atual legislatura, sem tempo para estudar a matéria, aprovar a reforma administrativa do prefeito João Campos, facilitando a sua vida para que ele já assuma com um secretariado totalmente estruturado da forma que ele quer? Votarei à favor da sua condição de líder da oposição (votará contrário seguindo a orientação de Renato) por entender que não é conveniente em poucos dias a Câmara aprovar, como foi em 2012".

Também na defesa do governo e da solicitação do colega parlamentar, o vereador Rinaldo Júnior (PSB) exaltou o presidente Eduardo Marques, "se ele colocou na pauta ele deve ter suas razões", e pediu que Eduardo se pronunciasse sobre a situação. "Estamos todos defendendo a integralidade do regimento da Casa, como aprendi com o saudoso Carlos Gueiros, a Casa tem que estar acima de tudo, e desrespeitar o regimento é desrespeitar os vereadores. Queria ouvir a procuradoria e que o presidente se pronunciasse para a gente tomar uma decisão e não sofrer futuramente".

Atendendo o pedido, Eduardo Marques reafirmou que "se está na pauta é porque há possibilidade dentro do regimento interno". "Mas foi pedido vistas do vereador Renato Antunes e nós estamos aceitando", recuou.

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No entanto, já em outra discussão, o presidente da Casa de José Mariano informou que o pedido de vistas não poderia ser aceito. "Revendo e estudando o regimento interno da Casa, pudemos perceber que de acordo com o art 319 secção 6 do pedido de vistas, do parágrafo 10 onde diz que não será admitida a concessão de vistas e o inciso 5 a requerimento, exceto em relações mencionadas 1, 2, 3 4, 6 e 7 do art 264 eu volto atrás e não posso conceder vistas por não prever a possibilidade de vistas a requerimento dessa natureza, sendo assim, ele volta à pauta", explicou.

Na justificativa do voto, Antunes confessou ter se assustado com o resultado da votação, "até mesmo de termos pautado o requerimento". "A pauta não respeita o regimento interno desta Casa. Terminamos o ano de forma melancólica afrontando as técnicas administrativas, e esse é um mau exemplo que a Casa está dando para os 17 novos vereadores eleitos que estarão na próxima legislatura. O recado que estamos dando é que não vale a pena ter regimento, o que vale é a pauta imposta daquele que comanda o Executivo da cidade. Rasgamos os princípios republicanos".

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