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Vereadora quer mudar nome da Estrada do Bongi, no Recife, em mais uma homenagem a Eduardo Campos

Popular líder político do Estado, o ex-governador já tem inúmeros monumentos e repartições públicas batizadas com o seu nome

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Katarina Moraes, José Matheus Santos, Marcelo Aprígio

Publicado em 19/05/2021 às 7:41
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Mais uma via pública de Pernambuco pode receber o nome do ex-governador do Estado Eduardo Campos, morto em um acidente aéreo em 2014, durante a campanha presidencial. Isso porque um projeto de lei da vereadora Natália de Menudo (PSB) prevê que o nome da Estrada do Bongi, no bairro de mesmo nome, na Zona Oeste do Recife, seja alterado para homenagear o político que governou Pernambuco de 2007 a 2014. Se aprovada a mudança, a via passaria a ser chamada oficialmente de Rua Estrada do Bongi Governador Eduardo Campos.

Ao justificar o projeto, a parlamentar relembrou a trajetória política do ex-governador, que foi deputado estadual, deputado federal e candidato à Presidência da República, além de presidente do seu partido, o PSB. "Trata-se de uma  homenagem justa considerando a importância que Eduardo Campos teve para o Recife, para Pernambuco e para o Brasil", argumentou a vereadora ao defender a mudança do nome da rua.

Leia também: Qual a prioridade na hora de batizar as ruas do Recife, conveniência política?

De teleférico a avenida

Foto: ABr
Eduardo Campos (PSB) - Foto: ABr

Popular líder político do Estado, o ex-governador tem inúmeros monumentos e repartições públicas batizadas com o seu nome. No interior de Pernambuco, as homenagens a Eduardo Campos são inúmeras. Algumas delas incluem teleférico, barragem e estádio de futebol.

Em Bonito, no Agreste, uma das cidades mais voltadas ao turismo em Pernambuco, o teleférico se chama Eduardo Campos. A plataforma de transporte foi inaugurada em abril de 2018.

O teleférico de Bonito tem 1.200 metros de extensão e dispõe de quatro cabines (duas subindo e duas descendo), que comportam quatro pessoas sentadas (cada). O ponto de partida é o pátio de eventos do município e o desembarque é no alto da Capela de Nossa Senhora do Monte Serrat, aberta em 30 de maio de 1954. Os ingressos custam R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia entrada). Ele funciona das 9h às 17h, de quinta-feira a domingo.

Em Machados, também no Agreste pernambucano, o nome de Eduardo Henrique Accioly Campos batizou o estádio de futebol da cidade. O espaço esportivo foi inaugurado em dezembro de 2020, em meio à pandemia, e tem alambrado, arquibancada, banheiros, calçada externa, gramados, iluminação de LED, muro, urbanização no entorno (com passeio de piso intertravado) e vestiários.

A Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) ainda aprovou, em outubro de 2016, que a barragem de Serro Azul, em Palmares, na Zona da Mata Sul do estado, passasse a ser chamada de barragem Governador Eduardo Campos. Concluída em 2017, a represa serve de alívio para a barragem de Jucazinho, localizada em Surubim, no Agreste, e beneficia o abastecimento de água na região de Palmares.

Além disso, a Alepe tem o plenário da Casa com o nome de Eduardo Campos. O prédio da Assembleia, inaugurado em agosto de 2017, tem o nome do avô dele, o ex-governador Miguel Arraes.

Foto: Foto: Diego Nigro/Arcevo JC Imagem
Compaz Eduardo Campos - Foto: Foto: Diego Nigro/Arcevo JC Imagem

Em 2016, o primeiro Centro Comunitário da Paz (Compaz) inaugurado pela Prefeitura do Recife foi com o nome de Eduardo Campos, no Alto Santa Terezinha, na Zona Norte da capital pernambucana.

O Compaz foi concebido com foco na prevenção à violência, inclusão social e fortalecimento comunitário. É baseado na experiência colombiana das Bibliotecas Parques e também de outras fontes de espaços de cidadania. Os espaços também contêm serviços e atendimentos oferecidos, a exemplo de cursos de capacitação. Os Compaz fazem parte da Secretaria de Segurança Cidadã da Prefeitura do Recife.

Em outubro de 2020, o Hospital Eduardo Campos da Pessoa Idosa foi inaugurado no Recife pelo então prefeito Geraldo Julio (PSB). A unidade de saúde funciona no bairro da Estância, ao lado do Hospital Geral de Areias, na Zona Oeste da cidade. O espaço tem atendimentos, incluindo consultas ambulatoriais, exames, cirurgias de pequeno porte e internamentos.

Mais recentemente, no dia 8 de maio de 2021, um trecho da Avenida Beira Rio passou a ser chamado de “Avenida Beira Rio Governador Eduardo Campos”. O projeto da Avenida Beira Rio foi criado pelo vereador Samuel Salazar (MDB), líder do prefeito João Campos (PSB) na Câmara. O gestor municipal é filho do ex-governador.

Mudanças apagam história

As constantes mudanças nos nomes de vias públicas vão apagando a memória daquela que um dia foi uma simples vila de pescadores conhecida como arrecife dos navios foi nomeando, a partir do seu cotidiano, vivências e tradições, os becos, vielas, travessas e ruas que hoje formam a cidade do Recife. Tais títulos, tanto os poéticos, quanto os jocosos, imprimiam a história do seu povo. 

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Eduardo Campos (PSB) - NE10

Além das alterações na nomenclatura da Estrada do Bongi e da Avenida Beira Rio, estão em pauta na Câmara do Recife, mudança da Rua Sete de Setembro, no bairro da Boa Vista, Centro da cidade, para "Rua Livreiro Tarcísio Pereira", em homenagem ao fundador da Livro 7, proposta pela vereadora Cida Pedrosa (PCdoB). Já o vereador Marco Aurélio Filho (PRTB) solicitou a alteração da atual Rua Engenheiro Moacyr Parahyba, na Iputinga, para “Rua Cantor Augusto César”; mas, tempo depois, retirou a pauta. Para o mesmo cantor, o vereador Fabiano Ferraz (Avante) pediu a denominação da tradicional Rua Nova, no bairro de Santo Antônio, como “Rua Nova Cantor Augusto César”.

Registros da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) demonstram que a ‘moda’ começou em 1870 após a Guerra do Paraguai. “A Rua do Crespo passou a chamar-se Primeiro de Março, numa referência ao dia final daquele conflito; a antiga Estrada do Chora Menino passou a chamar-se Rua do Paissandu; a antiga Rua do Canal, de Rua do Riachuelo e o Beco da Lapa, no bairro da Boa Vista, de Travessa do Tuiuti.” Exemplo recente também foi a mudança da Avenida Norte, que liga o Centro à Zona Norte, para Avenida Norte Miguel Arraes de Alencar, nome do antigo governador do Estado.

O arquiteto José Luiz Mota Menezes critica as alterações e argumenta que os nomes das ruas e avenidas precisam ter uma “lógica entre o morador e onde ela se localiza”. “Tem que haver uma justificativa forte. A denominação acaba sendo uma homenagem vazia se a população não acatá-la. É o povo que tem o direito de denominar a rua. As pessoas acham que podem mudar a qualquer hora o nome das vias e isso cria um problema seríssimo porque você não tem como adivinhar que aquela rua mudou de nome. Pior: muitas não só mudaram de nome, mas também de localização”, afirma.

A lei municipal de número 1223 estabelece que os logradouros públicos “já consagrados pelo uso do povo devem ser mantidos e quando possível restaurados”, mas que, para isso ser feito, deve-se ouvir o Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano (IAHGP). No entanto, segundo o membro da Comissão de História do IAHGP, Carlos Bezerra Cavalcanti, isso nem sempre acontece. “Eles teimam em fazer isso. Eu sou totalmente contrário, deviam procurar fazer coisas mais úteis fazer pela cidade. Essa [mudança] da Rua Nova é um absurdo, não pode acontecer. Ela praticamente surgiu junto ao Recife”, defende.

Para a antropóloga Fátima Quintas, a ideia de mudar os nomes das ruas e avenidas para homenagear personalidades demonstra uma “falta de louvor à tradição”. “A cultura precisa ser preservada para ter uma identidade, que vai espelhar a realidade de um conjunto de pessoas. Quando a gente começa a mudar [os nomes das vias], perdemos isso. Preservar a cultura é uma forma de abraçar a tradição e de louvar a identidade de uma população ou região. Se não for conservada, mantida e reverenciada, vai se transformando permanentemente e vamos perdendo a fotografia da própria localidade.”

Autor de livros sobre a construção do Recife, o escritor e jornalista Leonardo Dantas Silva constatou, durante pesquisa em arquivo da Prefeitura da Cidade do Recife, a mudança de 1.487 nomes de ruas tradicionais, “em que pese que algumas, apesar do texto legal, nunca foram obedecidas pela população.” O especialista também aponta as alterações dos endereços como “prejuízo total para a história da cidade”, e espera que a capital pernambucana seja “salva da insensatez que é mudar [os nomes] das ruas” e que não se aprofunde na realidade de um “Recife como terra do foi e não é mais”.

A mesma preocupação já pertencia a nomes como Manuel Bandeira. “Rua da União... Como eram lindos os montes das ruas da minha infância. Rua do Sol (Tenho medo que hoje se chame de dr. Fulano de Tal)”, escrevia no início do século passado. Sentimento compartilhado também por Gilberto Freyre, em seu guia sobre o Recife, ao criticar a troca de títulos de vias tradicionais pelos nomes de homens “mais ou menos ilustres ou de datas mais ou menos gloriosas". “[São] homenagens justas, mas que deveriam realizar-se sem o sacrifício daqueles nomes impregnados de experiência recifense", dizia o escritor.

O que dizem os vereadores

O vereador Samuel Salazar (MDB) explicou que a proposta foi lançada em 2020 e veio a partir da indagação dos próprios moradores locais. “Alguns moradores me procuraram dizendo que havia confusão, porque a Avenida Beira Rio é formada por três trechos: na Madalena, Torre e próximo ao Sport Club do Recife. Conversando, pensamos em fazer essas homenagens a Osvaldo Coelho, Eduardo Campos e Geneton Moraes, que não tinham vias com seus nomes. Peguei parecer favorável do instituto para fazer as identificações”, afirmou.

O vereador Marco Aurélio Filho (PRTB) explicou que retirou o projeto de pauta após ter procurado o IAHGP. Agora, a rua terá o nome mantido, mas será colocada nela uma placa indicando que o cantor Augusto César foi um residente da via. "[O projeto] se manteve no sistema, mas não sou a favor que se mude o nome das ruas. Tanto que fiz um discurso parabenizando a atação e a resposta que o Instituto me deu", disse.

A assessoria do vereador Fabiano Ferraz (Avante) disse que a iniciativa do parlamentar teve o intuito de homenagear o cantor, e que não houve consulta a órgãos para a abertura do projeto.

Já a vereadora Cida Pedrosa (PCdoB) justifica que "por todo o legado cultural e educacional, Tarcísio Pereira deixou uma marca indelével na Rua Sete de Setembro". "Sua memória estará para sempre vinculada àquele espaço onde estimulou o florescimento de tantos jovens talentos. Diante do exposto, solicitamos o apoio dos ilustres Pares para a aprovação da proposição", afirma.

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