SUPREMO

STF evita comentar ameaça de Bolsonaro de pedir o impeachment de ministros

Ministros da Corte acreditam que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), não embarcará no que vem sendo considerada mais uma aventura golpista por parte de Bolsonaro

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Estadão Conteúdo

Publicado em 14/08/2021 às 14:42 | Atualizado em 14/08/2021 às 22:34
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Atualizada às 22h01
O Supremo Tribunal Federal (STF) não pretende se manifestar sobre a ameaça feita pelo presidente Jair Bolsonaro de que pedirá o impeachment dos ministros Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes ao Senado. O Estadão/Broadcast apurou que os ministros da Corte acreditam que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), não embarcará no que vem sendo considerada mais uma aventura golpista por parte de Bolsonaro e apostam suas fichas numa pacificação liderada pelo Senado.
Nos bastidores, o STF considera que o mais estratégico, neste momento, é deixar o presidente sem resposta, falando ao vento - ou seja, apenas para seus apoiadores. A avaliação dos ministros é que é preciso confiar na política e nos políticos.
Internamente, o Senado já está adotando essa prática. Filho 01 do presidente, Flavio Bolsonaro (Patriota-RJ) mandou neste sábado (14), uma mensagem ao grupo de senadores com o mesmo texto da publicação de Bolsonaro no Twitter. Ficou no vácuo.
No Twitter, porém, os senadores reagiram e desqualificaram a ameaça de Bolsonaro. A senadora Simone Tebet (MDB-MS) lembrou que a Constituição também garante a defesa da democracia e estabelece o cumprimento do "sufrágio universal, direto, secreto e maioria de votos" para eleição presidencial e que, portanto, o próprio Bolsonaro pode ser alvo de processo de afastamento. " Quem pede pra bater no 'Chico', que mora no Inciso II, artigo 52, da CF, se esquece de que o 'Francisco' habita o Inciso I, do mesmo endereço", disse.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da CPI da Covid, pediu que Bolsonaro deixe de lado os "arroubos autoritários que serão repelidos pela democracia" e "vá trabalhar". Já o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) disse que o pedido do presidente não passa de outra "cortina de fumaça" para desviar o foco de suas ações.
Em 9 de julho, quando o presidente da República ameaçou não realizar as eleições de 2022, se o voto impresso alegando não confiar na urna eletrônica e pregando o voto impresso, Pacheco reagiu publicamente e de forma bem diferente do que costuma fazer. Em um pronunciamento horas depois da afirmação de Bolsonaro, ele subiu o tom e disse que não aceitaria retrocessos à democracia do País.
"Todo aquele que pretender algum retrocesso ao estado democrático de direito esteja certo que será apontado pelo povo brasileiro e pela história como inimigo da nação e como alguém privado de algo muito importante para os brasileiros e para o Brasil, que é o patriotismo, neste momento em que nós precisamos de união, de pacificação, de busca de consenso", disse Pacheco na ocasião. A Câmara, por sua vez, derrotou o voto impresso em votação na última terça-feira, 10.
 
Dois dias antes, o ministro da Defesa, Braga Netto, e os comandantes das Forças Armadas haviam divulgado uma nota repudiando declarações feitas pelo presidente da CPI da Covid, o senador Omar Aziz (PSD-AM), sobre o envolvimento de militares que estavam na mira das investigações do Senado. Hoje, Braga Netto voltou a apoiar Bolsonaro durante uma cerimônia de cadetes realizada na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), em Resende (RJ).
 Aos alunos, Braga Netto disse que as Forças Armadas são responsáveis por garantir a "independência e harmonia entre poderes, manutenção da democracia e liberdade do povo brasileiro" e que o presidente é a "autoridade suprema" das Forças Armadas. Além disso, recomendou aos cadetes que confiassem na cadeia de comando das Forças Armadas, pois ela representaria a palavra oficial da instituição.
 Braga Netto repetiu ainda um trecho da Constituição que diz respeito às Forças Armadas, o Artigo 142, mas com alterações na parte final do texto constitucional. "Reafirmo que forças armadas continuarão com fé em suas missões constitucionais, como instituições nacionais e permanentes, com base na hierarquia e disciplina, sob autoridade suprema do presidente da República, para assegurar a defesa da pátria, da soberania, da independência e harmonia entre poderes, manutenção da democracia e liberdade do povo brasileiro", afirmou.

A Constituição, no entanto, não diz exatamente o que o ministro afirmou. Braga Netto substituiu a parte final do Artigo 142 por outras palavras. "As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do presidente da República, e destinam-se à defesa da pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem", diz o texto.

A interpretação de Braga Netto reforça o discurso de Bolsonaro do último dia 12, para quem as Forças Armadas funcionariam como poder moderador. "Nas mãos das Forças Armadas, o poder moderador Nas mãos das Forças Armadas, a certeza da garantia da nossa liberdade, da nossa democracia e o apoio total às decisões do presidente para o bem da sua nação", disse Bolsonaro, na última quinta-feira.A pretensa função de "poder moderador" das Forças Armadas é rejeitada pela Advocacia-Geral da União (AGU) e pelo STF. Em ação direta de inconstitucionalidade impetrada pelo PDT, o ministro Luiz Fux disse que não cabe ao Exército, Marinha e Aeronáutica interferir nos poderes.

Receio de ruptura gera conversa entre Mourão e Barroso

O vice-presidente Hamilton Mourão e o presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, tiveram uma reunião reservada na última terça-feira (10), dia em que veículos blindados fizeram um desfile na Praça dos Três Poderes. A conversa ocorreu na casa de Barroso, que convidou o general para o encontro. Preocupado com o risco de ruptura institucional, o ministro não usou de meias-palavras. Queria saber se as Forças Armadas embarcariam em uma aventura golpista promovida pelo presidente Jair Bolsonaro.

A reunião não constava da agenda oficial e foi cercada de sigilo Naquele dia, Mourão não acompanhou Bolsonaro na recepção ao comboio militar, que passou pelos arredores do Congresso e do Supremo STF onze horas antes de a Câmara se debruçar sobre a polêmica do voto impresso. A proposta que virou um cabo de guerra acabou derrubada sob clima de tensão, com deputados acusando o governo de querer intimidar o Legislativo.

O vice disse que tinha "um compromisso" e se ausentou do Palácio do Planalto na hora do desfile bélico. Não havia mesmo sido convidado. No encontro com Barroso, Mourão o tranquilizou e garantiu que as Forças Armadas não apoiavam golpe e ninguém impediria as eleições em 2022. Fez um movimento para tentar apaziguar a crise. Bolsonaro vinha repetindo com insistência que não haveria eleições se não houvesse mudança na urna eletrônica para adotar o modelo de voto impresso no País.

Chamado de "imbecil", "idiota" e "filho da p..." pelo presidente, Barroso não escondeu do general que se mostrava perplexo com o que vinha ocorrendo. Soube que as ameaças teriam incluído até o uso de voos rasantes com um dos jatos supersônicos da Força Aérea Brasileira (FAB) sobre o prédio do Supremo, quando o ministro da Defesa ainda era Fernando Azevedo e Silva.

Mourão disse mais de uma vez ao presidente do TSE que quem comandava as tropas não avalizaria qualquer golpe. Afirmou que a chance de isso ocorrer era "zero" porque as Forças Armadas se pautavam pela legalidade. Barroso se mostrou aliviado.
Em comum, Barroso e Mourão compartilharam o espanto com a escalada da crise. O ministro foi insultado; o general, comparado pelo presidente, em uma entrevista, a alguém que atrapalha, um cunhado que se é obrigado a "aturar" porque não é passível de demissão. "Vice é igual cunhado, né? Você casa e tem que aturar o cunhado do teu lado. Você não pode mandar o cunhado embora", disse Bolsonaro à Rádio Arapuan FM, da Paraíba, em 26 de julho.
Cinco dias antes dessa conversa, o presidente do Supremo, Luiz Fux, havia anunciado o cancelamento da reunião entre os chefes dos poderes, sob o argumento de que o pressuposto para o diálogo era o "respeito mútuo entre as instituições e seus integrantes" e isso não ocorria diante daqueles ataques a Barroso e também ao ministro Alexandre de Moraes. "Quando se atinge um dos seus integrantes, se atinge a Corte por inteiro", avisou Fux.
Desde que o presidente subiu o tom e começou a vincular a realização das eleições de 2022 a mudanças no modelo de urna eletrônica, Mourão tem sido procurado por políticos e empresários para saber o que significam essas declarações.

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