Legislativo

Quase metade das assembleias legislativas do Brasil não disponibilizam projeto de lei orçamentária

Os dados sobre a transparência das assembleias estão presentes no relatório "Leis Orçamentárias sem Transparência" da Organização sem Fins Lucrativos (ONG) Transparência Brasil, publicado no último dia 20 de dezembro

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Luisa Farias

Publicado em 23/12/2021 às 20:14 | Atualizado em 29/12/2021 às 15:50
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Um dos projetos mais importantes que tramitam nas assembleias legislativas, o Projeto de Lei Orçamentária Anual (LOA) apresenta dificuldades para ser acessado pela população em 48% do sites oficiais das Casas. Estar disponível e acessível é importante porque é no legislativo estadual que a peça orçamentária é discutida, modificada e aprovada, para se tornar efetivamente a lei que vai nortear todos os gastos e investimentos pelo estado no ano seguinte. 

Os dados sobre a transparência das assembleias estão presentes no relatório "Leis Orçamentárias sem Transparência" da Organização sem Fins Lucrativos (ONG) Transparência Brasil, publicado no último dia 20 de dezembro. O material faz uma análise mais completa voltada também para a transparência da PLOA em outros locais: O Portal da Transparência dos estados e do governo federal, o site da Câmara dos Deputados e o site das secretarias estaduais responsáveis pela elaboração do projeto. 

A Transparência Brasil embasou o estudo nas regras sobre a transparência por parte dos órgãos públicos, previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e na Lei de Acesso a Informação (LAI), "que determinam claramente que as informações sobre o orçamento público devem ser divulgadas de forma ampla, tempestiva e acessível", diz trecho do relatório. 

"É importante que todo o cidadão tenha acesso fácil à proposta orçamentária do governo. É lá onde estão as políticas públicas, programas de governo, as receitas que vão financiar essas despesas", afirmou a gerente geral de Elaboração e Execução Orçamentária da Secretaria de Planejamento e Gestão de Pernambuco (Seplag-PE), Gabriela Souza. 

Segundo explica a gerente de Projetos e de Comunicação da Transparência Brasil, Marina Iemini Atoji, os entes públicos podem ser responsabilizados por não garantirem a transparência das leis orçamentárias. 

"Como seria um descumprimento do princípio da publicidade, pode resultar em condenação por improbidade administrativa. E, como uma violação à Lei de Acesso à Informação, pode resultar em no mínimo punição por infração administrativa aos responsáveis", afirmou Marina ao JC

O relatório buscou identificar nos sites das assembleias legislativas um banner ou link direto para a PLOA 2022 na página inicial e também na busca por projetos em tramitação na casa, utilizando os termos "orçamentária" e/ou "orçamento", considerados como mais intuitivos para leigos. Nos sites em que havia filtros, também foi aplicado "projeto de lei" ou "projeto de lei ordinária" e o ano de 2021, que foi quando a matéria tramitou.  

As casas legislativas foram classificadas em três parâmetros: disponível facilmente, disponível com
dificuldades e indisponível. No Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Norte e Tocantins, o PLOA não foi encontrado. "O caso mais grave é o potiguar, em cujo site a única fonte de informações sobre projetos de lei são os Diários Oficiais", diz trecho do relatório. 

Em quase metade das Casas onde o projeto foi encontrado com dificuldade, são destacados os estados do Ceará e do Rio de Janeiro. No caso deles, o projeto até estava no site, mas pela grande dificuldade de localizá-lo, o relatório apontou que na prática não estavam disponíveis.

Apenas um terço das assembleias tem o PLOA de forma simplificada. O relatório cita Paraíba e Santa Catarina como modelo, onde há banner na página inicial, prática não utilizada no restante. Já no legislativo federal, o acesso é considerado simples, nos sites do Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

No site da Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe), é possível ter acesso ao PLOA por meio da busca de proposições. No link do projeto também ficam disponíveis as emendas apresentadas pelos parlamentares.

Depois que o projeto é sancionado, ele é incluído no Alepe Legis, outro endereço que funciona como um repositório de todas as leis em vigor, inclusive com histórico de modificações, e também na sessão "transparência" na página inicial. Além disso, a Alepe disponibiliza no Portal da Transparência da Casa o orçamento específico do Poder Legislativo. 

"São três esferas de nível de informação, o projeto em votação, a lei, inclusive dos anos anteriores, e o recorte da lei orçamentária que diz respeito à Alepe", explica o superintendente de Tecnologia da Informação da Alepe, Bráulio Lira. 

Para Bráulio, o grande desafio da Casa é conseguir uma maior unidade e evitar muitas camadas de informação para se chegar até as leis orçamentárias. "A gente tenta sempre melhorar. Por trás disso tem vários sistemas. Quando é projeto de lei é um sistema, quando é lei já é um outro sistema, e para integrar isso a gente tem que dar uma solução mais amigável. Nem a gente consegue avançar em todas áreas. A gente vai ter uma discussão com um comitê em breve para rediscutir o Portal da Transparência", conta o superintendente. 

Portal da Transparência

O Portal da Transparência é o endereço eletrônico onde constam todas as informações sobre a gestão pública e gasto de recursos dos entes federativos, no âmbito federal, estadual e municipal. E de acordo com o relatório da Transparência Brasil, em 59,2% dos portais, o respectivo PLOA 2022 não foi localizado. 

Os que estão fora da estatística são os estados do Distrito Federal, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Paraná e Rio de Janeiro. No caso de Pernambuco, o PLOA está disponível no site da Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) e no site da Seplag, mas não no Portal da Transparência, mantido pela Secretaria da Controladoria-Geral do Estado (SCGE).

A SCGE informou ao JC que apenas quando o projeto é sancionado, a lei então vai para Portal da Transparência. "Considerando que a informação orçamentária de publicação obrigatória, nos termos da LRF e LAI, é a lei orçamentária, não existe qualquer descumprimento de dever legal ou de princípio de transparência", diz nota da diretora da Ouvidoria-Geral do Estado, vinculada à SCGE, Maria Elisa Andrade. 

Secretarias e Ministério da Economia

No caso das secretarias estaduais que elaboram a PLOA e o Ministério da Economia, o cenário é de melhor transparência. Dois terços deles o disponibilizam. Na Bahia, Rondônia e São Paulo, também há um banner na página inicial com um link direcionando para a proposta. 

A Seplag tem até o dia 5 de outubro de cada ano para enviar a PLOA do ano seguinte para a Alepe. A pasta costuma realizar uma audiência pública com o secretário estadual para detalhar os pontos do orçamento. A LOA 2022 - que prevê orçamento de R$ 45 bilhões, 8,3% maior em relação a 2021 - foi publicada na quarta-feira (22) no Diário Oficial de Pernambuco, e nesta quinta (23) já consta no site da Seplag. 

A partir do momento em que o projeto é enviado para a Alepe, a divulgação do trâmite passa a ser de responsabilidade do legislativo, explica Gabriela Souza. 

"Eu entendo que a informação tem que estar disponível pelo governo do Estado. Independente de onde esteja, tem que estar disponível de forma fácil, acessível e transparente. Eu diria que teria um terceiro canal em que o cidadão pode solicitar o projeto de lei junto à Ouvidoria geral do Estado. O estudo poderia ter indicado essa forma de consulta também. A gente já teve solicitações desse tipo em anos anteriores e disponibilizamos de imediato, informando o link de consulta do projeto de lei”, afirma.

Acessibilidade

Há casos em que o PLOA também está disponível nos sites das secretarias, mas é preciso dar vários cliques para se chegar até ele e ter certo nível de conhecimento sobre termos mais técnicos. 

Esse problema é abordado pelo relatório na sua conclusão. A avaliação geral é que a disponibilização dos textos dos projetos na íntegra e que permita também acompanhar tramitação no legislativo está muito abaixo das expectativas, algo mínimo em termos de transparência que deveria ser contemplado por todos os estados. 

"(A análise) Não chega sequer a avançar na questão da acessibilidade desse conteúdo à maioria da população - tradicionalmente baixa para pessoas não familiarizadas com a linguagem e a organização da
administração pública", diz o relatório. 

O estudo considerou um "cenário gravíssimo" em que não é garantida a participação social durante a elaboração do projeto e que se descumpre o princípio constitucional da publicidade. 

Marina Iemini sugere a disponibilização das informações visualmente, através de gráficos, por exemplo, com divisões por órgãos e função (saúde, educação, segurança). "O uso de linguagem simples, ou seja, sem jargões da administração pública ou oferecendo explicações sobre os termos. Por exemplo, indicar a diferença entre despesas correntes e investimentos; e exibição de forma simples das emendas apresentadas e se foram aprovadas", recomenda. 

Apesar de Pernambuco estar bem posicionado no relatório, Gabriela Souza aponta que sempre há formas de evoluir no quesito transparência. "A gente anualmente revisa os programas, ações do governo de forma que fiquem intuitivo". Ela cita o Programa Chapéu de Palha, por exemplo, que é um nome conhecido da população e consta nos mesmos termos na lei orçamentária.

"A gente começa a fazer a Lei orçamentária em abril para poder fazer a revisão da estrutura programática dos órgãos, de todos os seus programas, ações, subações e metas prioritárias. É um trabalho em conjunto com as secretarias e sempre entra em discussão essa questão de transparência e da linguagem acessível para a população", completa.

O cenário ideal apontado pelo relatório seria que o projeto fosse divulgado tanto quando estivesse no processo de análise pelo legislativo como quando se tornasse lei, em uma série histórica, além dos créditos suplementares, que são o remanejamento de recursos de uma rubrica para outra realizados ao longo do ano. 

"Durante a tramitação é possível agir para pressionar os deputados a aprovar um orçamento que de fato atenda aos interesses da sociedade (impedir cortes drásticos em áreas essenciais, por exemplo, ou o privilégio de interesses exclusivamente políticos). Ou seja, é uma forma de garantir a participação social exigida pela Lei de Responsabilidade Fiscal para além da realização de audiências públicas. E é uma forma de o eleitorado acompanhar a atuação do deputado que escolheu para representá-lo", completa Marina. 

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