O PSB sofreu uma derrota histórica em Pernambuco. Nem o apoio de Lula (PT), que teve uma votação de 65% no Estado, foi suficiente para garantir a Danilo Cabral (PSB) uma vaga no 2º turno na disputa para governador. Com 100% das urnas apuradas, o candidato ficou em quarto lugar, com 18,06% dos votos, atrás de Marília Arraes (Solidariedade), que teve 23,97%; Raquel Lyra (PSDB), com 20,58% e Anderson Ferreira (PL) com 18,15%.
Com a derrota acachapante, o partido encerra uma hegemonia de 16 anos consecutivos no governo do Estado. Ficar fora do poder não estava nos planos dos socialistas nem dos aliados da Frente Popular, que esperavam completar 20 anos no comando do Palácio do Campo das Princesas até 2026. O candidato perdeu em todas as cidades da Região Metropolitana do Recife (RMR), com exceção de Araçoiaba, que ainda não apurou a totalidade das urnas.
O fracasso nas urnas carrega simbolismos. Danilo Cabral não perdeu a eleição apenas para as adversárias Marília Arraes (Solidariedade) e Raquel Lyra (PSDB). Tampouco deve assumir o ônus de um revés pessoal.
Anunciado de última hora, o nome do deputado federal e ex-secretário de educação e planejamento, disputava um bolão de apostas com o também deputado federal Tadeu Alencar (PSB) e o então secretário da Casa Civil, José Neto.
Considerados "azarões" na época, os três nomes foram uma espécie de tapa-buraco para substituir o ex-prefeito do Recife, Geraldo Julio, na sucessão de Paulo Câmara. Quando encerrou sua segunda gestão na prefeitura, Geraldo tinha uma alta rejeição de 60%. Ainda assim, seria o candidato do PSB.
A gestão da crise da pandemia motivou a derrocada do prefeito. No último ano de sua gestão, em 2020, a Prefeitura do Recife foi alvo de sete operações da Polícia Federal por suspeitas de irregularidades no combate à Covid.
Um dos casos mais emblemáticos, que ganhou repercussão nacional, foi a compra de respiradores testados apenas em porcos. Os equipamentos foram devolvidos à empresa pela prefeitura, mas o escândalo já havia se instalado.
O desgaste na imagem do prefeito fez com que ele ficasse fora do jogo. Ganhou o cargo de Secretário Estadual de Desenvolvimento Econômico e tem a menor interação externa já vista no governo.
Novo momento nacional e estadual
A derrota do PSB e de Danilo Cabral veio da força que emergiu das urnas. O povo pernambucano decidiu romper com um grupo político e um modelo de desenvolvimento que não lhe serve mais. Atolado em crises e no atraso, Pernambuco precisa experimentar, senão o novo, porque os atuais candidatos são herdeiros de grupos políticos tradicionais, mas pelo menos o diferente.
O PSB mantém o controle do governo de Pernambuco há anos, de Miguel Arraes até Paulo Câmara. A única interrupção, desde que Arraes trocou o PMDB pelo PSB, em 1990, foi em 1998, com a vitória de Jarbas Vasconcelos sobre o ex-aliado e depois inimigo político.
O peemedebista venceu com uma diferença de 1 milhão de votos. Naquele ano também tinha sido aprovada pelo Congresso Nacional a possibilidade de reeleição. Embora fosse contra a ideia, com a justificativa de que tinha virado lei, Arraes decidiu disputar. E perdeu.
Encerrando seu terceiro governo depois de 50 anos de vida pública, Arraes escreveu um documento sobre a derrota e a necessidade de compreender o novo momento nacional. Na época, ele era presidente nacional do PSB. A postura de Arraes serve como reflexão ao atual PSB para entender a nova dinâmica nacional.
É inegável que o PSB de Pernambuco transformou a legenda em uma força nacional e que o clã Arraes-Campos fez o partido dar um salto. Depois dos dois mandatos de Jarbas, nas eleições de 1998 e 2002, Eduardo Campos foi governador pela primeira vez, em 2006, vencendo Mendonça Filho, e em 2010, derrotando Jarbas Vasconcelos.
Em 2010, Eduardo Campos, protagonizou uma revanche daquele 1998, quando Jarbas derrotou Arraes. Naquele ano foi Eduardo quem tirou Jarbas da disputa com uma votação superior a 80%. O peemedebista tinha virado um dos maiores desafetos do seu avô e Arraes morreu sem perdoar nem falar com ele.
Longe de Paulo Câmara, 'perto' de Lula e evocando Eduardo Campos
Durante toda a campanha eleitoral, Danilo Cabral evitou colar sua imagem a de Paulo Câmara. O governador esteve na convenção e nos comícios de Lula em Pernambuco, mas passou boa parte do tempo afastado. Nas redes sociais, são pouquíssimos os posts dele com Paulo.
Indicado por Eduardo Campos para concorrer ao governo em 2014, Paulo Câmara venceu a eleição contra Armando Monteiro Neto no 1º turno e com folga. Conquistou 3 milhões de votos, graças à comoção da população pela morte de Eduardo em um acidente aéreo, em 2014, em plena campanha para a Presidência da República que ele ia disputar.
Na segunda eleição, também contra Armando Monteiro Neto (PTB na época), Paulo voltou a vencer no 1º turno, mas com uma votação menor. Sua gestão é mal avaliada pelos pernambucanos e tem alta taxa de rejeição.
Segundo o Instituto Ipec, 52% consideram a gestão Câmara ruim ou péssima, enquanto 15% aprovam. Os problemas na gestão, sobretudo na área social, serviram de munição para todos os candidatos na disputa pelo governo.
Alinhados com a candidatura de Lula, a expectativa era que houvesse uma transferência de votos para Danilo, já que o ex-presidente teve 65,26% da preferência do eleitor no Estado. Além de participar de três comícios em Pernambuco e de gravar vídeos com Danilo, a candidatura não arrancou como se imaginava.
Nos comícios, Lula dizia que tinha candidato em Pernambuco e que o nome dele era Danilo Cabral, mas o que se ouvia na plateia eram gritos de apoio a Marília Arraes.
Quase sem falar sobre Paulo Câmara, Danilo evocava os tempos em que Lula na Presidência e Eduardo no Estado fizeram uma dobradinha para transformar Pernambuco no maior polo de atração de investimentos e geração de empregos do País.
A questão é que os tempos são outros. A população está interessada em resolver problemas urgentes como o desemprego, a fome, a pobreza e a desigualdade. Quem conhece o Pernambuco real, sabe que aquele da propaganda é uma ficção. Por isso, os eleitores decidiram que era hora de mudar.
Perder para Marília Arraes dói mais
Com o resultado deste domingo nas urnas, Marília Arraes poderá se tornar a primeira governadora de Pernambuco. Neta que leva o sobrenome do ex-governador e líder histórico do PSB, Marília disputou com João Campos, filho de Eduardo Campos, a Prefeitura do Recife, em 2020. Em uma eleição furiosa, ela perdeu por poucos votos.
Em 2016, dois anos após a morte de Campos, seu primo, ela protagonizou uma cisão no partido e na família Arraes ao migrar para o PT e fazer oposição a Paulo Câmara. Os grupos ficaram divididos entre os "arraesistas" e os "eduardistas".
Com a dissidência, ela virou alvo da ala “eduardista” da família, que tem como liderança o prefeito de Recife, João Campos, filho de Eduardo. Graças ao alinhamento político entre o PSB e o PT, Marília ficou sem chance de disputar o governo entre os petistas. Sem espaço no PT, migrou para o Solidariedade. O partido integra a coligação nacional de Lula e ela tem usado a imagem do ex-presidente na campanha mesmo sob protestos do PSB.
Resta ao PSB acompanhar o resultado das eleições no 2° turno e recompor sua estratégia política. Se a eleição de 2024 for inédita como esta, cheia de candidaturas competitivas e novas propostas, periga o partido perder a Prefeitura do Recife também.
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