'Direita brasileira precisa condenar e não depender de Bolsonaro', analisa cientista político
Em entrevista à Rádio Jornal, professor Adriano Oliveira afirmou que centro-direita democrática não pode viver refém do bolsonarismo
O indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro no inquérito da Polícia Federal que investiga uma suposto esquema golpista ocorrido em 2022 deverá ser o ponto de partida para que a direita moderada tome uma nova postura, segundo analisou o cientista político Adriano Oliveira. Ele deu a declaração em entrevista ao programa Passando a Limpo, da Rádio Jornal, nesta sexta-feira (22).
Na visão do especialista, Bolsonaro, uma vez indiciado e com possibilidade de ser condenado, deverá ter a desejada anistia negada pela Justiça, permanecendo inelegível nas eleições presidenciais de 2026. O recente indiciamento, portanto, seria fator determinante para que o ex-mandatário não reverta sua situação, tornando a reeleição de Lula mais fácil.
Adriano Oliveira completou que a extrema direita brasileira se vê diante da necessidade de um novo candidato para substituir seu Messias. Contudo, ele ponderou que existe uma direita moderada que não pode enxergar em Bolsonaro a única opção de futuro.
"Estamos conceituando a direita de maneira muito equivocada. A direita não é Bolsonaro. Existe uma direita democrática, uma centro direita que valoriza a democracia, respeita as liberdades, defende um estado ativo, um liberalismo econômico, uma menor carga tributária. Essa direita precisa aparecer agora e condenar Jair Bolsonaro. Essa direita não pode viver refém do bolsonarismo, precisa dizer que é democratica", apontou o professor.
"Essa direita, para ganhar a eleição de 2026 ou 2030, precisa conquistar os eleitores antilulistas moderados, que não admitem viver num país que não seja democratico. A grande oportunidade da direita é essa. O grande significado dessa decisão da PF e futuramente do MP, com a denúncia e também a condenção de Jair Bolsonaro pelo STF, é mostrar que uma direita democrática que respeita a democracia, que tem idéias próprias, inclusive ideias que venham a contrastar com ideias do PT, venha à tona. A direita precisa de apresentar e, claro, ser uma direita democrática, e não depender de Jair Bolsonaro", completou.
Retorno improvável
O cientista político também fez um paralelo entre Lula e Bolsonaro, explicando porque Lula conseguiu retornar ao processo eleitoral e Bolsonaro, na visão dele, não conseguirá o mesmo feito.
"O presidente Lula é uma pessoa confiável. Lula é do sistema. O centrão sabe que pode contar com Lula. Lula não vai complicar a vida do centrão. O centrão vai continuar com orçamento, emendas parlamentares, cargos na Esplanada. Com Bolsonaro não dá. Bolsonaro é uma pessoa inconfiável. As instituições sabem, o Supremo Tribunal Federal sabe que com Lula pode contar pela defesa da democracia, para as negociações do jogo do poder, para um orçamento melhor do Judiciário. Lula é um sistema que dá uma normalidade ao funcionamento do sistema político brasileiro. Bolsonaro é a antítese de Lula", cravou o especialista.
Ele ponderou que Bolsonaro é um fenômeno que estaria enfraquecido neste momento, mas que ainda tem importância na opinião pública brasileira, mas disse acreditar que o ex-presidente não conseguirá retornar à vida política porque as instituições não confiariam nele.
"Ele é conflituoso, uma pessoa que busca sempre derrotar os adversários, não importa os meios. E acima de tudo, Bolsonaro não é confiável, as instituições não confiam em Bolsonaro. Imagina se - isso não vai acontecer - o Congresso Nacional desse a anistia a Jair Bolsonaro e ele viesse a vencer o Lula em 2026? Quem garantiria que Bolsonaro não daria um novo golpe? Que não pressionaria os senadores par apromovoer o impeachment de um ministro do STF?", questionou Adriano Oliveira.
O futuro de Valdemar
O especialista também avaliou que o presidente do Partido Liberal, Valdemar Costa Neto — também indiciado pela PF no inquérito do suposto golpe — peca ao não enxergar o futuro da direita no país. Ele chega a dizer que a "paixão pelo bolsonarismo" causa um "excesso de miopia" no cacique partidário, estendendo a crítica ao senador Ciro Nogueira, que foi ministro de Bolsonaro.
"O grande pecado dos políticos é quando eles não conseguem enxergar o futuro. Valdemar é compreensível, até certo ponto. Ele foi sábio. 'Com o bolsonarismo, eu elejo deputado, senador, vereador e talvez prefeitos, e consequentemente eu aumento a quantidade de recursos públicos que chegarão ao meu partido, aí eu tenho força, distribuo esse srecursos e continuo comandando o PL e, em 2026, se o Lula fo reeleito, eu negocio com Lula, volto a fazer parte do Centrão'", disse Antônio, citando a estratégia de Valdemar.
"Só que, em determinado momento, Valdemar vai ser instado a se pronunciar, a condenar Jair Bolsonaro, porque se não, ele poderá sofrer as sanções da Justiça, inclusive perder o partido. Se for descoberto, por exemplo, que ocorreu distribuição de recursos públicos do fundo partidário para alguma reunião, ou alguma reunião do golpe ocorreu numa casa alugada pelo PL, o PL poderá perder o registro, assim como Valdemar Costa neto pode receber uma sanção mais agressiva", apontou.
Ele fez as mesmas críticas ao senador Ciro Nogueira, do PP, que foi ministro de Bolsonaro. "Eu ainda os tenho como políticos de grande sabedoria, que conseguem enxergar o futuro. Mas Ciro Nogueira se pronunciou ontem defendendo o ex-presidente Bolsonaro. Sabendo que as instituições estão repudiando o bolsonarismo porque Bolsonaro tentou dar um golpe na democracia brasileira, o que motiva Ciro Nogueira, que foi aliado do presidente Lula, que tem credibilidade na política brasileira do Centrão, em seguir defendendo Jair Bolsonaro? É um excesso de miopia. Me parece que a paixão pelo bolsonarismo não enxergasse o futuro", disparou.
"A minha expectativa é que eles encontrem a sabedoria e que a direita democrática abandone o bolsonarismo, e que a direita possa a voltar a normalidade, possa apresentar um projeto de país, que venha a competir com o petismo, o lulismo e com a esquerda brasileira", concluiu o cientista político.