O bairro da Imbiribeira, na Zona Sul, é o mais barulhento do Recife. É lá também que fica a via mais ruidosa da cidade: a Avenida Mascarenhas de Morais. A combinação é conhecida por quem circula na via ou mora nas suas imediações: trânsito intenso, buzinas, muitos semáforos e piso de placas de concreto, que aumentam o atrito do solo com os veículos. Tudo isso, aliada à falta de arborização, amplifica os ruídos produzidos em uma das principais artérias da capital. No extremo oposto, o bairro de Pau Ferro, na Zona Norte, é o mais silencioso. Lá, o barulho vem, quase sempre, da natureza. É o canto de pássaros, o latido dos cachorros, o trote dos cavalos. Aqui ou ali, o motor de motocicletas e carros. O ranking dos bairros mais e menos barulhentos foi traçado em uma pesquisa inédita feita pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) que desenhou o mapa acústico do Recife.
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O levantamento percorreu os 96 bairros da metrópole. Em uma primeira etapa, alunos e professores do curso de arquitetura e urbanismo da UFPE escolheram três pontos do bairro para chegar a uma média dos níveis de barulho produzidos em cada um deles. Praticamente todos apresentaram níveis médios de decibéis mais altos do que o recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). A primeira define como limite ideal para áreas urbanas 50 decibéis. A segunda, 60 decibéis. Apenas cinco bairros – Guabiraba, Mangabeira, Campina do Barreto, Cajueiro e Pau Ferro – ficaram dentro da recomendação. “Comparando com estudos já divulgados nessa área em relação a outras capitais, é possível afirmar que o Recife é uma das cidades mais barulhentas do Brasil”, afirma o professor da UFPE Ruskin Freitas, um dos coordenadores do estudo.
Os mapas foram pintados em cinco cores que representam as diferentes faixas de intensidade de som aferidas. Oito bairros ficaram com uma média acima de 75 decibéis: Imbiribeira, Várzea, Passarinho, Zumbi, Engenho do Meio, Bongi, Jordão e Brejo da Guabiraba. Quarenta ficaram com medições entre 70 e 75 decibéis, 32 apresentaram entre 65 e 70 decibéis, 9 entre 60 e 65 decibéis. Cinco ficaram com a intensidade abaixo de 60. E apenas um, Pau Ferro, ficou abaixo de 50 decibéis.
SURPRESA
Uma surpresa do estudo: nenhum dos bairros mais barulhentos fica na região central do Recife. “Imaginávamos que eles estariam no topo desse ranking, em função da grande movimentação do comércio. A Avenida Conde da Boa Vista, a Rua da Aurora e Rua do Riachuelo foram as mais ruidosas, mas os bairros (Boa Vista, Santo Amaro e Soledade) por onde passam têm também locais muito tranquilos. Como a medição afere uma média, o resultado geral indicou que não estão entre os que apresentam um maior desconforto acústico”, explica Ruskin Freitas.
O levantamento é fruto de projeto de iniciação científica desenvolvido no Laboratório de Conforto Ambiental da universidade. Com o resultado nas mãos, os pesquisadores decidiram aprofundar o mapeamento em sete bairros: Imbiribeira, Soledade, Boa Vista, Madalena, Zumbi, Prado e Pau Ferro. Dessa vez, foram monitorados 40 pontos em cada um deles. Alguns, por serem muito pequenos, foram agrupados em mais de um bairro.
O professor da UFPE ressalta que o resultado é importante para ajudar a construir um conjunto de ações que melhorem o conforto acústico nas áreas mais barulhentas. Uma das principais medidas é o investimento em arborização. Ele cita o caso da Avenida Mascarenhas de Morais como exemplar. “Além de ter intenso movimento de veículos, ônibus, caminhões e motos, o que potencializa o ruído é o fato dessa avenida não ter vegetação, jardins, é uma via muito árida, pouco humanizada. Se há canteiros centrais, árvores, isso melhora a qualidade ambiental da área”, explica.
Moradora da Imbiribeira, a aposentada Judite Marçal, 72 anos, conhece bem o desconforto causado pela barulhenta avenida. “Aqui a gente não consegue nem atender o telefone direito. É buzina, moto, caminhão passando. E o calor piora tudo, é sempre muito quente, sem sombra”, lamenta. O local onde a aposentada costuma esperar o ônibus é justamente o ponto de maior pico de ruídos. Na medição dos pesquisadores, chegou a uma média de 82 decibéis. Para se ter uma ideia, é um número próximo ao ruído causado pela decolagem de um avião, também aferido pela pesquisa. Um problema que passa bem longe da rotina do segurança Dimas Celestino da Silva, 50. Há seis anos, ele se mudou para Pau Ferro, uma espécie de área rural dentro dos limites do Recife. Foi em busca do silêncio e da qualidade de vida que o bairro oferece. “Quando você chega, já sente o clima diferente. Vim à procura de oxigênio e tranquilidade. Aqui, barulho só de cigarra, de sabiá. No máximo, um latido de cachorro”, comemora.