Atenção básica à saúde

Mais Médicos: uma missão dividida entre amor e discórdia

Cubanos encantaram comunidades desassistidas no Brasil, ampliando a atenção básica em saúde, e incomodaram as entidades médicas do País

Cinthya Leite
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Cinthya Leite
Publicado em 25/11/2018 às 7:58
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Cubanos encantaram comunidades desassistidas no Brasil, ampliando a atenção básica em saúde, e incomodaram as entidades médicas do País - FOTO: Foto: Guga Matos/JC Imagem
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De um lado, a maioria das vozes que entoam lembranças do atendimento dos médicos cubanos, que devem retornar a Cuba até o dia 12 de dezembro, não tem do que reclamar. São pessoas que relatam sentir o quão valioso é se sentir cuidado na atenção básica, considerada a porta de entrada preferencial do Sistema Único de Saúde (SUS), que deve estar presente nos municípios e próxima de todas as comunidades, garantindo acesso universal, com qualidade e em tempo oportuno. Em 2013, ano de criação do Mais Médicos, programa que fervilha em meio a polêmicas e a uma crise do setor público de saúde, o Brasil tinha uma proporção de médicos por habitante significativamente inferior à necessidade da população e do SUS. Estavam mal distribuídos e, dessa maneira, as populações mais pobres e vulneráveis eram as que contavam proporcionalmente com menos médicos. Há cinco anos, o Mais Médicos chegou com a proposta de ampliar a assistência fixando médicos nas regiões com carência de profissionais. Vários estudos mostraram os efeitos positivos do programa nos seus dois primeiros anos de existência, como o aumento da cobertura de atenção básica em saúde, que saiu de 77,9%, em 2012, para 86,3% em 2015 no País.

Em outra esfera, vozes de entidades médicas brasileiras defendem que, com a criação do Mais Médicos, o governo brasileiro transferiu “de forma temerária” para Cuba, como ressalta nota da Associação Médica Brasileira (AMB), parte da responsabilidade pelo atendimento na atenção básica de saúde. “Isso deixou o Brasil submisso aos humores do governo de outro país. Os impactos negativos previstos são os que estamos comprovando agora”, ressalta a AMB. A associação sugere que, diante da crise desencadeada, sejam avaliadas ações como o reforço do atendimento em áreas indígenas e em locais de difícil acesso, como também o incentivo à adesão de médicos jovens ao programa. Desde a criação do Mais Médicos, a AMB acentua que o programa “tinha propósitos meramente eleitoreiros e que partia de uma premissa equivocada: a de que não havia médicos em número suficiente no Brasil”. Tanto a associação quanto o Conselho Federal de Medicina (CFM) reiteram que o País tem um volume de profissionais suficientes (458.624 médicos) para atender às demandas da população e que a crise atual será resolvida com os médicos brasileiros.

Já o discurso da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), com base em estudos científicos, levanta a bandeira de que os médicos cubanos tiveram um desempenho similar ou superior ao dos profissionais brasileiros, apesar das barreiras relacionadas ao idioma e às diferenças culturais, sanitárias e epidemiológicas. “A saída intempestiva de mais de oito mil médicos cubanos coloca em risco o atendimento a mais de 23 milhões de pessoas, em milhares de municípios, especialmente nos lugares mais pobres, mais distantes ou nas periferias dos grandes centros urbanos. Há risco iminente de desassistência e piora das condições de saúde, com aumento de complicações, hospitalizações e mortes por causas evitáveis, decorrente de problemas de saúde que deixarão ser tratados”, destaca, em comunicado, a Abrasco. A entidade está preocupada com um número: 611. É o equivalente ao total de municípios brasileiros onde todos os médicos atuantes eram cubanos.

Jaboatão dos Guararapes

Em Pernambuco, assim como em outros Estados brasileiros, as cidades têm se mobilizado para evitar prejuízos ao atendimento da população diante da atual crise e até a apresentação dos novos médicos que preencherão as vagas do novo edital do Mais Médicos. Em Jaboatão dos Guararapes, no Grande Recife, que contava com 14 profissionais cubanos, foi iniciada a convocação de médicos, aprovados em seleção simplificada realizada em agosto, para suprir as vagas em aberto no programa. Estão sendo chamados 79 profissionais da saúde, entre médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e dentistas.

A gerente de atenção básica de Jaboatão, Nielma Maria Gomes, ressalta que as equipes de saúde da família são essenciais porque estabelecem vínculos com as comunidades, o que facilita o acesso aos serviços de assistência médica. “No município, são 104 equipes. Os profissionais fazem visitas domiciliares, consultas nos postos, encaminhamentos para especialidades médicas e realização de exames de alta complexidade”, frisa Nielma Gomes, que garante empenho do município para valorizar os cuidados na atenção primária em saúde e para suprir a carência dos médicos cubanos.

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