“Eu não vou pagar a conta”. A resposta às ações da gestão Dilma Rousseff sofreu pouca variação e foi apropriada por diferentes segmentos da sociedade contra o atual governo Michel Temer. Durante a paralisação dos caminhoneiros, que se estendeu até a última semana, não foi diferente. Em redes sociais, em grupos de WhatsApp; nas filas dos postos de gasolina e do supermercado, o consenso entre a população era de que ninguém queria ser ainda mais penalizado em um cenário econômico difícil. Mas uma conta não se fecha só. As saídas para subsidiar o preço do diesel – que deve custar R$ 9,6 bilhões aos cofres públicos – necessariamente contrariam o “slogan” que se repete pelo País.
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No cálculo feito pelo governo, o rombo nos cofres públicos será coberto pela reoneração da folha de pagamento, pelo uso de recursos contingenciados e por cortes de despesas por parte do governo. Na sexta-feira, depois que foi divulgado que parte dos recursos contingenciados viria do Ministério da Educação e do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, reuniu a imprensa para explicar que os recursos já estavam bloqueados e serão usados para “essa grande emergência nacional”.
“O governo está encurralado, o que pode fazer? Não tem força para ir contra determinados grupos, principalmente nesse caso, onde houve grande apoio popular. Mas o fato é que quem vai pagar a conta somos nós. Tudo vai para o orçamento público, ou seja, é diluído entre todos os brasileiros”, opina o professor de economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Felippe Serigatti.
O apoio popular ao qual o economista se refere foi confirmado na pesquisa realizada na última semana pelo Datafolha, que mostra que 87% dos entrevistados eram a favor da paralisação promovida pelos caminhoneiros. A pesquisa, no entanto, revelou uma contradição: o mesmo percentual se mostrou contrário à decisão do governo de cortar gastos públicos e aumentar impostos para atender às reivindicações. “Infelizmente esse discurso do ‘eu não vou pagar a conta’ só mostra como as pessoas veem os governos como algo distante do resto da sociedade”, diz o professor do departamento de economia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Marcelo Eduardo. O professor questiona a decisão de concessão de subsídios com base na atual situação fiscal do País. As contas do setor público encerraram o mês de março com um déficit primário de R$ 25,13 bilhões – pior resultado para o terceiro mês do ano na série histórica do Banco Central, iniciada em 2001. A meta para o ano é de um déficit de R$ 159 bilhões.
PREJUÍZOS
O imbróglio político-econômico que o governo enfrenta para fechar as próprias contas foi ainda mais prejudicado pelas consequências dos dez dias de paralisação. De acordo com cálculos preliminares feitos pela coordenadora do boletim macroeconômico do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), Silvia Matos, a greve dos caminhoneiros deixou de gerar R$ 15 bilhões, o que pode representar um recuo de 0,2% na previsão de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) para este ano.
Sem o crescimento esperado, o País arrecada menos, recebe menos investimentos e demora ainda mais para voltar a gerar empregos. Um estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) aponta que nos oito primeiros dias de greve o País deixou de gerar R$ 3,8 bilhões em arrecadação.
Mas alguns especialistas acreditam que as perdas podem ser ainda maiores diante do agravamento do desgaste do governo. “A previsão inicial para o PIB de 2018 estava em 3% e recuou para 2,5%. Alguns analistas já falam em 2%. Como estamos em ano eleitoral com um cenário pouco previsível, a turbulência política deve continuar prejudicando a economia”, analisa o professor de economia da da Universidade Federal Fluminense (UFF) André Nassif. “Nós não perdemos só com o que deixa de ser transportado. Perdemos por toda a incerteza do processo. São os investimentos privados que vão ser segurados por ainda mais tempo”, complementa Serigatti.
Preocupado com o que vai acontecer daqui para frente, o professor de economia da UFPE e sócio da Ceplan Consultoria, Tarcísio Patrício, destaca que é preciso discutir sobre a estrutura da venda de combustível no País. “Temos um monopólio com a Petrobras, um oligopólio com as distribuidoras e a falta de regulação nos preços do varejo que, eventualmente, permite a prática de cartel. Precisamos encontrar o meio termo entre o subsídio e a falta de controle”, defende.