A notícia de que Londres aceitou pagar até 55 bilhões de euros para sair da União Europeia (UE) foi recebida com moderada satisfação em Bruxelas, mas irritou aliados e críticos do governo britânico.
Se, há alguns meses, o ministro das Relações Exteriores Boris Johnson - principal rosto da campanha a favor do Brexit - ironizava a UE a respeito do valor a ser pago, agora o governo britânico aceitou pagar a quantia a título de compromissos orçamentários já assumidos, ou pensões dos funcionários europeus, entre outras faturas.
Este valor "está muito próximo" das aspirações de Bruxelas, declarou o comissário europeu da Agricultura, o irlandês Phil Hogan, abrindo caminho para as negociações.
Na terça-feira (28), o jornal Daily Telegraph revelou os valores - entre 45 bilhões e 55 bilhões de euros - e o acordo.
O veículo citou duas fontes, segundo as quais o acordo foi alcançado na semana passada em Bruxelas, mas o montante final dependerá de "como as partes calcularem a cifra, com base em uma metodologia comum".
Os críticos do governo e da saída da UE aproveitaram o recuo do governo da primeira-ministra Theresa May para recordar as promessas feitas antes do referendo de 26 de junho de 2016.
"É um símbolo enorme da impossibilidade de materializar o Brexit nos termos como foi vendido para o povo britânico", disse o deputado trabalhista Chuka Umunna à rádio BBC.
A primeira-ministra está em viagem pelo Oriente Médio e não participou da audiência semanal no Parlamento, mas a secretária do Tesouro, Liz Truss, chamou esses valores de "especulações".
Caminho para segunda fase
Nigel Farage, que era líder do partido antieuropeu Ukip durante a campanha do referendo, atacou Theresa May e o governo.
"Que se aprove uma quantia desta magnitude em troca de nada mais do que a promessa de um acordo comercial decente é se vender total e completamente", escreveu Farage no Daily.
À margem das críticas domésticas, o acordo financeiro nivelaria decisivamente a reunião de cúpula de dezembro da UE, na qual líderes do bloco devem dar sinal verde para a segunda fase das negociações - a que se refere às futuras relações comerciais entre ambos os sócios -, como insiste Londres.
Esta é a visão dos investidores, que levaram a libra esterlina a registrar o maior nível em comparação ao dólar em dois meses.
O principal negociador europeu, Michel Barnier, limitou-se a descrever os valores como "rumores na imprensa".
"Há um assunto, no qual devemos continuar trabalhando, independentemente dos rumores na imprensa, e é o dos compromissos financeiros", desconversou Barnier.
"Não vamos pagar entre 27 (países) o que foi decidido entre 28, é simples. Assim, queremos liquidar as faturas", completou.
O ministro britânico dos Transportes, Chris Grayling, defensor do Brexit, disse que o Reino Unido "não quer sair da maneira errada" da UE e relativizou os valores: "De qualquer maneira, estamos pagando a cada ano 10 bilhões de libras anuais líquidas à UE".
Irlanda do Norte e expatriados
Ainda faltam, no entanto, acordos em duas áreas delicadas de discussão, consideradas essenciais pela UE: os direitos dos expatriados após o Brexit e o futuro da fronteira irlandesa, a única terrestre entre o Reino Unido - concretamente com sua província da Irlanda do Norte - e a UE (com a Irlanda).
"O acordo sobre o dinheiro já foi", garantiu uma fonte da negociação ao Telegraph.
Na questão dos expatriados, um dos pontos de polêmica é saber se os 3,2 milhões de europeus que moram na Grã-Bretanha terão direito de apelação no Tribunal Europeu de Justiça, ou se estarão sujeitos apenas à jurisdição britânica, como Londres deseja.
"Agora, falta apenas o assunto do tribunal e da Irlanda do Norte antes do Conselho europeu de dezembro", indicou a fonte.
A primeira-ministra britânica, Theresa May, tinha oferecido cobrir as contribuições de seu país ao orçamento europeu de 2019 e 2020, o que significaria 20 bilhões de euros.
A cifra foi duplicada em uma reunião ministerial em Londres na semana passada.
Um porta-voz do Departamento britânico encarregado do Brexit se limitou a indicar que "conversas intensas" prosseguiam nesta semana em Bruxelas.