Depois de quase seis décadas, Cuba inicia uma nova era, com o general Raúl Castro transmitindo a Presidência para Miguel Díaz-Canel, um civil preparado pelo Partido Comunista para dirigir os destinos da Ilha.
Até agora número dois do governo, Díaz-Canel Bermúdez recebeu nesta quinta-feira (19) a decisão da Assembleia Nacional de Cuba, que submeteu à votação a proposta para ungi-lo como sucessor dos irmãos Fidel e Raúl Castro à frente do país.
"Miguel Mario Díaz-Canel, de 57 anos, foi eleito Presidente do Conselho de Estado e do Conselho de Ministros da República de Cuba pela recém-constituída Assembleia Nacional do Poder Popular em sua Nona Legislatura, em sessão a partir desta quarta-feira no Palácio de Convenções de Havana", informou o blog governista Cubadebate.
Em seu primeiro discurso como presidente na Assembleia Nacional, o novo presidente de Cuba prometeu continuar tanto a revolução de seus antecessores quanto a atualização do modelo econômico iniciada com seu antecessor, Raúl Castro.
"O mandato concedido pelo povo a esta legislatura é dar continuidade à revolução cubana em um momento histórico crucial, que será marcado por tudo que devemos avançar na atualização do modelo econômico", disse Díaz-Canel.
'Prova de habilidade'
Primeiro-vice-presidente desde 2013, este engenheiro eletrônico escalou discretamente a linha de comando, respeitando os caminhos estabelecidos dentro do Partido Comunista de Cuba (PCC).
Raúl, de 86 anos, levou-o para seu lado, encarregou-o de representar o governo em visitas oficiais ao exterior e o preparou para assumir o cargo mais importante da Ilha, enquanto a imprensa estatal lhe dava mais espaço.
Lembrado por ser um dirigente que andava de short e de bicicleta, soube construir uma imagem mais renovada e moderna, defendendo o desenvolvimento da Internet e de uma imprensa mais crítica. Foi severo, porém, contra os opositores e os diplomatas propensos a criticar o governo em público.
Encarregado de liderar uma transição histórica em um primeiro mandato de cinco anos, será o primeiro líder cubano nascido depois da Revolução de 1959 e terá de forjar uma legitimidade que foi natural para os Castro.
"É difícil avaliar a capacidade de Díaz-Canel para ser presidente (...) Vem do sistema, mas é a rigidez do sistema o maior obstáculo para avançar com as mudanças econômicos e políticas necessárias (...) Será uma prova de sua habilidade política", considerou o presidente do think tank Interamerican Dialogue, Michael Shifter.
"E pode encontrar resistências", acrescentou.
Poder menos centralizado
O novo presidente terá de manter o equilíbrio entre a reforma e o respeito aos princípios revolucionários, mas deverá se esforçar para atualizar o modelo econômico, um projeto iniciado por Raúl Castro.
A tarefa mais urgente é a unificação das duas moedas nacionais que circulam no mercado, além da eliminação de taxas de câmbio preferenciais para empresas estatais - que são maioria na Ilha -, situação que gera distorções em uma economia afetada pelo embargo imposto pelos Estados Unidos desde 1962.
Em nível diplomático, o futuro chefe do Executivo cubano deverá lidar com o retorno de Washington à linguagem da confrontação, devido à chegada de Donald Trump ao poder, que deu marcha a ré na aproximação do final de 2014.
Raúl sucedeu ao irmão Fidel em 2006, quando este ficou doente, vindo, então, a falecer em 2016. Iniciou uma série de reformas impensadas para sua economia de modelo soviético, como a abertura a investimentos estrangeiros e à geração de negócios próprios, junto com a histórica aproximação com os Estados Unidos, seu inimigo da Guerra Fria.
Segundo analistas, as mudanças foram tímidas e não conseguiram reativar uma economia altamente dependente das importações e de sua aliada Venezuela, mergulhada na crise.
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Para cuidar de seu herdeiro político e guiá-lo nesse novo caminho, Raúl Castro conservará suas funções como secretário-geral do PCC até 2021, quando completa 90 anos.
O futuro número dois do governo, Salvador Valdés Mesa, político afro-cubano de 72 anos, também poderá ajudá-lo a conter a possível resistência da velha guarda, não muito disposta a sacrificar o legado socialista sob a espada das reformas.
Dois líderes históricos, Ramón Machado Ventura, de 87, e Álvaro López Miera, de 76, deixarão o Conselho de Estado, mas outros com credenciais parecidas, como Ramiro Valdés, 85, Guillermo García, 90, ou Leopoldo Cintra Frias, 76, permanecem. O novo Conselho de Estado terá 13 de seus 31 membros renovados.
Espera-se a nomeação de novos integrantes do Conselho de Ministros nos próximos dias. Especialistas acreditam que a nova configuração do poder cubano estará menos centralizada.
"O modelo de governo dos Castro provavelmente passará por uma transição geracional e talvez adote um estilo de liderança mais institucional e burocrático do que carismático e pessoal como o que Fidel estabeleceu e Raúl reformulou", considerou Jorge Duany, diretor do Instituto Cubano de Pesquisa da Universidade da Flórida.