DISPUTA

Eleições na Bósnia põem à prova as persistentes divisões do país

Na Bósnia, os candidatos recorrem a discursos nacionalistas pondo a prova um país que luta para ser unido

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Publicado em 05/10/2018 às 18:48
Foto: ANDREJ ISAKOVIC / AFP
Na Bósnia, os candidatos recorrem a discursos nacionalistas pondo a prova um país que luta para ser unido - FOTO: Foto: ANDREJ ISAKOVIC / AFP
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Enquanto a Bósnia se prepara para as eleições do próximo domingo, os candidatos competem recorrendo a discursos de tom nacionalista, pondo à prova as costuras de um país que ainda luta para se manter unido, 25 anos depois da eclosão da guerra dos Bálcãs. 

O país se mantém unido através de um acordo de divisão de poderes entre as comunidades que se enfrentaram no conflito de 1992 a 1995: sérvios, croatas e bósnios muçulmanos.

As eleições de domingo exporão o complexo sistema político do país, com eleitores escolhendo entre um amplo leque de líderes e assembleias para os diferentes níveis do governo.

A principal corrida será protagonizada pelos candidatos à Presidência, que conta com três membros que se revezam a cada oito meses: um sérvio, um croata e um bósnio muçulmano.

Mas, em uma demonstração de como o nacionalismo ameaça o frágil status do país, o candidato para a vaga sérvia da Presidência, Milorad Dodik, costuma se referir à Bósnia como um "conceito falido". 

Esta semana, o candidato - sancionado pelos Estados Unidos - disse a uma multidão em Zvornik, na fronteira com a Sérvia: "Quando se fala sobre [a Bósnia], não se fala de um Estado, se fala de um território". 

Dodik, um nacionalista pró-russo, dirigiu a região sérvia da Bósnia desde 2006 e pediu um referendo sobre sua independência reiteradamente.

Seu concorrente para a vaga presidencial sérvia, Mladen Ivanic, adverte os eleitores de que Dodik está conduzindo os sérvios para a "a incerteza, o risco, o conflito e o isolamento". 

 As falhas de Dayton 

Mais de duas décadas depois de uma guerra que deixou 100 mil mortos, a Bósnia continua sendo regida pelos Acordos de Paz de Dayton, que puseram fim ao conflito.

O acordo divide a Bósnia em duas zonas semiautônomas, a Republika Srpska, dirigida pelos sérvios, e uma Federação croata-muçulmana.

As chamadas "entidades" são regidas por frágeis instituições centrais.

Os críticos asseguram que o sistema Dayton consagrou as divisões comunitárias da Bósnia e frustrou uma governança eficaz para 3,5 milhões de habitantes. 

Em campanha, os pequenos partidos multiétnicos e as formações de muçulmanos bósnios costumam cantar o hino oficial do país.

Mas os partidos vinculados às outras duas comunidades - sérvios e croatas - frequentemente cantam os hinos nacionais da Sérvia e da Croácia, vizinhas da Bósnia.

Enquanto os sérvios dominam na Republika Srpska, os croatas são minoria em sua metade  do país, onde fica a capital, Sarajevo, e cuja população é 75% muçulmana bósnia.

Esta configuração alimentou um movimento nacionalista croata, que defende a criação de uma terceira entidade para eles, uma ideia compartilhada pelo membro croata de turno na Presidência, Dragan Covic. 

Seu oponente croata, Zeljko Komsic, adverte que um passo neste sentido comportaria um "conflito inevitável". 

"Não se pode redesenhar as fronteiras da Bósnia sem uma guerra", declarou Komsic a seus simpatizantes em recente ato de campanha.

Cansaço político 

Os políticos bósnios colocaram o país em uma "matriz etno-nacionalista, onde se cria e expande o medo do outro", afirmou a analista política Tanja Topic.

"Baseando-se neste medo, os etno-nacionalistas governaram aqui durante décadas e não se renderam", afirmou à AFP. 

Enquanto isso, "apenas se diz nada sobre a pobreza", destacou o economista Zarko Papic, apesar de a Bósnia ser um dos países mais pobres da Europa.

A instabilidade política permanente, juntamente com o sistema de governo do país, afasta os investimentos estrangeiros, acrescentou.

Para muitos bósnios, as preocupações mais angustiantes são a economia claudicante, a corrupção generalizada e a alta da taxa de desemprego, especialmente entre os jovens.

Muitas rodovias e outras infraestruturas estão em péssimo estado, enquanto arranjos e uma burocracia descomunal representam obstáculos ao desenvolvimento.

Amar Ramovic, um técnico de informática de 40 anos, afirmou que no domingo vai votar, mas depositará um voto nulo.

"Realmente não vejo nenhum partido que proponha algo concreto. Não espero nada da classe política", declarou à AFP. 

As seções eleitorais abrirão no domingo às 7H00 locais (02H00 de Brasília) e fecharão às 19H00 locais (14H00 de Brasília).

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