LAVA JATO

Lula deveria dizer que bebia cerveja para receber possíveis propinas

Ex-presidente deveria discusar conforme era mandado pelo presidente da Petrópolis, segundo Lava Jato

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Publicado em 28/12/2016 às 14:35
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Ex-presidente deveria discusar conforme era mandado pelo presidente da Petrópolis, segundo Lava Jato - FOTO: Foto: Agência Brasil
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"Se o Presidente (Lula) puder falar que 'a cerveja Itaipava por ser 100% brasileira, é sua cerveja preferida' e, como falou na palestra de Atibaia: 'Não bebo muita cerveja, mais quando bebo é Itaipava', seria ideal para nos dar força na chegada da marca na Bahia."

A frase acima foi enviada pelo dono da Cervejaria Petrópolis, Walter Faria, no dia 13 de novembro de 2013, para Paulo Okamoto, presidente do Instituto Lula.

Em e-mail intitulado, "Discurso do presidente", o empresário repassa informações a Okamoto sobre o tema a ser abordado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em palestra que ele faria na inauguração de uma fábrica de cervejas do grupo, em Alagoinhas, na Bahia, no dia 22.

A correspondência eletrônica foi apreendida pela Operação Lava Jato e registra "frases de propaganda a serem faladas" por Lula, no evento, a pedido do contratante da palestra, segundo interpreta a Polícia Federal, no laudo Nº 1.233/2016.

A presença de Lula na inauguração da fábrica foi paga como palestra para a LILS Palestras e Eventos, empresa que o ex-presidente abriu em 2011, após deixar o governo. Valor da palestra: R$ 449 mil.

A Polícia Federal e o Ministério Público Federal, em Curitiba, investigam se as palestras feitas por Lula ocultaram propinas de empresas que eram beneficiadas por ele, em negócios com o governo, especialmente na Petrobras. Entre 2011 e 2016, a LILS recebeu R$ 28 milhões, revelou quebra de sigilo da empresa. Quase metade disso, pago por empreiteiras acusadas de corrupção - quatro delas com delação premiada, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, UTC e Odebrecht.

Lava Jato

A Petrópolis, um dos novos focos da Lava Jato para 2017, pagou R$ 1,5 milhão para a empresa do ex-presidente, por três palestras. Os eventos eram inaugurações de fábricas da cervejaria. O grupo integra o grupo de maiores fontes de recursos da empresa de palestras de Lula.

Nova delatora da Lava Jato, a Odebrecht participou das obras da cervejaria da Petrópolis, na Bahia, e cedeu seu jato para o transporte do ex-presidente para o evento.

A nova frente de investigação sobre os pagamentos do Grupo Petrópolis a Lula tem relação com a delação premiada da Odebrecht, entregue neste mês pela Procuradoria Geral da República (PGR) ao ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), para homologação - o que deve acontecer no início de 2017.

Investigação

Lula é réu em dois processos penais abertos pelo juiz federal Sérgio Moro, este ano: o de julho, sobre o tríplex do Guarujá (SP), e o deste mês sobre a sede do Instituto Lula e um apartamento em que o petista mora em São Bernardo do Campo. Nos dois casos, o ex-presidente é acusado de supostos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, envolvendo propinas da OAS e da Odebrecht.

O laudo com dados de pagamentos da Petrópolis e troca de e-mails dos executivos do grupo com pessoas ligadas a Lula foram anexados no último mês ao inquérito policial que também apura crimes de corrupção e lavagem de dinheiro nos recebimentos da LILS e do Instituto Lula.

As investigações devem embasar nova denúncia criminal da força-tarefa da Lava Jato, em Curitiba, contra o ex-presidente - que já é réu em cinco processos criminais.

Garoto-propaganda

"Eu vim nessa inauguração, meu caro Walter, não é porque apenas eu sou um bom bebedor de cerveja. Eu não vim aqui apenas para conhecer a Hortência, para conhecer o Cigano, para me encontrar com o Jaques Wagner. Eu vim aqui porque eu não consigo entender a cabeça de algumas pessoas que as vezes costuma não acreditar no Brasil. Eu vim aqui Walter, porque não é possível que algumas pessoas neste País continuem com complexo de vira-lata, acreditando que tudo que vem de fora melhor do que o daqui", discursou Lula.

Estavam presentes no evento o então governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), ex-ministro do governo Dilma Rousseff e homem de confiança de Lula, o ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli, o dono do Grupo Petrópolis e os empresários Emílio Odebrecht e Marcelo Odebrecht - todos alvos de investigação da Lava Jato por corrupção e lavagem de dinheiro. Além de celebridades como a jogadora de basquete Hortência e o lutador Cigano.

"Eu duvido que a gente tome no mundo uma cerveja melhor que a Itaipava", disse Lula. "A melhor cerveja que o povo nordestino vai beber. Cerveja de qualidade."

Na apresentação, Lula enalteceu a geração de empregos no Nordeste por empresas nacionais, falou das conquistas de seu governo, em especial para os pobres, e propagandeou a Cerveja Itaipava, como solicitado pelo dono da cervejaria, sem seguir à risca o script proposto.

"Quando eu era presidente da República eu incomodava muita gente porque eu ia em qualquer inauguração de empresa. O Gabrielli sabe quantas vezes eu fui à Petrobras. O Wagner sabe quantas vezes eu vim na Bahia. Se tivesse a inauguração de uma fábrica que fazia operação plástica no rabo de um calango, eu lá estaria para prestigiar."

Pagamentos

O laudo 1.233/2016 registra os pagamentos feitos pelo Grupo Petrópolis e lista uma série de e-mails em que foi acertada a participação no evento da Bahia, em novembro de 2013. Além de Walter Faria e Okamoto, Fábio Luis Lula da Silva, o Lulinha, e seu sócio Fernando Bittar - o dono oficial do sítio de Atibaia, que a Lava Jato afirma ser do petista - são copiados nas mensagens.

Numa das mensagens anexadas ao laudo da PF, os organizadores do evento combinam que o deslocamento de Lula até a Bahia seria feito em um jato que pertence a Odebrecht e acertam que Emílio Odebrecht e seu filho, Marcelo Odebrecht, estaria também no voo. A empreiteira foi responsável pela construção da fábrica da cervejaria na Bahia.

Em outro e-mail, Paulo Cangussu, funcionário do Instituto Lula, confirma para o executivo do Grupo Petrópolis que recebeu "uma confirmação" que poderiam ser colocados no voo "os Odebrechts" e indica a lista de alimentos e bebidas que deveriam ser disponibilizados na "sala VIP" de espera em que o petista ficaria. "Whisky Blue Label de preferência, ou Black Label" integra a lista de pedidos.

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