Corrupção e manobras políticas marcam os bastidores dos investimentos do FI-FGTS, o fundo mantido com o dinheiro do trabalhador. É o que mostram delações premiadas de investigados em diferentes operações criminais, como Lava Jato e Sépsis.
Cruzando os depoimentos com os investimentos, as denúncias indicam que 47,7% dos recursos liberados para empresa envolveram o pagamento de propinas. O valor pode crescer, porque alguns suspeitos de integrar os esquemas no FI-FGTS e na Caixa Econômica Federal, responsável pela gestão do FGTS, ainda estão sob investigação.
O FI-FGTS foi criado em 2007. Tem hoje um patrimônio R$ 32 bilhões para suportar projetos que buscam fortalecer a combalida infraestrutura nacional, em áreas como transporte, energia e saneamento. Cerca de R$ 24 bilhões estão investidos em empresas por meio de ações compradas em bolsa, cotas em fundos, participações em negócios e debêntures. Pelas denúncias, R$ 11, 4 bilhões alocados diretamente em empresas transformaram o dinheiro do trabalhador em moeda para negociatas entre políticos, seus emissários e empresários.
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Esquema
A delação que sustenta a maior parte das investigações é a de Fábio Cleto ex-vice-presidente de Fundos de Governo e Loterias da Caixa. Ele detalhou o esquema e apontou como cúmplices o ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que está preso em Curitiba, o investidor Lúcio Funaro, preso em Brasília, e seu ex-sócio Alexandre Margotto.
Cunha e Funaro negociam delações. Margotto já fez a sua, corroborando parte do relato de Cleto. O empresário Joesley Batista, que recebeu R$ 940 milhões do fundo para por de pé a fábrica de celulose Eldorado, também deu detalhes que confirmam as histórias do ex-executivo da Caixa. Relatos semelhantes aparecem entre as 77 delações de executivos da Odebrecht. Uma delas, por exemplo, relata propina para um ex-conselheiro do FGTS ajudar na liberação de recursos do FI para a Usina Santo Antônio, em que a Odebrecht é sócia. Somando o que foi liberado para saneamento, transporte e Santo Antônio, a Odebrecht recebeu mais de R$ 5,5 bilhões do FI-FGTS.
Cleto contou que pessoalmente se envolveu numa dezenas de transações ilícitas no FI-FGTS, que renderam mais de R$ 7 milhões em propinas em valores de hoje (R$ 520 mil em dinheiro, US$ 2,1 milhões em depósitos no exterior). Nada teria vindo a público não fosse um detalhe: a pedido de Cunha, as propinas eram depositadas numa conta da construtora Carioca, na Suíça. Após ser alvo de uma busca e apreensão da Polícia Federal, Cleto descobriu que a Carioca havia delatado esses pagamentos para o Ministério Público Federal. Percebeu que não tinha como escapar. Consultou o criminalista Adriano Salles Vanni e decidiu também delatar.
Defesas
A Caixa, que é responsável pela gestão dos recursos do FGTS, enviou nota ao Estado declarando que coopera integralmente com as investigações das autoridades e que criou forças tarefas específicas, constituídas por empregados da área jurídica, financeira e de risco da instituição, para analisarem todos os investimentos do FI-FGTS. "Todo o trabalho é acompanhado pela corregedoria da Caixa, que instaura procedimentos de apuração de responsabilidade sempre que identificadas irregularidades", diz o texto.
Em uma dessas diligências internas, as equipes chegaram a ouvir o ex-executivo Fábio Cleto, que delatou o esquema de corrupção no fundo e no banco estatal. A preocupação era entender o nível de comprometimento da equipe e existência de irregularidades nos procedimentos internos. "Em resposta, o senhor Fábio Cleto negou a participação de empregado da Caixa ou irregularidade nos procedimentos", destaca a nota. Ainda assim, as análises internas prosseguem, sendo que os trabalhos são objeto de reuniões regulares entre equipes da Caixa e representantes do Ministério Público Federal e da Polícia Federal. As defesas de Cunha e Funaro negam acusações.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.