Em entrevista ao JC, o diretor de investigação e combate ao crime organizado da Polícia Federal, Eugênio Ricas, diz que plano para combater fake news deve ficar pronto em, no máximo, 40 dias. Para ele, País pode pagar por causa de mentiras na eleição.
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JORNAL DO COMMERCIO – A Polícia Federal participa de um grupo de trabalho com o MPF e o TSE para formalizar um protocolo de como atuar em relação às fake news na campanha deste ano. Qual o prazo para finalizar e as bases deste documento?
EUGÊNIO RICAS – Isso foi uma demanda do ministro Fux, que vai assumir a presidência do TSE em fevereiro. Ele está extremamente preocupado – e com razão – com a interferência das fake news nas eleições agora de 2018. Em razão disso, ele convocou o MPF e a PF para uma primeira reunião. Foi deliberado a criação de um grupo de trabalho composto por servidores destes três órgãos para estabelecer um protocolo de atuação dos órgãos no que tange às fake news nas eleições. É estabelecer o que cada um tem que fazer e como fazer. O que nós acreditamos é que é também uma grande oportunidade para que seja elaborada uma minuta de proposta de alteração legislativa para delimitar melhor o que é fake news e dar condições para órgãos como a PF, o Ministério Público e o Judiciário trabalharem. Nós vamos agendar a primeira reunião para a semana que vem. E o prazo de trabalho não foi estabelecido, mas eu acredito que seja razoável 30 ou 40 dias no máximo para a gente estabelecer esse protocolo e, se for o caso, gerar essa minuta de proposta legislativa. Não pode ser mais do que isso, pois temos que encaminhar para o Congresso a minuta e dar andamento aqui para os policiais de como vai ser a atuação da Polícia Federal durante as eleições.
JC – Atualmente, quem cria ou divulga fake news está cometendo algum crime?
RICAS – A legislação é muito antiga, muito arcaica. O que nós temos hoje em matéria de lei para coibir essa prática? Quando a gente fala de eleição, a gente tem o Código Eleitoral, que fala que é crime divulgar notícia falsa a fim de prejudicar candidato ou partido. A pena é detenção de dois meses a um ano. O Código Penal tem ali as previsões de crimes contra a honra, de injúria e difamação. E nós temos a Lei de Segurança Nacional, que fala em espalhar boatos que gerem pânico na sociedade. Agora, assim, são leis que não foram criadas com o advento da internet. É uma legislação que não prevê a atuação dos órgãos policiais no combate a esse tipo de delito. E não deixa muito claro o que é fake news, as consequências disso, até onde vai a liberdade de expressão das pessoas e onde passa a ser crime. É uma legislação muito antiga para combater um mal que é do presente, do século 21. Essa é uma dificuldade muito grande que os órgãos de persecução penal vão ter.
JC – O senhor considera que o maior desafio para os órgãos de controle nestas eleições é essa falta de legislação ou o ambiente da internet, que é de difícil fiscalização?
RICAS – Não dá para falar que um desafio é maior que o outro. É uma situação muito complexa. A gente sabe que as pessoas se valem de servidores no exterior. A disseminação das notícias é muito rápida. As mídias sociais e os aplicativos de comunicação permitem que uma notícia falsa se proliferem com muita rapidez. Isso tudo gera muita dificuldade para a investigação. Dificuldade que é mais agravada ainda em razão da falta dos mecanismos previstos por lei que dêem condições à Polícia Federal de trabalhar. Por exemplo, hoje nós temos dificuldade para acessar cadastros, para obter algumas informações, que acabam deixando a investigação muito lenta.
JC – Da Polícia Federal, quem são essas pessoas?
RICAS – São três delegados e um perito. A gente mobilizou duas coordenações para atuar nisso aí. Tem a coordenação de polícia fazendária, que vai trabalhar nisso através da unidade do serviço de repressão a crimes cibernéticos. E nós temos também a coordenação de defesa institucional, que faz o combate a crimes eleitorais. Elas vão atuar em conjunto.
Opinião
JC – Na sua avaliação, qual o principal problema causado por essas fake news no processo eleitoral?
RICAS – É que uma mentira tem o potencial de interferir no resultado de uma eleição. Ela compromete a avaliação do eleitor. Isso é extremamente danoso. Porque o eleitor precisa escolher seu candidato em razão de características do candidato. A partir do momento em que um terceiro divulga informações falsas sobre essas características, isso pode influenciar a decisão do eleitor e fazer com que ele escolha uma pessoa que não tem as características desejadas. E, aí, o País todo acaba pagando por quatro anos em razão de uma escolha equivocada que foi consequência de uma mentira.