HISTÓRIA DO FUTEBOL

Náutico e Santa Cruz foram campeões estaduais em 1989 e 1993 com um preparador físico como técnico. Saiba quem foi

Charles Muniz assumiu comandos da equipe durante as disputas, fez revolução e surpreendeu os céticos levantando duas taças

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Marcelo Cavalcante

Publicado em 22/08/2021 às 10:38
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O Náutico de 1989 e o Santa Cruz de 1993 têm algo em comum que vai além das suas conquistas estaduais. As duas equipes levantaram o troféu com muito sacrifício e fazendo um trabalho de recuperação enquanto a competição estava em curso. No comando das ações, um preparador físico que resolveu aceitar o desafio de ser técnico interinamente, mas que com os resultados positivos, foi efetivado e fez história. Foi assim que Charles Muniz, hoje com 69 anos, traz na memória e no peito, muitas lembranças e alegrias no futebol no futebol. E olhem que, por pouco, ele não conquistava uma trinca de taças. Afinal, além do Tricolor e do Timbu, o Charles Muniz, nas mesmas circunstâncias, levou o Sport à final do Campeonato Pernambucano de 1990, e não fosse uma atuação polêmica da arbitragem, poderia ter comemorado mais um título diante do Santa Cruz, no Arruda. Charles pode não ser o Rei do Futebol Pernambucano. Mas tem muitas histórias para contar e títulos para colocar na estante.

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Foi nos Aflitos que começou sua saga vencedora. Charles Muniz chegou ao Náutico em 1988 para integrar a comissão técnica que começou a temporada sob o comando de Valmir Loruz. Uma equipe forte, com jogadores experientes foi montada: Martorelli, Levi, Lúcio Surubim, Bandeira, Júnior. Mas o título estadual não foi para os Aflitos. No segundo semestre, o Timbu conseguiu o acesso à Série A com um time mais forte, desde a chegada do artilheiro Bizu, que se entrosou bem Nivaldo, Augusto, Erasmo.

A base foi mantida para 1989. O objetivo era a conquista do Campeonato Pernambucano. A diretoria alvirrubra contava com a permanência de Luciano Sabino Pinho, mas não houve acerto. O jeito foi trazer um novo treinador. O escolhido foi Roberto Oliveira. Mesmo com uma forte equipe, o Timbu perdeu o título do primeiro turno para o Santa Cruz e Roberto perdeu o emprego. A diretoria alvirrubra fez o convite para Charles Muniz. "Sempre tive um sonho de ser treinador. E via naquele momento uma excelente  oportunidade", relata.

O elenco contava com Levi e Júnior nas laterais. Muller era um volante técnico. Erasmo um meia habilidoso, entrosado com Augusto, um autêntico camisa 10. Na frente a velocidade de Nivaldo casava com o oportunismo de Bizu. "Era um time muito forte e a diretoria extremamente participativa, que dava tudo que os jogadores precisavam". O Náutico chegou à final contra o Santa Cruz com mais força. Nos dois primeiros jogos, empate. Na partida decisiva, vitória por 2x1, e um título que o Timbu não
conquistava há quatro anos. 

BOBBY FABISAK/JC IMAGEM
Charles Muniz, Técnico e preparador físico de futebol. Como técnico, foi campeão pernambucano 2 vezes. - BOBBY FABISAK/JC IMAGEM

QUASE CAMPEÃO POLÊMICO

No ano seguinte, voltava ao seu papel de preparador físico. Mas em outro clube: o Sport. Viu o time ser montado por Lori Sandri, mas que não engrenou. "Lori tinha uma capacidade incrível. Uma pessoa inteligente que dava harmonia ao grupo. Mas não deu liga. Numa viagem a Garanhuns, ele me chamou e disse que havia recebido uma proposta para o futebol árabe". Charles foi convocado imediatamente para ser o comandante da equipe. "Acredito que a diretoria me escalou porque tive sucesso no Náutico no ano anterior", pontua.

A sua estreia no comando do Sport foi marcante. Mas da pior forma. Contra o Estudantes, em Timbaúba, o Leão venceu por 4x0, mas perdeu o lateral-esquerdo João Pedro, que faleceu, vítima de um infarto fulminante sofrido dentro de campo. "Lembro que na manhã do dia do jogo, eu conversava com Neco, que estava afastado do elenco e eu reintegrei, e com João Pedro. Disse a Neco que ele merecia estar no time. E João Pedro disse que havia deixado uma cerveja na geladeira de casa, para comemorar a
vitória. Vencemos, Neco fez dois gols, mas João não voltou para casa", comentou sem esconder a tristeza.

Na base da conversa, Charles Muniz conseguiu estimular a equipe vencer seus adversários. A equipe tinha jogadores experientes como o goleiro Paulo Victor, os zagueiros Aílton e Márcio Alcântara. E uma garotada, como Didi, Lopes, Sérgio Alves e Mirandinha. O Sport chegou à final contra o Santa Cruz quando ninguém acreditava. Na partida no Arruda, venceu no tempo normal, por 1x0. E teria que vencer novamente na prorrogação. Fez um gol. Mas a arbitragem anulou, alegando impedimento de Márcio
Alcântara. Até hoje o lance gera discussão.

"Chegamos naquela decisão com uma equipe recheada de jovens, enquanto o Santa Cruz, treinada por Erandir Montenegro, estava forte e vinha fazendo uma grande campanha. Mesmo assim, chegamos perto. Quando Márcio Alcântara fez o gol, Lembro do árbitro apontar para o centro do gramado e confirmar o gol. Depois, voltar atrás e anular. Sentimento de tristeza muito grande", relembra. Charles Muniz ganhou uma moral imensa na Ilha do Retiro. Mas não permaneceu no clube para a disputa da Série B de 1990. Algo que ele sente arrependimento até hoje. "A diretoria queria me efetivar como técnico da equipe. Mas eu tinha receio de ficar desempregado caso os resultados não acontecessem. O meu desejo era acumular
a função de preparador físico. Teria mais segurança. Mas nem propus. Decidi ir embora", disse.

CONQUISTA HISTÓRICA

Com duas finais e um título conquistado, como treinador, Charles Muniz poderia ter se afastado da preparação física e seguido uma nova carreira. Mas não foi bem assim. Ele seguiu no limbo entre as duas funções. Foi assim que ele viveu no Santa Cruz, em 1993. Muniz era o preparador físico no começo da temporada. O comando técnico estava nas mãos de Cláudio Garcia. O Santa Cruz vencia, mas não empolgava. Garcia foi demitido. Adivinhem quem assumiu o seu lugar? Sim, Muniz.

Nesse trabalho de recuperação, Charles contou com reforços importantes no elenco. O goleiro Marcelo, ex-Bragantino e que chegava pela primeira vez no clube. E o atacante Washington, ídolo do Fluminense e que no Arruda desandou a fazer e se tornou a peça mais importante no time. O Santa Cruz chegou na final contra o Náutico. A equipe havia estabelecido a confiança. A torcida embalou. Mas na primeira partida da final, derrota por 1x0. No segundo confronto, o Timbu, jogando pelo empate, abriu o placar com Paulo Leme, cobrando falta. Para complicar mais ainda, o Santa Cruz perdeu Washington, expulso.

"Quando eu estava descendo para o vestiário, no intervalo, a imprensa veio me perguntar o que eu iria fazer. Eu respondi: 'os atos são mais importantes que os fatos'. A gente precisava de uma transformação na forma como jogar. A gente não poderia mais tomar gol e encontrar uma forma de fazer gol. Era preciso ter calma e que todo mundo participasse. Eu dizia para o grupo que teríamos outro jogo", lembra.

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Charles Muniz, Técnico e preparador físico de futebol. Como técnico, foi campeão pernambucano 2 vezes. - BOBBY FABISAK/JC IMAGEM
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Charles Muniz, Técnico e preparador físico de futebol. Como técnico, foi campeão pernambucano 2 vezes. - BOBBY FABISAK/JC IMAGEM
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ESTÁGIO Charles esteve com a seleção às vésperas do Mundial de 86 - BOBBY FABISAK/JC IMAGEM
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Charles Muniz, Técnico e preparador físico de futebol. Como técnico, foi campeão pernambucano 2 vezes. - BOBBY FABISAK/JC IMAGEM

O final daquela decisão emociona Charles Muniz até hoje. Assim como também o torcedor do Santa Cruz. O Tricolor conseguiu a virada no placar no finalzinho do tempo normal. E segurou o Náutico na prorrogação. Um título daqueles que não se esquece. Se guarda no coração.

Charles Muniz relembra tudo com uma dose gigante de saudade. O seu último trabalho como técnico foi no Vera Cruz, em 2019. Como concluiu o curso de técnico, está vacinado contra a covid-19 e o jogos voltando, ele espera voltar a reviver emoções na beira do gramado. "Tenho saudades de viver isso tudo. Mas o futebol é dinâmico, né? Quem sabe eu volto".

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