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Sem registro da Anvisa, curativo de pele de tilápia não chega no SUS e pode não chegar no Líbano

A pele de tilápia funciona como um curativo biológico e é aplicada em pessoas vítimas de queimaduras

JC
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Publicado em 07/08/2020 às 15:52 | Atualizado em 07/08/2020 às 18:37
MARIANA PARENTE/ESP. O POVO
PESQUISA Produto é utilizado para o tratamento de queimaduras - FOTO: MARIANA PARENTE/ESP. O POVO

O curativo de pele de tilápia, idealizado pelo pesquisador pernambucano Marcelo Borges, voltou ao noticiário ao ser colocado à disposição dos libaneses para auxiliar no tratamento das vítimas da explosão ocorrida na última terça-feira (3) em Beirute. O curativo foi colocado como promessa para o Sistema Único de Saúde (SUS), e elogiado pelo presidente Jair Bolsonaro, além de já ter sido mote dos seriados médicos de sucesso "The Good Doctor" e "Grey's Anatomy". Recentemente, a pesquisa também foi abordada no documentário grego "Peolpe After the Fire", que disputa um prêmio internacional. Mas, por falta de registro da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a pesquisa ainda não é realidade no SUS e pode não chegar ao Líbano.

Os pesquisadores do projeto, desenvolvido pelo Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento de Medicamentos (NPDM) da Universidade Federal do Ceará (UFC), sob coordenação de Edmar Maciel e Odorico de Moraes, ofereceram assistência técnica e todo o estoque de 40 mil cm² de pele para o tratamento de vítimas da explosão em Beirute, capital do Líbano. A explosão deixou cerca de cinco mil feridos, mais de 100 mortos, e desabrigou mais de 260 mil pessoas.

Segundo Borges, existem dois entraves que estão dificultando o auxílio às vítimas. Um deles é que o curativo ainda não tem o registro da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), sendo considerado um estudo experimental. O segundo problema envolve o transporte de material biológico para o exterior. "Esses dois aspectos dificultam, do ponto de vista burocrático. Normalmente essa tramitação poderia demorar semanas, mas nós estamos tentando destravar a burocracia. Até agora, não conseguimos avançar muito", relata o médico.

Marcelo afirma que o registro do material como produto para a saúde junto à Anvisa ainda não se deu porque os pesquisadores não encontraram um parceiro industrial para produzir o curativo em larga escala. A falta de registro complica também o uso da pele da tilápia no SUS. "A nossa pendência com a Anvisa é justamente essa. Precisamos do parceiro industrial, mas ainda não tivemos êxito em relação a esse objetivo", completa o médico.

A pesquisa, que começou a ser desenvolvida em 2015, além de auxiliar pacientes em Pernambuco e no Ceará, é desenvolvida nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás e Paraná. No exterior, em países como a Colômbia, Argentina, Estados Unidos e Alemanha. "A produção atual fora do Brasil é menos burocrática porque enviamos em condição de pesquisa, pequenas amostras. É uma tramitação mais simples, porque é de pesquisador para pesquisador", disse Borges. Até o momento, cerca de 300 pessoas foram beneficiadas pelo material.

A pele de tilápia funciona como um curativo biológico. Ela é aplicada na ferida dos pacientes, após o processo de esterilização feito pelos pesquisadores e adere à área que sofreu a queimadura. De acordo com o cirurgião plástico, o material reduz os riscos de infecção, reduz a dor à metade e o tempo de tratamento em dois dias, se comparado aos meios tradicionais de tratamento. A pele é usada, predominantemente, em queimaduras de segundo grau.

Documentário grego aborda curativo de pele de tilápia

A pesquisa sobre o uso da pele de tilápia como curativo para pessoas que sofrem queimaduras é um dos temas abordados no documentário "People After The Fire", da jornalista grega Hara Bourgani. O curta-metragem concorre ao 7º International Documentary Film Festival of Ierapetra, que acontece na Grécia, disputando com 173 filmes de 30 países. A votação é aberta ao público e ocorre até este sábado (8), no site do Festival.

Marcelo Borges explica que o documentário foi baseado nos incêndios de grandes proporções que aconteceram na Grécia em 2018. O curta expõe como o país não estava preparado para tratar vítimas de queimaduras. "O documentário aborda novas perspectivas de tratamento para queimados. A jornalista identificou que nossa pesquisa estava tendo impacto mundial e entrou em contato conosco", relata. O médico conta que, no curta, fala sobre o tratamento dos queimados com a pele de tilápia, a forma de produção deste material, os benefícios e os resultados do estudo.

Pesquisa retratada em séries médicas 

O tratamento com pele de tilápia também foi assunto em séries médicas de grande audiência, como The Good Doctor, em 2017, e Grey’s Anatomy, em março de 2019. As produções da ABC destacaram a descoberta brasileira, que ganhou ainda mais repercussão internacional.

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Pele de Tilápia sendo abordada no seriado Grey's Anatomy - reprodução

Em The Good Doctor, que conta a história do jovem cirurgião autista Shaun Murphy (Freddie Highmore), um acidente de ônibus deixa vítimas com graves queimaduras no sexto episódio da primeira temporada. O personagem Jared Kalu (Chuku Modu) aposta na pele de tilápia como alternativa.

Já no 17º episódio da 15ª temporada de Grey’s Anatomy, intitulado “And Dream of Sheep”, o médico Jackson Avery (Jesse Williams) revoluciona o tratamento de queimaduras ao substituir a pele humana queimada por pele de peixe. Na cena, a pesquisa brasileira é citada, bem como as vantagens do tratamento ter custos e efeitos colaterais bem menores do que os tratamentos-padrão. 


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Pele de Tilápia sendo abordada no seriado Grey's Anatomy - FOTO:reprodução

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