Vestibular

Especialistas defendem Enem digital: 'mais seguro'

Entendimento é que sistema, se bem cuidado, é menos vulnerável

AMANDA RAINHERI
Cadastrado por
AMANDA RAINHERI
Publicado em 05/07/2019 às 6:55
Foto: Marcelo Aprígio/JC
Entendimento é que sistema, se bem cuidado, é menos vulnerável - FOTO: Foto: Marcelo Aprígio/JC
Leitura:

O anúncio, na última quarta-feira (3), da implementação da versão digital do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) a partir de 2020 levantou uma série de questionamentos entre estudantes e especialistas. Um dos pontos encabeçam a lista de esclarecimentos dos futuros participantes é a segurança das redes contra invasões e fraudes. Analistas entendem que a modernização do Enem representa um avanço e torna a aplicação do exame mais segura sob diversos aspectos.

Alertam, porém, para alguns cuidados. “É um avanço necessário. A nossa sociedade está sendo digitalizada, todas as organizações estão passando por esse processo”, defendeu Cláudio Marinho, ex-secretário de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente de Pernambuco e consultor do Porto Digital. “Não é um sistema 100% seguro. A realidade digital tem suas falhas e exige cuidados, como, por exemplo, com hackers. Mas o sistema que temos hoje, com a impressão e distribuição de provas em todo o território nacional em um só dia, abre muito mais possibilidades de fraudes”, argumenta.

Carlos Sampaio, CIO do Cesar, explica que, dependendo da programação utilizada, a aplicação pode ser bastante segura. “Os programas podem ser divididos em várias categorias. Uma delas e a mais tradicional é cliente-servidor, em que o cliente executa as tarefas ou preenche formulários, e isso é enviado a um servidor. Acredito que esse seja o formato que será aplicado ao Enem.

Se for, é bastante seguro. Isso porque a conexão do servidor com a estação de trabalho (computador utilizado pelo estudante) deve ser única para aquela função específica. Não é passível de ser atacada, porque as portas abertas no servidor são única e exclusivamente para receber respostas daquele cliente. Nada impede que vulnerabilidades sejam descobertas, mas acho difícil.”

O MEC e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) ainda não entraram em detalhes operacionais sobre a versão digital do Enem. Em coletiva na última quarta, o ministério deixou claro que não irá adquirir novos computadores para a aplicação do exame. Serão utilizados os equipamentos já disponíveis em instituições de ensino. Por esse motivo, explica Carlos Sampaio, os equipamentos precisarão passar por preparo prévio antes da realização do exame. “O candidato não pode simplesmente sentar na frente do computador que já foi utilizado por outras pessoas para fazer outras coisas sem nenhum tipo de preparação. O computador precisará passar por uma validação. Quando utilizados para provas, os equipamentos passam por uma varredura para ver se eles estão de acordo com determinado padrão. Se não respeitar esse padrão esperado de proteção, ele não deixa executar o software.”

O governo federal anunciou um investimento de R$ 20 milhões para a etapa piloto, em 2020, quando 50 mil candidatos de 15 capitais brasileiras poderão realizar a prova no modelo digital. Os custos estão entre as preocupações da ex-secretária-executiva do MEC Maria Helena Guimarães de Castro. “O Inep precisa tomar muito cuidado, planejar muito bem. Como o ministério anunciou um processo de implementação até 2026, eu acredito que os cuidados serão tomados”, falou, em entrevista à Rádio Jornal. “O MEC tem recursos para investir nesse novo modelo – porque ele vai exigir, no início, um investimento grande – e, ao mesmo tempo, manter o modelo antigo funcionando?”, questionou Maria Helena, que já foi presidente do Inep.

Para os especialistas, a mudança do formato analógico para o digital abre novas possibilidades para o exame. Ex-presidente do Inep e membro do Conselho Nacional de Educação (CNE), Chico Soares defende que a prova digital não deva ser uma mera reprodução do exame impresso. Para ele, a mudança só faz sentido se servir para explorar ferramentas que tornem a avaliação mais dinâmica. “Hoje, há a possibilidade de elaborar questões que vão muito além da múltipla escolha. Se o que está sendo pensado é fazer o mesmo Enem de múltipla escolha, mas no ambiente digital, isso é automatizar o jurássico”, a firmou Soares.

No digital, tudo deixa uma espécie de “rastro”. É possível determinar, por exemplo, quanto tempo o candidato leva para responder cada quesito ou por onde começa e termina a prova. “É possível ter muito mais informações sobre os alunos, principalmente quando o Enem for 100% digital (a partir de 2026, segundo previsão do MEC). O conhecimento que virá da experiência de cada um dos que tentam o Enem servirá para tornar melhor o sistema de avaliação. Isso é muito importante, porque vivemos em uma sociedade cada vez mais exigente quanto à qualidade dos recursos humanos para trabalho”, defende Marinho, do Porto Digital.

PRIORIDADES

Apesar de avaliar de forma positiva a iniciativa, Chico Soares defende que existem outras questões mais urgentes a tratar sobre o Enem. “Com a reforma do ensino médio, precisamos saber o que o Enem vai cobrar. O que está sinalizado seria um primeiro dia de conteúdos gerais e um segundo dia de conteúdos específicos relacionados à área da carreira escolhida, mas isso não está definido, e é uma decisão essencial.”
A reforma do ensino médio foi sancionada em 2017, e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) da etapa foi aprovada em 2018. Havia uma previsão de que as mudanças nos currículos e avaliações se riam implementadas até 2020.

A opinião é compartilhada por Arnaldo Mendonça, diretor do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de Pernambuco (Sinepe). “Existem questões mais urgentes do que a transformação do Enem em digital. O ano já está na metade, e as instituições precisam se preparar para o próximo ano letivo. Precisamos de um direcionamento do MEC sobre as mudanças no ensino”, pontua ele, que também é diretor pedagógico do Colégio Dom, em Olinda, Grande Recife.

Últimas notícias