Os protestos realizados por camelôs do entorno do Mercado de São José nos últimos dias botaram em pauta o problema do ordenamento do comércio informal no bairro de São José, no Centro do Recife. Mas o local não é o único da região a acumular desentendimentos entre ambulantes e o poder público. A Avenida Conde da Boa Vista, um dos principais corredores da capital, é exemplo de descontrole urbano. Andar pelas calçadas é um verdadeiro desafio: bancas e estandes estão por toda a parte, ocupando ambos os lados do passeio. Assim como acontece no bairro de São José, os problemas da Boa Vista estão bem longe de uma solução.
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Acessórios para celulares, roupas, calçados, eletrônicos, lanches e até mesmo serviço de design de sobrancelhas. Na avenida é possível encontrar de tudo, menos organização. A situação, que já é caótica, fica ainda mais complicada nas proximidades do Shopping Boa Vista, onde sobra apenas um estreito corredor para os pedestres. Em 2015, a prefeitura cadastrou 140 comerciantes na área. Outra centena ficou de fora, gerando conflitos entre os trabalhadores e a Secretaria de Mobilidade e Controle Urbano. “Deu um tempo e todos voltaram. Não adianta querer tirar os ambulantes daqui. A solução é cadastrar todo mundo. Se precisar transferir, que seja para um local próximo, porque colocar a gente longe é o mesmo que acabar com as nossas vendas”, defende a ambulante Luzinete Ramos, 39 anos.
No mesmo ponto há cinco anos, ela já teve as mercadorias apreendidas inúmeras vezes. “Quando pagamos a multa, eles só devolvem o carro. Nunca recebi meus produtos de volta. É muito prejuízo. A gente só quer trabalhar”, protesta Luzinete. A situação da ambulante é a mesma de muitos outros trabalhadores da região. “Já levei até a prefeitura informações sobre 64 ambulantes, para que o cadastro fosse realizado, mas eles não fazem nada. Querem tirar o povo de todo jeito. Pior é que nem sabem para onde levar. Só dizem que temos que ir para outro lugar. Isso não é solução, é transferir o problema”, critica Edvaldo Gomes, presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Comercio Informal (Sintraci).
A promessa para a Conde da Boa Vista era a construção de shoppings populares, mas apenas um saiu do papel e nem chegou a ser concluído. “Sinceramente? Acho que não vai ter solução. Por mais que arranjem um novo local para os camelôs, eles irão voltar. Nada vai ser melhor para eles do que uma avenida de grande circulação, próximo a um shopping, como é aqui”, lamentou a agente administrativa Maiara Pessoa, 30. Quem circula pela via concorda que o desordenamento dos ambulantes atrapalha. “É quase impossível se mover”, critica a corretora Jaqueline Campelo, 41.
Ontem, a manhã foi protestos no bairro de São José, pelo terceiro dia consecutivo. Um grupo de aproximadamente 30 pessoas queimou pneus e obrigou o comércio a fechar as portas. O presidente do Sintraci informou que uma nova manifestação está marcada para a manhã de hoje, com concentração na Rua Direita. “Vamos para as ruas todos os dias, se for necessário. Precisamos que algo seja feito para os ambulantes que trabalham no Centro do Recife.”
OUTRO LADO
Sem recursos para concluir os dois shoppings populares planejados para receber ambulantes do Centro do Recife, na Boa Vista, a prefeitura pode apelar para mais um paliativo no ordenamento dos espaços públicos. Conforme o secretário de Mobilidade e Controle Urbano, João Braga, camelôs que atuam no bairro poderão ser realocados para os terrenos adquiridos nas Ruas da Saudade e Sete de Setembro, mesmo sem as devidas estruturas.
“É possível que o da Rua da Saudade fique pronto este ano, mas ainda não temos recursos, inclusive para começar o outro. Se não conseguirmos, vamos instalar os ambulantes nos terrenos sem as obras mesmo”, afirma o secretário.
No pequeno galpão situado na esquina da Rua da Saudade com a Rua Riachuelo – cuja obra orçada em R$ 500 mil começou há quase três anos para receber 70 ambulantes – faltam construir banheiros, colocar piso, fazer as instalações elétrica e hidráulica e adquirir as bancas. Nos dois terrenos em frente, o projeto de um shopping de mil metros quadrados integrado ao Expresso Cidadão não vingou e o espaço é utilizado para guardar barracas e veículos de ambulantes.
“Nós esperávamos que as obras ficassem prontas, mas não ficaram por falta de recursos”, observa Braga, acrescentando que os esforços agora estão concentrados na conclusão do Centro Comercial do Cais de Santa Rita (que vai no quarto ano e ganhou fôlego com aporte de R$ 5,3 milhões da Secretaria de Turismo do Estado) e de um prédio anexo ao Mercado de São José, que deverão abrigar cerca de 600 ambulantes do entorno, até o final do semestre. Com isso, será possível revitalizar o bairro.
O secretário reforça que o município não vai recuar diante dos sucessivos protestos realizados por um grupo de 30 ambulantes não cadastrados removidos das ruas Direita e da Penha, que estão obrigado lojistas da área a fecharem as portas há três dias. “É preciso entender que a cidade não é a casa da mãe Joana que todo mundo faz o que quer”, criticou.
Braga diz que as mudanças vêm sendo discutidas com comerciantes formais e informais há muito tempo e nega qualquer possibilidade de cadastrar novos ambulantes. “Como deixar cadastro aberto para todo dia chegar mais 10, mais 15, mais 20 pessoas? Isso ia dar em que? A cidade tem direito a preservar seus espaços e o cidadão quer as calçadas livres, desocupadas. A rua não é só do ambulante”, declarou.
O secretário diz que além de pais de família que precisam trabalhar, entre os protestantes tem arruaceiros, “especialistas em tocar fogo e amedrontar a cidade e pessoas interessadas em adquirir quiosques para revender”. E avisa: “Aqueles que estão na rua procurem outro espaço, que eu também não vou indicar qual é, eu só sei que ao redor do mercado (como Ruas Direita, das Calçadas, Rangel, da Penha e Praça Dom Vital) todos vão sair. Os cadastrados vão para o Cais de Santa Rita. Aos outros não posso prometer lugar porque não vou entregar depois".