O comerciante e industrial Delmiro Gouveia (1863-1917), o homem que construiu a primeira usina hidrelétrica no Nordeste brasileiro, acaba de ganhar uma nova biografia. Desta vez, escrita por um pesquisador inglês radicado em João Pessoa (PB) e fascinado pela história do cearense que nasceu numa família pobre, teve pouca educação formal e quando foi assassinado em Alagoas era um empreendedor de projeção nacional.
“Era um visionário, destemido, nunca fugiu de briga e representou a modernidade”, descreve William Edmundson, autor da publicação Delmiro Gouveia – Biografia de um Pioneiro, lançada pela editora paraibana Ideia. Delmiro Augusto da Cruz Gouveia inaugurou a hidrelétrica de Angiquinho em 1913, no Sertão alagoano, com água captada da cachoeira de Paulo Afonso, no Rio São Francisco.
A usina, implantada com tecnologia suíça e alemã e recursos norte-americanos, é uma das obras inovadoras do comerciante, que cresceu no Recife nas últimas décadas do século 19. Na capital pernambucana, em 1899, Delmiro Gouveia cria um centro comercial moderno, o Mercado Coelho Cintra, para venda de alimentos e outras mercadorias, dando nova vida ao bairro do Derby. “Foi o primeiro shopping center do País”, compara o pesquisador.
“Ele levou para o Derby diversão e vendas. O mercado tinha eletricidade, esgoto e água encanada”, afirma Albertina Malta, coordenadora-geral do Centro de Estudos e Documentação da História Brasileira da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj-Cehibra). Incendiado por inimigos do comerciante em janeiro de 1900, o prédio do mercado foi reconstruído e hoje é ocupado pelo Quartel da Polícia Militar de Pernambuco.
No Derby, área central do Recife, ele também abriu o Hotel Internacional. Ao lado do Mercado Coelho Cintra, era um dos melhores da América do Sul, diz William Edmundson, em entrevista concedida no Edifício Delmiro Gouveia, casarão do século 19 em Apipucos, Zona Norte do Recife. Nessa casa, onde morou por pouco tempo, o industrial recebia a nata da sociedade.
Desde a década de 1970 a edificação pertence à Fundaj e nela funciona a Villa Digital, espaço multiusuário para promover pesquisas e compartilhar produções científicas e culturais da fundação. O industrial deixa o Estado em 1902, depois de raptar Carmela Eulina do Amaral Gusmão, jovem de 16 anos, e se muda para Pedra (atual município Delmiro Gouveia), no Sertão de Alagoas.
Inovações
Carmela, segunda esposa e mãe dos três herdeiros de Delmiro Gouveia, era filha ilegítima do ex-governador Sigismundo Gonçalves (1845-1915), desafeto político do comerciante. “Ela abandona o marido e perde o direito de ficar com as crianças. Lutou muito na Justiça para recuperá-las, mas sempre esbarrou no pátrio poder”, diz William Edmundson.
Em Pedra, Delmiro Gouveia funda a hidrelétrica; a Companhia Agroindustrial Mercantil, que produzia as linhas de algodão Estrela (Angiquinho fornecia energia elétrica para a fábrica); e uma vila modelo para operários; além de construir mais de 500 quilômetros de rodovias no Sertão para o tráfego de automóveis.
Os operários tinham jornada de trabalho de oito horas, não pagavam aluguel pelas casas da vila, a água e a luz era gratuitas e contavam com médicos, dentistas e creche, diz ele. Para escrever a biografia William Edmundson recorreu ao Acervo Delmiro Gouveia da Fundaj, visitou Angiquinho e os vestígios da vila operária em Alagoas, leu literatura já existente sobre o comerciante e se debruçou em fontes primárias.
“Delmiro Gouveia era um homem fora do tempo, polêmico, cheio de inimigos e muito documentado”, declara Albertina Malta. O livro custa R$ 50, incluindo o frete para qualquer lugar no Brasil, e pode ser adquirido no site da editora (www.ideiaeditora.com.br). Haverá lançamento na Fundaj, com data a ser marcada.