Na última matéria sobre a situação das áreas hiperendêmicas da esquistossomose em Pernambuco, Veronica Almeida (texto) e Bobby Fabisak (fotos) mostram soluções caseiras de saneamento, propostas de especialistas e o que governantes pretendem fazer a partir do mapeamento traçado pelo Programa Estadual de Enfrentamento de Doenças Negligenciadas.
Toda a água consumida na casa de Valdilene Francisca da Silva, 40 anos, é coada num pano. O abastecimento vem de uma cacimba, perto da casa dela, em Ipojuca, Grande Recife, mesmo município onde vem sendo instalada a Refinaria de Petróleo Abreu e Lima e funcionando o Estaleiro Atlântico Sul. O desenvolvimento ronda a região, mas ainda não chegou onde Valdilene mora, na zona rural, Engenho Timboassu, uma das áreas críticas de transmissão da esquistossomose. Lá, 95% dos 120 moradores vivem sem água de abastecimento público, conforme o Programa de Enfrentamento das Doenças Negligenciadas da Secretaria Estadual de Saúde (Sanar).
O tratamento artesanal da água é o único de que Valdilene dispõe para diminuir os riscos aos dois filhos e à mãe, uma idosa que vive adoentada. O tecido na boca da jarra de barro, que serve de filtro, barra impurezas maiores, mas não livra os consumidores de micróbios invisíveis ao olho humano. A fervura custa gás e o cloro ela não tem em casa. São 80 litros d’água “tombados” por ela todo dia, para banho, matar a sede, fazer comida e limpar a casa. “Fico com as costas que não aguento. A pisada é dura”, reforça.
Por sua vez, o Sanar, que selecionou essa e outras 118 localidades com problemas parecidos, inclusive com falta de banheiro e fossa séptica, quer ajudar as prefeituras a buscarem soluções coletivas com efeito significativo na melhoria da qualidade de vida das pessoas expostas ao verme causador de cirrose hepática, paralisia, hipertensão pulmonar e mata. Já identificou 15 possíveis projetos com fontes distintas de financiamento, como Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e Ministério das Cidades. “Os projetos são para construção de redes de esgoto, banheiros e rede de abastecimento de água”, explica o sanitarista Alexandre Menezes, coordenador do Sanar. “Para cada situação municipal, será construído um projeto nas oficinas que pretendemos realizar a partir de maio”, completa. Já estão programadas em Ipojuca, Aliança e São Lourenço da Mata.
O Congresso Estadual de Secretários Municipais de Saúde de Pernambuco, a ser realizado em Garanhuns nos dias 9 e 10 de maio, vai incluir saneamento na pauta e na carta que irá compor um documento maior, nacional, em prol da saúde pública. “É extremamente oportuno ter a precisão desse diagnóstico do Sanar”, avalia Ana Claudia Callou, presidente do Conselho dos Secretários Municipais de Saúde (Cosems-PE). Ela defende a busca de financiamento tripartite (município, Estado, União). “Para ter saúde é necessário dar destino certo ao lixo, garantir água tratada encanada, coletar e tratar os esgotos”, reforça.
O presidente da Associação Municipalista de Pernambuco, entidade que congrega os prefeitos, José Patriota Filho, lembra que o Executivo municipal enfrenta dificuldades financeiras. “O financiamento é escasso para obras de saneamento e o Fundo de Participação dos Municípios está em queda”, alega. O FPM é composto por receitas federais arrecadadas pela União e repassadas aos Estados e prefeituras.