Epidemias em quatro décadas

Quem deve ser o alvo da futura vacina contra a dengue ?

Pesquisadores da Fiocruz, em Pernambuco, vão tentar responder

Veronica Almeida
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Veronica Almeida
Publicado em 15/03/2015 às 12:39
Alexandre Gondim/JC Imagem
Pesquisadores da Fiocruz, em Pernambuco, vão tentar responder - FOTO: Alexandre Gondim/JC Imagem
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Pernambuco está ajudando nos estudos para uma futura imunização dos brasileiros contra a dengue. O pesquisador Ernesto Marques, do Departamento de Virologia e Terapia Experimental (Lavite) da unidade local da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Recife, realiza pesquisa encomendada pelo Ministério da Saúde que tenta definir o público-alvo da futura arma contra a doença transmitida pelo Aedes aegypti. A expectativa é apresentar em um ano respostas a algumas questões, como a faixa etária que mais se beneficiaria do produto.

A nova epidemia de dengue no Recife e no Sertão de Pernambuco marcam uma trajetória de dor, morte e impacto na saúde pública que já alcança a quarta década. Para mostrar desafios e perspectivas, o JC inicia neste domingo série que se estenderá nos dois próximos, ouvindo especialistas e quem viveu no corpo as faces da longa epidemia. A  vacina, cada vez mais próxima e ao mesmo tempo cercada de indagações, é o primeiro tema.

O prazo para o mercado ter uma vacina contra os quatro vírus está mais curto. O laboratório estrangeiro Sanofi Pasteur prevê para este ano o lançamento de um produto com vírus atenuados que daria proteção em torno de 60% contra a dengue e diminuiria em 95% as formas graves da doença. É resultado de 20 anos de estudo e a proposta deve ser apresentada à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) até julho. Quando a Anvisa aprovar, a inclusão nos postos de saúde ainda dependerá de análises de custos e efetividade da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologia no SUS, explica o Ministério da Saúde. Há ainda dois projetos de vacinas tetravalentes envolvendo laboratórios brasileiros: o Butantan (São Paulo), cujos testes clínicos com humanos estão na segunda fase, e o Bio-Manguinhos (Rio de Janeiro), que deve iniciar essa etapa entre 2015 e 2016. Todos os dois com parceria externa.

O estudo da Fiocruz de Pernambuco é feito em parceria com a Universidade de Pittsburgo (EUA), para identificar as populações e faixas etárias onde haveria o máximo de benefício com menor risco. “O ideal, teoricamente, seria começar a imunização mais cedo, nas faixas de menor idade. Mas é preciso equilibrar o máximo de retorno com o mínimo de risco”, explica Ernesto Marques, lembrando a hipótese de vacinar uma faixa etária maior, que já teve dengue ao menos uma vez. Assim, a proteção da vacina agiria contra os outros três vírus, evitando casos com complicações, os mais temidos, que levam à morte rápida. O pesquisador afirma que a análise em curso observa o comportamento da doença em todas as regiões do País, pois a transmissão é dinâmica e muda em cada uma delas. “No Recife, o pico de casos é atingido duas a três semanas após o de cidades vizinhas”, adianta.

Para os médicos e gestores, a chegada da vacina seria um alívio importante. Projeções matemáticas, explica Ernesto Marques, indicam que demoraria em torno de 30 anos após a entrada do quarto vírus para se obter uma situação de equilíbrio na transmissão, pois a maioria da população estaria exposta e imunizada naturalmente contra diferentes sorotipos. No caso do Brasil, isso só aconteceria na década de 2040. 

João Régis, professor aposentado da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco, que vivenciou a entrada da doença na década de 1980 como médico e gestor do controle de doenças no Estado, a imunização é o melhor caminho. “As outras medidas exigem mudança de hábito.” 

O infectologista Vicente Vaz, que acompanhou os últimos 20 anos da doença no Hospital Universitário Oswaldo Cruz, a referência no Recife para casos graves, também se mostra otimista. “A ideia de que vacinas são úteis e oferecem proteção real está plantada na maior parte da população em todas as classes sociais. A vacina funcionará bem? Torcemos que sim”, diz, apostando, sobretudo, numa produção brasileira. 

Para Claudenice Pontes, coordenadora de Combate à Dengue no Estado, mesmo que a imunização torne-se realidade, será preciso manter o controle dos mosquitos, transmissores de chicungunha. 

 

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