SAÚDE

Nova teoria explica como o vírus zika poderia causar microcefalia

Hipótese considera que a malformação congênita pode ser consequência de uma reação exacerbada de um fenômeno chamado de apoptose

Cinthya Leite
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Cinthya Leite
Publicado em 24/02/2016 às 5:52
Guga Matos/JC Imagem
Hipótese considera que a malformação congênita pode ser consequência de uma reação exacerbada de um fenômeno chamado de apoptose - FOTO: Guga Matos/JC Imagem
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Uma conversa entre médicos levou à construção de uma nova teoria sobre os caminhos que o zika vírus pode percorrer para culminar com o aparecimento da microcefalia no último trimestre da gravidez – um detalhe que tem intrigado os especialistas em medicina fetal, que geralmente só conseguem dar um diagnóstico dessa malformação em torno da 28ª semana de gestação. “Ele começou a descrever as imagens das ultrassonografias e questionou o que poderia fazer cair o potencial de crescimento do cérebro de uma forma súbita. Logo achei que a justificativa seria um mecanismo de suicídio celular no sistema nervoso central”, diz a patologista e imunologista Patricia Jungmann, ao contar sobre os primeiros diálogos com o médico Pedro Pires, coordenador de Medicina Fetal do Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros.


Juntos eles defendem que a microcefalia pode ser consequência de uma reação exacerbada de um fenômeno chamado de apoptose, que acontece a partir da 20ª semana de gestação no sistema nervoso central. Trata-se de um mecanismo de triagem de neurônios para que só células perfeitas e funcionais sejam selecionadas. A formação do cérebro normal passa por essa etapa. “Mas a presença de uma infecção viral nessa fase aceleraria esse mecanismo em condições acentuadas. A nossa hipótese é que a presença do zika vírus nos neurônios seja um indutor de apoptose, que promove uma redução de massa cinzenta no sistema nervoso, um sinal observado nas tomografias”, explica Patricia, professora da Universidade de Pernambuco e doutora em patologia pelo Instituto Pasteur, em Paris.

Ao estudar esse mecanismo produtor da microcefalia, ela assume que o zika (ou algum outro mecanismo isolado ou associado ao vírus) deve estar ativo na 20ª semana de gestação, etapa em que há o cenário para a apoptose acontecer. “É provável que seja por esse mecanismo que a microcefalia esteja sendo observada tardiamente na gravidez. O detalhe é que a indução de apoptose não evoca resposta inflamatória.” Essa hipótese explicaria por que muitos dos bebês com a malformação não têm sinais de encefalite e, assim, mamam, movimentam-se e crescem. “Se fossem constatados sinais de inflamação ativa decorrentes da infecção, as consequências seriam mais graves do que as sequelas já identificadas. Quando olho para um bebê com microcefalia, vejo a malformação, mas que é compatível com a vida.”

Ela fez esse raciocínio depois de ver resultados de 46 amostras do líquido cefalorraquidiano de bebês com microcefalia acompanhados pelo Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc). “Em 80% dos resultados, não existe evidência de inflamação do sistema nervoso central.” Confirmada a hipótese de apoptose para o mecanismo da microcefalia, Patricia acredita que será possível a comunidade científica pensar em estratégia para inibir a entrada do vírus na célula. O artigo que descreve essa nova teoria está sendo analisado por pesquisadores do Texas e deve ser submetido a uma revista científica de medicina fetal.

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