Estreia

Crítica: 'Ameaça Profunda' é terror claustrofóbico no fundo do mar

O filme se passa a onze mil metros de profundidade do oceano, onde um grupo deve fazer de tudo para alcançar a superfície

João Rêgo
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João Rêgo
Publicado em 10/01/2020 às 17:06
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O filme se passa a onze mil metros de profundidade do oceano, onde um grupo deve fazer de tudo para alcançar a superfície - FOTO: Reprodução
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Ameaça Profunda chega às salas dos cinemas do Recife. Pelo seu título, a produção de William Eubank parece entregar praticamente quase tudo que se pode esperar de um filme do gênero. E não está errado. Estão lá a tensão constante, o suspense e um elemento espacial que vai operar sobre todas essas coisas.

A onze mil metros de profundidade no oceano, um grupo de pesquisadores se vêem presos as estruturas do laboratório subaquático em que trabalham. O lugar está ruindo por um motivo ainda desconhecido (ameaças externas ou falha técnica?). Nesse cenário, os personagens devem tentar achar uma saída em meio ao caos para, ao menos, alcançar a superfície.

Em Ameaça Profunda temos sobretudo um funcionamento esquemático excelente. Quase todos os arquétipos do gênero marcam presença; a protagonista destemida atormentada por fantasmas do passado (vivida pela incrível Kristen Stewart, cada vez mais uma atriz completa), o capitão experiente e com um senso de honra inabalável (o francês Vincent Cassel), o alívio cômico, com o ator de comédias T.J. Miller, além de casal em potencial.

O ambiente espacial do filme é a sua parte principal. São onze quilômetros mar a fundo – ou seja, temos tensão, escuridão, claustrofobia, pressão e toda imensidão aterrorizante do oceano. As estruturas do laboratório estão ruindo, então o grupo deve agir rápido. A jornada se torna de obstáculos e correria.

A câmera acompanha tudo isso muito bem no que é um dos pontos altos do filme. Toda decupagem espacial opera no sentido de não eximir o gráfico e o terror pela elevação da dúvida ou da sugestão. Tudo se resolve em pouco tempo, e com pouco espaço para grandes configurações de planos.

O que emula a recente e boa franquia de filmes de tubarão Medo Profundo. A magia não está nas grandes sequências bem elaboradas, mas como criar medo e tensão em ambientes espacialmente reduzidos – o que só torna o resultado ainda mais interessante.

Em termos de narrativa, o filme também honra as pré-disposições do gênero. No início, Ameaça Profunda parece se aproximar de Ad Astra – Rumo às Estrelas (obra do norte-americano James Gray e talvez o melhor “blockbuster” lançado em 2019), com divagações internas e intimistas da personagem de Kristen Stewart.

O que, felizmente, é deixado para trás em termos do andamento da trama (que também não deixa de ser recheada de picos dramáticos, falações e irritantes alívios cômicos).

MORTE ANUNCIADA

A vibe passa a se aproximar mais do clássico Alien, O Oitavo Passageiro – um grupo de sobreviventes que mais parecem um cardápio para as criaturas subaquáticas que vão aparecendo (alerta de spoilers).

Elas, no entanto, são um ponto baixo no longa. Pela concepção imagética escura dos espaços (afinal, o longa se passa no fundo do oceano) o design delas, que já é pouco inspirador, torna-se quase invisível e inofensivo.

Isso porque, além de tudo, o filme parece encarnar algumas tendências estabelecidas pela produção Super 8, de J.J Abrams e Steven Spielberg; o monstro como um enigma a ser revelado, por completo, apenas na catarse final do filme. O que funcionaria se tivesse qualquer mistério interessante por trás de tudo. Mas as informações dispostas ao longo do filme são tão escassas que no final o interesse se retém a apenas quem será o próximo a morrer ou quem irá sobreviver.

Uma característica positiva em partes. Primeiro porque o filme não tenta ressoar como uma grande metáfora cheia de simbologias a serem decifradas por “mentes superiores” (vírus que vem infectando boa parte das produções de horror e suspense atuais). Segundo porque não há sequer espaço para isso acontecer – tudo se resolve em imagem, ação e catarse; uma experiência relativamente recompensadora.

De negativo, Ameaça Profunda parece ser construído sobre um bom rascunho de gênero, mas que se retém a ser apenas isso. Tudo funciona de acordo; todas as mortes são previsivelmente anunciadas, assim como os sustos e até o final de toda a trama.

Não há necessidade de ser mais que isso, provavelmente. Mas com um potencial imagético tão grande – os mistérios do fundo do mar, as criaturas subaquáticas –, se pode exigir um pouco mais.

Ou talvez o sarrafo ande tão baixo tratando-se do horror que não se torna literatura de simbologias ou sugestões de subtextos, que não querer ser mais que um bom filme de gênero (o que tanto dramaticamente, como imageticamente, Ameaça Profunda é) seja o suficiente para se tornar uma obra a ser vista.

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