poesia visual

Arnaldo Antunes vai atrás do limite das palavras em exposição

A mostra 'Palavra em Movimento' traz um panorama de mais de 30 anos da poesia visual do músico

Diogo Guedes
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Diogo Guedes
Publicado em 16/08/2018 às 8:15
Sérgio Bernardes/JC Imagem
A mostra 'Palavra em Movimento' traz um panorama de mais de 30 anos da poesia visual do músico - FOTO: Sérgio Bernardes/JC Imagem
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Quando ainda viajava e andava pelas ruas com uma câmera analógica, o músico e poeta Arnaldo Antunes começou a colecionar fotografias de palavras e inscrições urbanas – placas, pichações, outdoor, sinalização. Como uma palavra nunca é só uma palavra para o ex-Titãs, ele foi fazendo daquilo um registro do repertório do vocabulário visual urbano. Em 2014, junto com o curador Daniel Rangel, começou a transformar as imagens na instalação O Interno Exterior, o mais recente dos seus trabalhos presentes na exposição Palavra em Movimento, que tem abertura nesta quinta (16), às 19h, na Caixa Cultural Recife.

A mostra reúne trabalhos de Arnaldo criados a partir do início dos anos 1980. Em paralelo a sua trajetória musical – e também em conjunção com ela –, Arnaldo tem mantido uma produção essencial de poesia, sempre com um diálogo com a vertente visual. Seu mais recente livro, Agora Aqui Ninguém Precisa de Si, lançado em 2015, reiterava esse interesse pela palavra como mais do que um elemento da frase: ela é sempre uma potencial fratura na linguagem com seus múltiplos sentido e formatos. Palavra em Movimento marca a busca em explorar esse caráter visual da palavra fora do território da página.

Assim, as obras da exposição dialogam com a escultura interativa, a espacialidade, o vídeo, a sonoridade, a caligrafia, as colagens e até os quadrinhos. Em todas elas, há uma noção da palavra como algo capaz de se deslocar, de transcender a prisão que pode ser o gesto de leitura comum. A palavra “wind” (vento, em inglês) pode ser manipulada pelo público para virar “mind” (mente, no mesmo idioma). A escultura Eutro traz sentidos distintos a partir de onde se vê. As fotografias de O Interior Exterior dão lugar a outras, em velocidades diferentes, num conjunto de monitores: o espectador quase nunca vê a mesma coleção de termos. “Às vezes, a imagem em si é poética, como a de uma lixeira escrito ‘divino’. Essas fotografias são uma descoberta das coisas que estão por aí”, conta Arnaldo.

O interesse do poeta veio junto com o gosto pela canção na adolescência. “Eu acompanhava as revista de poesia dos anos 1970 e fui mergulhando nessa dimensão gráfica do texto poético. A poesia concreta e a canção também estabeleciam um diálogo, com Torquato Neto, Paulo Leminski, Caetano. Foi algo muito presente nessa minha formação, e cresci muito lendo e pensando nessa relação”, revela. “Acredito que, assim como a música traz uma entonação para as palavras, livros e imagens trazem uma entonação gráfica para elas. São novos sentidos para o que é escrito.”

DESLOCAMENTO

Para Arnaldo, a ideia de movimento é fundamental na mostra. “A gente explora o movimento provocado pelo espaço, pela manipulação de objetos, pela cidade, pela caligrafia da escrita”, aponta. De certo modo, a exposição continua o processo de pesquisa de Arnaldo. “Palavra em Movimento explora o limite visual das palavras. O uso de elementos extra verbais é sempre em prol de trazer mais sentidos para o que está escrito. A poesia é isso, sentidos em sua carga máxima”, define.

Daniel começou a pensar a reunião da obra visual de Arnaldo a partir do longo processo de criação da sala O Interno Externo, quando conheceu os trabalhos anteriores do poeta. Assim, quando surgiu um convite para uma mostra maior, pensou nessa retrospectiva. “O público que não conhece esse outro lado de Arnaldo vem para a exposição esperando algo ligado a sua carreira musical, fotos do tempo de Titãs e dos Tribalista. Acho legal porque as pessoas saem surpresas”, comenta. Além disso, ele ressalta que Palavra em Movimento mostra os vários processos que o artista explorou ao longo da trajetória. “Arnaldo tem mais de um centena das colagens. Ele trabalha com mergulhos em materiais e processos. Por exemplo, só de monotipias ele fez umas 500. Escrevia com a mão esquerda, ao contrário, para sair impresso no sentido certo”, explica o curador.

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