Despedida

Emoção toma conta do velório de Francisco Brennand, na Várzea

Capela Imaculada Conceição, onde acontece a cerimônia, fica dentro da Oficina de Cerâmica Francisco Brennand

Flávia de Gusmão
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Flávia de Gusmão
Publicado em 19/12/2019 às 19:56
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Atualizada às 23h18

Passavam poucos minutos das 19h desta quinta-feira (19) quando o carro que transportava o corpo do artista plástico Francisco Brennand parou diante da Capela Imaculada Conceição, projetada pelo arquiteto Paulo Mendes da Rocha em parceria com Eduardo Colonelli. 

No centro da nave, como peça de destaque em meio a um ambiente de encantadora simplicidade, criada pelo ceramista, prevalece a figura igualmente despojada da santa à qual o templo é dedicado. Mendes da Rocha e Colonelli projetaram a construção sacra, intervindo minimamente na estrutura original, onde antes havia um casarão em ruínas datado do século 19. O antigo edifício já tinha servido como escola e cinema, de sua estrutura original restando apenas paredes e alguns arcos.

Francisco Brennand – um consumidor voraz de todas as formas de arte e um defensor convicto da educação como forma de mudar o rumo de vidas –, em sua derradeira jornada até a Oficina que começou a construir em 1971, foi conduzido sob forte emoção. Seu caixão foi depositado aos pés da Conceição, aberto, para que os amigos, admiradores e familiares pudessem prestar a última homenagem.

O semblante tranquilo. A barba branca projetando-se sob o tecido alvo e rendado, flores vermelhas sobre o corpo pareciam simbolizar a paixão nunca extinta pelo ofício da arte – F.B. só deixou seu ateliê para se internar no hospital quando deu por concluído o último quadro que iria compor uma exposição, ainda em cartaz, na galeria Espaço Brennand, em Boa Viagem. Sua produção era incessante, em quantidade e qualidade: só em 2019 foram 100 quadros pintados.

A filha que herdou o nome da Santa – Conceição –, mas que todos conhecem como Neném, acercou-se do pai e acomodou ao seu lado a inseparável bengala. Aos 92 anos, Francisco a utilizava como auxílio no caminhar, para pontuar seu sempre eloquente discurso ou apenas para repousar as mãos quando mergulhava em suas enigmáticas pausas reflexivos.

O corpo será cremado em cerimônia para íntimos

O velório estava apenas começando e iria se prolongar pela madrugada a dentro. Uma parente que mora fora do país estava sendo aguardada para chegar ao local às 4h da manhã. Só nesta sexta-feira (20), por volta das 8h, o corpo retornará ao cemitério Morada da Paz, onde será cremado em cerimônia para os mais íntimos.

As cinzas vão voltar ao pacífico convívio com a atmosfera que não poucas pessoas, no mundo todo, já se referiram como “mágica”: as terras do Engenho Santos Cosme e Damião, cercada pela Mata Atlântica, onde foi erguida a Oficina que espalhou o nome Francisco Brennand para toda parte, sem fronteiras. No conjunto arquitetônico que acomoda mais de duas mil obras, o artista já havia concebido o mausoléu ao qual batizou de O Templo do Sacrifício, é lá que repousará.

A capela – que ao lado do Templo do Sacrifício, da Accademia, do Anfiteatro, do Salão de Esculturas, do Templo Central e do auditório formam o complexo de edificações – foi recebendo visitantes ao longo da noite. Colegas de ofício como João Câmara, Tiago Amorim, Roberto Ploeg e Edson Menezes marcaram presença. “A Oficina é um campo de estudo para qualquer pessoa que deseja fazer da arte uma profissão”, declarou Farfan. “Não há ninguém como Brennand. Sua obra é um achado arqueológico futurista. Era uma magia conversar com ele e absorver sua erudição, um artista que, como poucos no Brasil e no mundo, dominava várias técnicas, dialogava com todas as linguagens”, complementa.

“Dificilmente um artista não se sente o centro do mundo, portanto, ele é o herói que tudo comanda. O que não quer dizer que não exista algo que fique à mercê de uma corrente que flui no Universo e que independe de nossa vontade e escolha”, concluiu o artista na última entrevista concedida e publicada na edição do Jornal do Commercio do dia 15/12.

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Biografia de Francisco Brennand

Francisco de Paula Coimbra de Almeida Brennand nasceu em 11 de junho de 1927, no Recife. Contemporâneo do homem que obrigou o século 20 a articular o termo cubismo, Francisco Brennand aprendeu a modelar a argila com o artista Abelardo da Hora, então funcionário da fábrica cerâmica de seu pai. Incentivado por Cícero Dias, ao viajar para a Europa em 1949 para estudar com nomes como André Lhote e Fernand Léger, conheceu as obras de Miró e Picasso. O susto-revelação: o pintor da Guernica era também ceramista. “Ali, vi que a cerâmica poderia ter a mesma grandeza da pintura a óleo, meu interesse até então. Ou até mais”, diz ele, dono de obras de dimensões totemicamente públicas como a Coluna de Cristal e outras peças mimetizadas no corpo físico do Recife.

Ricardo B. Labstier/Acervo JC Imagem
Um dos maiores artistas plásticos contemporâneos, Francisco Brennand deixou sua marca mundo afora - Ricardo B. Labstier/Acervo JC Imagem
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Em novembro de 1971, o artista começou a reconstruir a Velha Cerâmica São João da Várzea - Ricardo B. Labstier/Acervo JC Imagem
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Um dos maiores artistas plásticos contemporâneos, Francisco Brennand deixou sua marca mundo afora - Ricardo B. Labstier/Acervo JC Imagem
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Francisco de Paula Coimbra de Almeida Brennand nasceu em 11 de junho de 1927, no Recife - Ricardo B. Labstier/Acervo JC Imagem
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Francisco de Paula Coimbra de Almeida Brennand nasceu em 11 de junho de 1927, no Recife - Felipe Ribeiro/JC Imagem
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21-11-2016 - Francisco de Paula Coimbra de Almeida Brennand nasceu em 11 de junho de 1927, no Recife - André Nery/Acervo JC Imagem
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Francisco de Paula Coimbra de Almeida Brennand nasceu em 11 de junho de 1927, no Recife - Ricardo B. Labstier/Acervo JC Imagem
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Francisco Brennand aprendeu a modelar a argila com o artista Abelardo da Hora - Ricardo B. Labstier/Acervo JC Imagem
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Um dos maiores artistas plásticos contemporâneos, Francisco Brennand deixou sua marca mundo afora - Ricardo B. Labstier/Acervo JC Imagem
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Um dos maiores artistas plásticos contemporâneos, Francisco Brennand deixou sua marca mundo afora - Ricardo B. Labstier/Acervo JC Imagem
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Um dos maiores artistas plásticos contemporâneos, Francisco Brennand deixou sua marca mundo afora - Ricardo B. Labstier/Acervo JC Imagem
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Brennand viajou para a Europa em 1949 para estudar com nomes como André Lhote e Fernand Léger - Ricardo B. Labstier/Acervo JC Imagem
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Um dos maiores artistas plásticos contemporâneos, Francisco Brennand deixou sua marca mundo afora - Ricardo B. Labstier/Acervo JC Imagem
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Um dos maiores artistas plásticos contemporâneos, Francisco Brennand deixou sua marca mundo afora - Ricardo B. Labstier/Acervo JC Imagem
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Além do bairro da Várzea, as obras de Brennand podem ser vistas em vários pontos do Recife - Marcos Michael/Acervo JC Imagem
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Um dos maiores artistas plásticos contemporâneos, Francisco Brennand deixou sua marca mundo afora - Ricardo B. Labstier/Acervo JC Imagem
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Um dos maiores artistas plásticos contemporâneos, Francisco Brennand deixou sua marca mundo afora - Ricardo B. Labstier/Acervo JC Imagem
Marcos Michael/Acervo JC Imagem
Um dos maiores artistas plásticos contemporâneos, Francisco Brennand deixou sua marca mundo afora - Marcos Michael/Acervo JC Imagem
Marcos Michael/Acervo JC Imagem
Parque das Esculturas tem a marca de Francisco Brennand - Marcos Michael/Acervo JC Imagem
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Parque das Esculturas tem a marca de Francisco Brennand - Marcos Michael/Acervo JC Imagem
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Parque das Esculturas tem a marca de Francisco Brennand - Marcos Michael/Acervo JC Imagem
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Francisco Brennand no Parque das Esculturas - Marcos Michael/Acervo JC Imagem
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Além do bairro da Várzea, as obras de Brennand podem ser vistas em vários pontos do Recife - Marcos Michael/Acervo JC Imagem
Alexandro Auller/Acervo JC Imagem
Um dos maiores artistas plásticos contemporâneos, Francisco Brennand deixou sua marca mundo afora - Alexandro Auller/Acervo JC Imagem
Marcos Michael/Acervo JC Imagem
06/04/2004 - Brennand inspeciona instalação de mural de sua autoria no Aeroporto do Recife - Marcos Michael/Acervo JC Imagem
Marcos Michael/Acervo JC Imagem
06/04/2004 - Brennand inspeciona instalação de mural de sua autoria no Aeroporto do Recife - Marcos Michael/Acervo JC Imagem
Larissa Alves/Acervo JC Imagem
1-6-2007 - Larissa Alves/Acervo JC Imagem
Alexandre Belém/Acervo JC Imagem
- Alexandre Belém/Acervo JC Imagem
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Sérgio Bernardo/Acervo JC Imagem
25-10-2016 - Sérgio Bernardo/Acervo JC Imagem
Alexandre Belém/Acervo JC Imagem
- Alexandre Belém/Acervo JC Imagem
Felipe Ribeiro/JC Imagem
- Felipe Ribeiro/JC Imagem
Sérgio Bernardo/Acervo JC Imagem
25-10-2016 - Sérgio Bernardo/Acervo JC Imagem
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Alexandre Gondim/JC Imagem
21-3-2014 - Alexandre Gondim/JC Imagem

Conhecido como o Mestre dos Sonhos, em novembro de 1971, o artista começou a reconstruir a Velha Cerâmica São João da Várzea, fundada pelo seu pai em 1917. Esse conjunto, encontrado em ruínas, deu início a um colossal projeto de esculturas cerâmicas que deveriam povoar os espaços internos e externos do ambiente.

Além do bairro da Várzea, as obras de Brennand podem ser vistas em vários pontos do Recife: desde o Parque das Esculturas, próximo do Marco Zero, na área externa do Shopping Recife e também no Aeroporto dos Guararapes.

Repercussão da morte

"A cultura de Pernambuco tem muitas marcas, sendo uma das mais ricas do País. E, sem dúvida, uma das grandes referências está justamente na produção artística de Francisco Brennand. É uma grande perda para todos. Sua obra marcou época e contribuiu com a projeção do Estado no mundo. Deixa para todos nós um dos maiores valores: sua produção artística que tanto nos orgulha”, evidenciou o empresário João Carlos Paes Mendonça, presidente do grupo JCPM.

“Francisco Brennand foi um artista notável, um homem à frente do seu tempo, como mostra o reconhecimento que obteve, ao longo da sua trajetória, no Brasil e no exterior. Ele pertence a uma geração de artistas que elevaram Pernambuco ao topo. Em meio ao imenso legado que Brennand nos deixa, dois são muito especiais: sua oficina-museu, na Várzea, e o Parque das Esculturas, hoje parte indelével do cenário do Bairro do Recife. São obras que vão perpetuar a memória desse artista na história do nosso Estado. Quero expressar meu profundo pesar a todos os seus familiares, amigos e admiradores neste momento de dor e tristeza", disse o governador Paulo Câmara, por meio de nota. Ele decretou luto oficial de três dias no Estado.

"Lamento perda do gigante pernambucano Francisco Brennand. Ele é para nossa arte o que Paulo Freire é para o nosso pensamento", disse o senador Cristovam Buarque nesta quinta-feira (19), no Twitter. "Francisco Brennand marcou a cultura e as artes do nosso país. Levou o nome de Pernambuco aos 4 cantos do mundo. Pernambuco de luto só tem a dizer: muito obrigado Francisco Brennand pela sua obra de vida", escreveu o deputado Daniel Coelho no microblog.

Veja outros depoimentos

Confira a última entrevista em vídeo de Brennand ao JC

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