Se Steve Jobs e Bill Gates tivessem nascido no Brasil seria um juiz federal e o outro, auditor fiscal. O mundo não iria contar com as inovações da Apple e Microsoft, mas os dois gênios estariam com a vida ganha. A máxima revela não apenas a ausência de uma atmosfera empreendedora no País, mas, principalmente, as aspirações daquele brasileiro de médio para diferenciado: entrar para o serviço público.
Leia Também
- Privilégios de servidores estão na mira do ajuste do governo federal
- Fundos tentam barrar bancos na gestão de previdência complementar de servidores
- Governo estuda elevar contribuição previdenciária de servidores
- Reajuste de servidores será adiado, mas deve ser concedido em 2018
- Governo planeja congelar salários de servidores públicos em 2018
É difícil encontrar alguém que não tenha recebido o conselho de “estudar para concurso”. A própria indústria de livros, apostilas, cursos confirma que o negócio é promissor.
Não é o caso aqui de criticar aquele que busca entrar no funcionalismo público. Numa democracia, cada um é livre para tentar o futuro profissional que quer.
A distorção que afeta o Brasil e os brasileiros, esta sim, passível de críticas, é a engrenagem histórica, jurídica e administrativa que privilegia uma casta em detrimento da ampla maioria de trabalhadores. Números do IBGE mostram que, em média, o trabalhador do serviço público ganha 63% mais que o da iniciativa privada. No ano passado, enquanto a remuneração do trabalhador privado encolheu 1,3%, a do servidor aumentou 1,5%.
O servidor goza de previdência própria, vários benefícios, penduricalhos salariais e, benesse das benesses, estabilidade no emprego. Já o celetista sofre com sucessivas crises. No auge da turbulência, pode perder o emprego. Aliás, independentemente de crise, está sempre com uma espada sobre a cabeça. Tem que superar metas, aumentar a produtividade, reduzir custos, oferecer ideias, mudar práticas, inovar. Do contrário, pode, facilmente ser substituído por alguém mais competente ou mais “barato” – ou ambos.
No serviço público, são poucas as áreas onde prevalece a meritocracia. A mesma estabilidade que protege uns poucos contra pressões políticas trava o aperfeiçoamento profissional de milhares. Quem paga por isso é o público, sobretudo os mais pobres, aqueles cuja vida depende do Estado.
Claro que existem exceções, gente abnegada que, para o orgulho de todos, se dedica honrosamente ao serviço público. Mas, como dito, são exceções.
A imagem que prevalece sobre o grosso da população é de um serviço ineficiente e, ainda assim, caro.
A remuneração no Executivo brasileiro pode chegar a R$ 22 mil, com é o caso do servidores do Banco Central. No Judiciário, o valor médio é de R$ 17.898, mas há casos de magistrados que ganham mais de R$ 50 mil. Na semana passada, veio à tona a história de juízes do Mato Grosso que receberam mais de R$ 500 mil em um mês. No Legislativo, a média é de R$ 15.982. No Ministério Público da União, R$ 15.623. Há salários altos na iniciativa privada? Claro. Mas é bom destacar que quem paga o salário do setor privado são as empresas privadas. O salário do funcionalismo é pago pelas taxas, impostos e contribuições de todos os brasileiros. De acordo com o orçamento aprovado para este ano, o governo federal gastará R$ 3,5 trilhões com todas as suas despesas. Deste valor, R$ 306,9 bilhões serão destinados ao pagamento de pessoal na esfera federal.
Na última terça, o governo anunciou medidas para tentar fechar as contas. Elevou a meta fiscal em R$ 20 bilhões (R$ 139 bilhões para R$ 159 bilhões), quando deveria simplesmente cumpri-la. Também elevou tributos sobre a aplicações financeiras e decidiu reonerar setores que foram beneficiados nos governos Dilma/Lula. Na coluna das despesas, mirou o serviço público. Cortou cargos, congelou salários e elevou a alíquota previdenciária de quem ganha acima de R$ 5,3 mil. Não é o caso de comemorar, mas pode-se dizer que o governo acerta ao livrar do seu pacote de maldades a grande massa de trabalhadores do setor privado.