A Cúpula da Cachaça divulgou, por esses dias, o ranking dos 50 melhores rótulos da bebida no Brasil. E lá estava ela: a pequena notável Sanhaçu. Única marca pernambucana na lista, cravou o quarto lugar na elite do setor, com sua cachaça envelhecida em barril de umburana. A conquista alça Pernambuco ao grupo dos melhores do País em padrão de qualidade.
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A Sanhaçu (nome de um pássaro nativo da América do Sul) é o que pode se chamar de uma cachaça politicamente correta. Toda a história da empresa está alicerçada em conceitos de sustentabilidade. É a primeira e única com certificação orgânica em Pernambuco e pioneira no uso de energia solar no Brasil. Localizada num pequeno sítio de 2,5 hectares no município de Grã Grande (distante 85 km do Recife), produz 16 mil litros da bebida por ano, utilizando processo de destilação artesanal em alambique de cobre.
“No início dos anos 1990 me aposentei da Marinha e decidi fugir da cidade grande. Vendi cinco linhas de telefone fixo que tinha e comprei esse sítio. Na época não tinha nem água nem energia e o solo era queimado do canavial. Começamos apostando em agroecologia, com a produção de frutas e hortaliças, mas era preciso investir em algo menos perecível e nos decidimos pela cachaça”, conta o fundador da Sanhaçu, Moacir Silva.
Apesar de ele e o filho, Oto Barreto Silva, serem apreciadores de cachaça, precisaram aprender tudo sobre a bebida, do processo produtivo à comercialização. “Meu pai é físico, eu sou engenheiro mecânico e minha irmã Elk é turismóloga. Precisamos nos capacitar para entrar no negócio”, conta Oto. A imersão no mundo da cachaça teve visita a fábricas em Minas Gerais, cursos com mestre alambiqueiro e orientação para compra dos equipamentos. A preparação começou em 2005 e a produção três anos depois.
A Sachaçu começou a produção com uma cachaça envelhecida por dois anos em barris de freijó (madeira da Amazônia). Depois incluiu o carvalho no mix e a mais nova experiência é com a umburana (madeira nativa do Nordeste e presente no Semiárido pernambucano). “A cachaça se diferencia de outros destilados porque pode ser envelhecida em vários tipos de madeira. Temos pelo menos 30 catalogadas. A Sanhaçu foi o primeiro experimento que fizemos com a umburana e deu muito certo”, destaca o especialista Jairo Martins, que assina o rótulo da Sanhaçu Umburana.
Por enquanto a Sanhaçu mantém uma clientela dentro do mercado brasileiro, comercializada em restaurantes e lojas de conveniência. “Já recebemos visita de empresas exportadoras, mas esbarramos em problemas como burocracia e escala de produção. Um comprador disse que precisava de um volume inicial de 26 mil litros. Como vamos disponibilizar isso se produzimos 16 mil litros por ano? Nosso processo é artesanal”, observa Moacir.
Os planos mais imediatos da empresa são outros, como a expansão da atividade turística. Há 4 anos a empresa oferece tour pela propriedade para estudantes e famílias. “Muitas pessoas querem ficar para dormir, por isso, vamos inaugurar uma pousada em 2017. É oferecendo conhecimento sobre a bebida que se quebra o preconceito com a cachaça. É preciso apresentar essa bebida autêntica do Brasil e que completa 500 anos ao consumidor, trazendo elementos como gastronomia e cultura”, defende Oto.
No tour pelo sítio, os turistas entendem porque a Sanhaçu é politicamente correta. A cana é cortada sem queima, o solo tratado sem agrotóxicos, os resíduos reaproveitados, a descartável cana de cabeça vira etanol, a empresa usa energia solar e mantém um hectare de mata nativa e árvores frutíferas. Para o público de estudantes, o passeio termina com um lanche que remete à nossa civilização açucareira: um copo de caldo de cana com pão doce.