Tecnologia

Modelo pernambucano de saneamento é exportado para a América Latina

Criação de engenheiro pernambucano está sendo financiada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento

Luiza Freitas
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Luiza Freitas
Publicado em 16/08/2016 às 13:40
Foto: André Nery/ JC Imagem
Criação de engenheiro pernambucano está sendo financiada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento - FOTO: Foto: André Nery/ JC Imagem
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Uma tecnologia pernambucana criada há mais de 40 anos está sendo exportada para a América Latina com a promessa de ajudar no desenvolvimento econômico e social de pelo menos cinco países. O sistema condominial de saneamento – como é chamado o método de coleta de esgoto mais barato e acessível a comunidades periféricas – foi selecionado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) em um projeto de mais de US$ 1,2 milhão. A ideia é incentivar instituições e governos a adotarem a técnica criada pelo engenheiro pernambucano José Carlos Melo, 73 anos. O sistema “made in Pernambuco” reconhecido mundialmente já atende cerca de seis milhões de pessoas. Por meio desse novo incentivo, já foi apresentado ao governo argentino e até o próximo ano também irá passar pelo Paraguai, El Salvador, Honduras e Nicarágua.

As vantagens do modelo de José Carlos diante do sistema de saneamento adotado na maior parte do Brasil e em outros países em desenvolvimento são evidentes. Na maioria das cidades, o encanamento das casas é ligado diretamente à rede de esgoto. Com isso, é necessária uma tubulação de grande porte mais extensa e, por isso, mais cara. Como é preciso realizar várias conexões entre os canos residenciais e o duto principal, também aumentam as chances de vazamentos.

No sistema condominial, o custo de implantação chega a ser 40% menor. A coleta de esgoto é realizada por cada quadra através de uma tubulação intermediária que se une à rede principal de esgoto. Com isso, a rede de grande porte não precisa passar por todas as ruas, diminuindo o custo e a quantidade de conexões. A manutenção, portanto, passa a ser mais fácil. “No Recife, por exemplo, quando há um problema, é preciso quebrar a rua inteira e os transtornos são muito maiores”, exemplifica o desenvolvedor do sistema.

Benefícios

Mas os benefícios vão além de questões técnicas. Por exigir menos da rede de esgoto, que é mais rígida, o sistema condominial consegue atender comunidades periféricas, que acabam sendo excluídas pelo sistema tradicional de saneamento. “Como a nova tubulação vai unir uma quadra, é necessário que o engenheiro vá até a comunidade e explique a importância do que está sendo feito. Mais que implantar um projeto, o profissional vai precisar falar com pessoas, conversar”, diz José Carlos Melo, destacando o fator humano da tecnologia. Uma vez implementado o sistema condominial, os moradores passam a ser corresponsáveis pela coleta de esgoto e um dos vizinhos é escolhido como uma espécie de “síndico”, que irá ajudar a monitorar o funcionamento da rede. “Para entender melhor a interdependência entre os moradores da quadra, é só pensar no conjunto de casas como um edifício na horizontal. A lógica é a mesma”, explica o engenheiro.

A técnica é reconhecida por especialistas de todo o mundo. O professor do departamento de engenharia da Universidade de Leeds (Reino Unido) Duncan Mara, por exemplo, já orientou duas pesquisas de PhD usando o sistema pernambucano como referência. “Esse sistema de esgoto traz um saneamento mais acessível para comunidades urbanas de alta densidade e baixa renda. Representa um avanço em relação ao que tinham antes”, afirmou Mara em entrevista ao JC. Os estudos se basearam em locais onde o sistema condominial foi implantado no Brasil, como os bairros de Rocas e Santos Reis, em Natal, Rio Grande do Norte. “O primeiro, realizado nos anos 1970, acompanhou a implantação do sistema nos dois bairros e o segundo analisou seu funcionamento 20 anos depois”, disse o pesquisador. 

No Brasil, além dos dois bairros de Natal, o sistema condominial atende de forma integral a cidade de Petrolina, no Sertão de Pernambuco, todo o Distrito Federal e a favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, por exemplo. “Com o sistema tradicional, você condena comunidades inteiras a nunca terem acesso ao saneamento. Se o Brasil quiser fazer uma revolução de verdade nessa área, vai ter que dividir responsabilidades”, analisa o engenheiro pernambucano, referindo-se à importância da parceria com a comunidade para o sucesso do sistema. Ele lembra ainda que uma rede coletora de esgoto é considerada essencial para o desenvolvimento econômico de qualquer região.

Apoio

Seu projeto foi escolhido pelo BID por meio de uma licitação aberta em abril deste ano que procurava soluções que ajudassem na implantação de saneamento básico. O contrato foi assinado pela Diaginal (empresa de José Carlos) e a Condominium no início de julho, com o prazo de conclusão de até 18 meses. Entre as exigências do banco estão o desenvolvimento de uma plataforma online para a gestão do sistema; oferta de palestras e cursos; e realização de missões para ajudar no desenvolvimento de projetos nos países participantes. Já no mês de julho a equipe foi à Argentina para iniciar o cronograma de palestras. Para setembro já estão agendadas visitas para a Nicarágua e o Paraguai. 

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