Visitas de executivos da CSN e da sua subsidiária TLSA ao gabinete do ministro da Infraestrutura Tarcísio Gomes de Freitas se tornaram frequentes. Basta dar uma olhada na agenda do ministro para ver quantas vezes Benjamin Steinbruch, Pedro Brito e Jorge Mello estiveram por lá. As idas e vindas a Brasília são para negociar a retomada das obras da ferrovia Transnordestina. O governo federal e a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) têm colocado pressão para voltar à construção, paralisada desde 2017. Em outubro, a ANTT poderá recomendar a caducidade do contrato e a devolução da ferrovia à União. Se isso acontecer, a TLSA terá que arcar com R$ 3,4 bilhões em garantias que a empresa colocou no empreendimento.
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Para o governo Bolsonaro, a entrega de pelo menos parte da obra seria uma vitória nos planos de sua gestão de garantir popularidade no Nordeste, região onde a aprovação do presidente é mais baixa e onde ele perdeu para o candidato petista em todos os Estados nas Eleições 2018. Informações extraoficiais dão conta que o governo estaria agendando uma visita presidencial ao empreendimento para outubro. A construção da Transnordestina começou em 2006, no governo Fernando Henrique Cardoso, e atravessou as gestões Lula, Dilma e Temer.
Com 1.753 quilômetros de extensão, a ferrovia vai ligar o interior do Piauí aos portos de Pecém (CE) e Suape (PE), movimentando inicialmente minério de ferro e grãos da região. A obra tinha orçamento inicial de R$ 4,5 bilhões, mas o valor foi aumentando para R$ 5,6 bilhões e depois para R$ 7,5 bilhões. De acordo com relatórios do Grupo de Trabalho criado pelo governo federal em 2017, que reuniu a TLSA, vários ministérios e a ANTT, até dezembro de 2016 a obra havia recebido R$ 6,38 bilhões e, pelos cálculos da concessionária, serão necessários mais R$ 6,7 bilhões para concluir a ferrovia.
Nessa retomada da construção do projeto, a CSN se comprometeu com o governo federal a investir R$ 257 milhões. Os recursos são simbólicos diante do que ainda falta para avançar. O valor seria suficiente para construir mais 177 quilômetros de infraestrutura até fevereiro de 2020, sendo ao menos 20 quilômetros com a colocação de superestrutura (dormentes e trilhos). O aporte será realizado com capital próprio, enquanto a empresa não consegue atrair novos investidores para a empreitada nem vencer a determinação do Tribunal de Contas da União (TCU) que desde 2017 suspendeu a liberação de recursos públicos para o projeto até que a TLSA apresente à agência reguladora um cronograma e um orçamento factíveis.
Procurada pelo JC, a ANTT informou que “a equipe da área de ferrovia está empenhada para que não seja necessário prorrogar o prazo (recomendar a caducidade do contrato). A Agência também esclarece que em caso de caducidade os ativos voltam para a União. A partir daí, qualquer decisão, se o projeto será relicitado, cabe ao formulador de política pública, nesse caso, o Ministério da Infraestrutura.
No TCU, a suspensão à liberação de recursos permanece. Em resposta à reportagem o órgão esclarece: “a TLSA deve apresentar à ANTT todos os elementos de projeto, inclusive estudos geotécnicos, para que a Agência possa validar as alterações no projeto e no orçamento da obra. A partir de então, considerando os investimentos necessários para a finalização da infraestrutura física e para a aquisição do material rodante, os custos de operação e manutenção do sistema, em comparação com as receitas de transporte esperadas, a ANTT pode avaliar a viabilidade da ferrovia.” A partir dessa avaliação é que poderá voltar a receber dinheiro da União.
Questionado, o Ministério da Infraestrutura tem se limitado a reproduzir a mesma resposta à imprensa. “As negociações entre a concessionária e Governo Federal estão avançando e o Ministério está acompanhando de perto as evoluções recentes na execução do contrato de concessão. Quanto a um eventual acordo, ainda não há definição.”
INTEGRAÇÃO
Especialista em logística, o professor Paulo Alencar da UniFBV/Wyden alerta para a importância da Transnordestina na integração logística e no desenvolvimento econômico do Nordeste. Numa região dependente do modal rodoviário, a ferrovia seria uma alternativa para garantir o escoamento de cargas a preços mais competitivos. Além do ganho logístico, a operação da ferrovia também prevê uma geração ascendente de receita bruta e de geração de emprego.
“Não dá pra pensar em competitividade em uma região tão grande como o Nordeste sem uma linha férrea operando plenamente. A Transnordestina é vital para o desenvolvimento econômico e o escoamento de cargas a preços mais competitivos. A operação da ferrovia prevê locomotivas que levariam o equivalente a 110 vagões de uma vez só a 80 km por hora”, observa o professor de Logística e Administração da UniFBV/Wyden.
Na avaliação do especialista, a decisão pela caducidade não seria o caminho mais acertado. “Isso porque o bem voltaria para a União e seria necessário relicitar tudo novamente. Talvez o governo possa ajudar no desenvolvimento de um parceiro internacional que possa entrar com capital no negócio e reforçar o que a CSN está buscando. Se sabe que o valor para concluir a obra é alto, mas a rentabilidade de um projeto como esse é grande. Quando a ferrovia estiver operando todos vão querer usar o trem, que é veloz, mais barato e transporta grandes volumes de carga”, pondera.
O relatório do Grupo de Trabalho formado pelo governo Federal, ANTT e TLSA, aponta que a receita bruta da ferrovia seria de R$ 484 milhões em 2020, subiria para R$ 2,3 bilhões em 2030 e já chegaria perto da casa dos R$ 3 bilhões em 2040. O estudo de demanda aponta para a capacidade de construir 12 terminais multimodais, responsáveis pela entrada e saída de cargas da ferrovia.