O brasileiro já pagou R$ 2,2 trilhões em impostos em 2019. A arrecadação desse montante, muitas vezes, passa “despercebida” pelo consumidor, que só sente a renda encolher, sem identificar onde é o ralo. Ao mesmo tempo, empresas – independentemente do porte – enfrentam uma guerra contra as tributações. Algumas delas acabam perdendo a luta e fecham as portas. Nesse cenário, o governo federal prepara uma proposta de reforma tributária que, segundo promessa do Ministério da Economia, deve ser entregue ao Congresso em até duas semanas. O debate, no entanto, está posto, já que existem propostas sendo analisadas no Senado e na Câmara dos Deputados. Com isso, o debate nunca esteve tão aquecido.
O fato é que não há como fugir da arrecadação de impostos. Especialistas questionam, contudo, o baixo retorno desse valor em obras e serviços em prol da população. Outro ponto é o quão justa a arrecadação tributária é no Brasil. Segundo o professor de Economia e Finanças da UFRPE Luiz Maia, o modelo brasuca é, no mundo, um dos mais injustos para as pessoas de menor renda.
“Cerca de 34% do PIB vem dos tributos. Essa taxa se assemelha a de países de primeiro mundo, mas lá fora a taxação é maior sobre a renda e os bens, e não existe sobre o consumo, como é no Brasil”, avalia. “Quando você taxa um produto na compra final, uma pessoa que recebe um salário mínimo paga por um produto o mesmo valor que outra com renda dez vezes maior. É obvio que o mais pobre vai sentir o peso dos impostos no orçamento.”
A autônoma Marciane Maria da Silva, 36 anos, tomou um susto quando analisou o cupom fiscal do mercadinho onde faz compras no Recife. Em uma nota de R$ 269,22, ela pagou R$ 93,86 somente em impostos federal, estadual e municipal. “Eu nunca tinha feito a conta. Quando a gente soma assim, vê o quanto pagou de imposto e se revolta. Quase metade é imposto, e a gente não vê retorno disso do governo.”
Para lançar luz sobre esse debate, a Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco (Fiepe) realiza hoje a quarta edição do Dia Sem Imposto. O chamariz é um carro popular que foi içado em frente à sede da entidade, na área Central do Recife, e que traz o preço do veículo nas concessionárias (R$ 42.981,51) e por quanto seria vendido sem os impostos (R$ 36.770,26).
Veja os valores de alguns produtos no "Mercadinho sem imposto da Fiepe"
Produto | Valor com imposto | Valor sem imposto | Imposto (R$) | Impostos (%) |
Cereal de arroz | R$ 1,89 | R$ 1,55 | R$ 0,34 | 18% |
Arroz parborizado Turqueza | R$ 2,80 | R$ 2,29 | R$ 0,51 | 18% |
Feijão carioca Turqueza | R$ 4,60 | R$ 3,77 | R$ 0,83 | 18% |
Chocolate | R$ 18,49 | R$ 14,21 | R$ 4,28 | 23% |
Tintura Maxton | R$ 7,41 | R$ 5,56 | R$ 1,85 | 25% |
Cerveja Lager 500ml | R$ 15,44 | R$ 10,65 | R$ 4,79 | 31% |
Alcool Brilux | R$ 18,15 | R$ 13,43 | R$ 4,72 | 26% |
Desinfetante Brilux | R$ 9,54 | R$ 7,35 | R$ 2,19 | 23% |
Tinta acrílica Novolar | R$ 44,20 | R$ 33,30 | R$ 10,90 | 25% |
Fonte: Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) |
O diretor financeiro da Fiepe, Bruno Veloso, ressalta que o foco da ação é educar o consumidor para que ele fique mais atento e sinta a necessidade de cobrar dos governantes o retorno de tamanho investimento. “A carga tributária é necessária em todos os países para que o governo possa pagar todas as despesas em todas as áreas, como saúde, educação, segurança e infraestrutura. Mas você só consegue ver o quanto desembolsa quando descobre quanto pagaria por um produto se tivesse imposto zero. É uma ação de conscientização”, ressalta Veloso.
No evento da Fiepe, ainda haverá um mercadinho em que os presentes poderão conferir como seria comprar produtos como feijão, arroz, bebidas, cosméticos e até eletrônicos sem impostos.
Na opinião do advogado tributarista João Amadeus dos Santos, da Martorelli Advogados, uma reforma tributária ampla, com redução da carga, deverá fazer as desigualdades serem reduzidas. No entanto, as propostas que mais ganham fôlego nos debates do governo federal se resumem à simplificação dos impostos. “Esse debate demanda cautela e um tempo de transição. Empresas fizeram investimentos e têm modelos de negócios pautados numa legislação. Qualquer proposta não pode ser muito brusca, caso contrário poderia representar um trauma em alguns nichos de mercado. Mas, mesmo a simplificação dos tributos, já é bem visto no mercado, pois tornaria o processo mais claro e menos burocrático”, pondera João Amadeus.