O Complexo do Alemão, conjunto de favelas na Penha, zona norte do Rio, completou o segundo dia seguido de violência.
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Depois de ao menos três pessoas terem sido mortas durante confronto entre polícia e traficantes na tarde de quarta-feira (1º), um posto avançado da UPP (um contêiner) na comunidade foi atacado no fim da manhã desta quinta (2). Moradores insatisfeitos com os constantes confrontos que de forma recorrente vitimam civis arremessaram pedras nas portas e janelas da unidade.
O Complexo do Alemão tem 15 favelas e quatro bases de Polícia Pacificadora, montadas em estruturas pré-moldadas. Cada base tem postos de apoio avançados dentro de contêineres. A despeito de a UPP ter sido instalada no complexo em 2012, traficantes continuam dentro da comunidade e os tiroteios são frequentes.
A reportagem entrou em contato com um morador da localidade chamada Alvorada, vizinha da Nova Brasília, onde ocorreram os confrontos desta quarta. Ele, que pediu para não ter o nome publicado, afirmou que o sentimento é de revolta, depois da morte da moradora Elizabeth de Moura Francisco, 40, atingida com tiro no rosto e no tórax.
Ele disse que o tiroteio de quarta começou por volta das 15h30. Policiais militares perseguiam um traficante que teria subido, por meio de uma escada externa, sobre a laje de Elizabeth. Segundo esse morador, o policial teria disparado tiros de fuzil em direção ao interior da casa sem se certificar se havia civis dentro, atingindo Elizabeth e sua filha de 14 anos.
Moradores ainda colocaram a mulher ferida em um carro para levá-la ao hospital, mas ela não sobreviveu. A filha foi atingida de raspão e socorrida ao hospital.
CONFRONTO
O confronto continuou e a PM atingiu um homem, identificado como traficante, que morreu no local. Segundo o CPP (Comando de Polícia Pacificadora), com ele foi encontrada uma pistola, um carregador, munições, um rádio transmissor e um binóculo.
O homem foi atingido na cabeça e seu corpo ficou estirado na rua. O morador que falou com a reportagem confirmou que o homem morto era traficante, mas disse que independentemente de quem morreu, a população está cansada dos confrontos. Uma terceira pessoa, ainda não identificada, também teria sido morta.
Uma segunda pessoa da comunidade postou em sua página no Facebook cinco vídeos que mostram que a população chega a tentar socorrer o homem, mas PMs não permitem. Um policial, que as pessoas se referem como tendo patente de major, após uma discussão, soltou uma bomba de efeito moral e seus subordinados lançaram spray de pimenta sobre as pessoas que cercavam o corpo.
O homem que faz o vídeo tenta dissuadir o major a soltar a bomba nas pessoas que acompanhavam, pedindo "calma" e lembrando que os policiais são "profissionais", sem sucesso.
O morador que falou com a reportagem, e que mora no Complexo há 22 anos, afirmou que antes de a UPP chegar, os moradores tinham mais noção de quando iriam ocorrer os tiroteios, já que quando a polícia invadia o morro, fogos eram soltados pelos traficantes, o que - apesar de ser longe de uma condição ideal - dava tempo para que os civis se abrigassem em suas casas. Atualmente, com a polícia o tempo todo na favela, os tiroteios podem ocorrer a qualquer momento.
"Ninguém aqui é a favor de traficante. A maioria é de trabalhadores que todo o dia correm risco de ter sua vida ou a de seus filhos tirada por essa guerra que não acaba e não parece que vai acabar tão cedo", disse.
OUTRO LADO
A polícia não informa se o tiro que atingiu Elizabeth partiu ou não de uma arma policial. Diz apenas que homens da UPP Alemão faziam patrulhamento pela Rua 2 "quando encontraram um grupo de bandidos armados que atirou contra os agentes. Houve revide e um homem foi atingido e morreu no local".
"Após buscas por hospitais da região, os PMs foram informados que três pessoas baleadas haviam dado entrada no Hospital Estadual Getúlio Vargas, na Penha. Um policial foi ferido por estilhaços e medicado. As armas dos policiais foram apreendidas para confronto balístico. A ocorrência foi registrada na 45ª DP (Alemão)", diz a Comando de Polícia Pacificadora, em nota.
Após os confrontos de quarta, a PM disse que reforçou o policiamento na região com policiais de cinco batalhões.