IMPUNIDADE

Na Ilha de Páscoa, estupradores têm penas mais leves do que no resto do Chile

Em alguns casos, a lei permite a libertação imediata do acusado

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Publicado em 03/08/2016 às 10:03
Foto: Bruno Itan/ Fotos Públicas
Em alguns casos, a lei permite a libertação imediata do acusado - FOTO: Foto: Bruno Itan/ Fotos Públicas
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Vítimas convivendo com seus carrascos. Na paradisíaca Ilha de Páscoa, um território chileno no meio do Oceano Pacífico, as mulheres vítimas da violência familiar tentam derrubar uma lei local que diminui as penas para condenados por estupro ou abuso sexual.

"Como vamos poder sanar as feridas das vítimas tendo os algozes por perto?", pergunta, em uma conversa com a AFP Elizabeth Arévalo Pacarati, uma das promotoras da medida que tenta revogar uma lei de cinco décadas.

Essa lei, promulgada em 1966, quando o Estado chileno anexou oficialmente a Ilha de Páscoa - localizada a 3.500 km do continente -, estabelece várias exceções para os nascidos na ilha, incluindo tributárias, por posse de terras e na administração da justiça.

Mas são dois os artigos da chamada "Lei Páscoa" que mantêm em pé de guerra as organizações feministas: os parágrafos 13 e 14, que diminuem penas e concedem benefícios carcerários a condenados por estupro e abuso sexual. Em alguns casos, permite a libertação imediata do acusado.

Uma lei criada em uma época em que a ilha apresentava necessidades e exigências diferentes do resto da população chilena, e portanto também precisava ser diferente.

"É uma realidade sair e encontrar o abusador; é inevitável em um povoado com duas padarias, e é isso que precisa mudar o quanto antes", disse Arévalo Pacarati.

"A pressão psicológica sobre as pessoas que foram vítimas (faz com que) não possamos curá-las 100%, é muito difícil", acrescenta a partir de Rapa Nui, capital da Ilha de Páscoa.

Nova Realidade

Pensada inicialmente para levar em conta as particularidades da cultura polinésia dos nativos da ilha, cinco décadas depois e com uma população que duplicou nos últimos 25 anos, chegando a mais de 5.000 habitantes, a norma hoje é considerada atentatória contra os direitos humanos de centenas de mulheres vítimas da Ilha de Páscoa, cujos indicadores quase triplicam em relação ao resto do país.

"A população cresceu, a mentalidade mudou e hoje estamos em um mundo globalizado. A ilha é um território chileno e as intenções e gravidade dos delitos têm as mesmas consequências aqui e lá. Não queremos que sejam punidos de forma diferente", afirma a ativista que impulsiona a revogação da norma.

Atualmente, um condenado por estupro em qualquer parte do Chile recebe uma pena mínima de cinco anos, enquanto na Ilha de Páscoa a pena é de três anos e um dia, e a lei permite cumprir a sentença com medidas alternativas, como a liberdade vigiada ou a reclusão noturna.

O Serviço Nacional da Mulher, estatal, apoia a iniciativa e já trabalha para "sensibilizar a sociedade sobre a importância de revogar estes artigos", comentou à AFP Tiare Paoa, integrante do organismo na Ilha de Páscoa.

O pedido do grupo de mulheres Rapa Nui, apoiado pelas autoridades da ilha, chegou aos parlamentares e ao presidente do Senado, Ricardo Lagos Weber, que apresentou em julho um projeto para revogar estes artigos.

"Pretendemos restabelecer a condição de igualdade entre cidadãos e, em especial, entre homens e mulheres", disse o legislador, representante de Rapa Nui, ao apresentar o projeto, descartando que a revogação busque "alterar os usos e costumes" dos habitantes da ilha.

O objetivo, explicou, é defender a igualdade ante a lei de todos os chilenos e "promover a proteção à dignidade da mulher".

Depois de passar pelo Congresso chileno, a revogação dos artigos deve ser validada na Ilha mediante uma consulta indígena.

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