Osama bin Laden morreu, mas a guerra ao terror não. A eliminação do terrorista mais procurado do planeta em uma mansão na cidade paquistanesa de Abbottabad, a 56 km de Islamabad, não põe fim à cruzada encampada pelos Estados Unidos após os atentados de 11 de setembro de 2001 em Nova Iorque e Washington, que feriram pela primeira vez os americanos em seu coração e deixaram mais de 3 mil mortos. A Al-Qaeda passa a ser dirigida pelo egípcio Ayman al-Zawahiri e promete posturas ainda mais radicais. Movimentos extremistas como o Talibã afegão e o Jihad Islâmico no Egito engrossaram o coro antiamericanista. O homem que para o Ocidente tornou-se, em vida, símbolo maior do terrorismo virou, em morte, um mártir para os jihadistas. A ocupação dos EUA no Afeganistão continua e os dias futuros são de temor e incerteza.
A morte de Bin Laden tem mais efeito simbólico do que prático. O medo de uma retaliação é prova de que o terrorismo continua, assim como seu combate pelas forças ocidentais. Os EUA reforçaram a segurança nos aeroportos e estações de trem. No exterior, representações diplomáticas foram colocadas em alerta máximo. O receio se estende a países aliados. O Brasil pôs sua embaixada em Islamabad em estado de atenção. “A Al-Qaeda atravessava um momento difícil, assim como o radicalismo. Talvez a morte dele faça com que as coisas voltem com mais força. O próprio fato de jogar o corpo no mar já soou como desrespeito. Pessoas que nem eram pró-Al-Qaeda podem se voltar contra os EUA. Gritos voltaram a ser ouvidos. O tiro pode sair pela culatra”, avalia Argemiro Procópio, professor de relações internacionais da Universidade de Brasília (UnB).
Embora saliente que a guerra ao terror está longe do fim, o cientista político Leonardo Valente, professor de relações internacionais e geopolítica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), pondera que a Al-Qaeda é uma organização enfraquecida e descentralizada. “Não é exatamente um grupo coeso e unificado. Se a gente pudesse exemplificar do ponto de vista capitalista, ela é composta por franquias, células independentes que atuam em algumas partes do mundo, mas sem poder central”, observa.
Huthayfa Azzam, filho de Abdalah Azzam, um dos mentores de Bin Laden, afirmou que o terrorista já não controlava a Al-Qaeda. “Bin Laden era uma figura emblemática de uma rede sem liderança. A Al-Qaeda perde um líder de peso, mas do ponto de vista operacional pouca coisa muda, porque a rede já não tinha um poder centralizador capaz de deflagrar grandes ataques”, considera Valente. “Por outro lado, um líder morto não pode ser combatido. Bin Laden pode virar um mártir e isso é um fator de complicação”, acrescenta.
A Al-Qaeda atravessava um momento difícil, assim como o radicalismo. Talvez a morte dele faça com que as coisas voltem com mais força. O próprio fato de jogar o corpo no mar já soou como desrespeito. Pessoas que nem eram pró-Al-Qaeda podem se voltar contr
, afirma Argemiro Procópio, professor de relações internacionais da Universidade de Brasília (UnB).
O envolvimento do governo paquistanês com Bin Laden não foi descartado e está sendo investigado. O terrorista vivia há cerca de cinco anos em um casarão a menos de 1 km de uma academia militar e perto de vários regimentos do Exército. A operação secreta que matou Bin Laden não foi informada ao Paquistão, uma vez que os EUA temiam que o alvo fosse avisado.
O historiador americano Marc Hoffnagel, professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), minimiza a morte do terrorista e não acredita em grandes mudanças no cenário atual. “É muito exagerada a influência atribuída a Bin Laden. Ele tinha muito talento em termos de coordenar a Al-Qaeda, mas criaram um mito. Se alguém é dedicado a uma causa como a jihad, vai continuar sua missão.”
Hoffnagel diz que o ponto final no terrorismo passa, obrigatoriamente, por uma resolução do conflito entre israelenses e palestinos. Os movimentos islamitas frisaram que não descansarão enquanto os EUA não mudarem sua política de apoio irrestrito a Israel e enquanto não for estabelecido um Estado palestino independente. “A questão palestina é central. Com ou sem Bin Laden, não faz diferença”, afirma. Israel e Autoridade Palestina (AP) comemoraram a morte de Osama bin Laden. O Hamas, grupo radical palestino que governa a Faixa de Gaza, foi na contramão e condenou o assassinato do homem a quem se referiu como “guerreiro árabe sagrado”.
A justificativa dos Estados Unidos para ocupar o Afeganistão, após o 11 de Setembro, foi a caça a Bin Laden, por acreditar que o terrorista pudesse estar no país ou região. Findada a perseguição, os EUA vão retirar suas tropas e encerrar a invasão, certo? Errado. O secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), Anders Fogh Rasmussen, já adiantou que a missão antiterrorista no Afeganistão vai continuar.
O objetivo, agora, é evitar que o país volte a ser refúgio de radicais islâmicos. O principal inimigo lá, contudo, é o Talibã. Há, hoje, em torno de 150 mil militares da Otan, dos quais 100 mil americanos. Mais longa batalha da história dos EUA, custou em uma década quase US$ 400 bilhões e deixou mais de 1.500 militares americanos mortos.
Analistas dizem que a continuidade da ocupação prova que a procura por Bin Laden era apenas pretexto para a presença americanal. Hoffnagel acredita que o assassinato do terrorista aumentará a pressão mundial para a retirada das tropas dos EUA, anunciada para começar em junho. A promessa, feita pelo presidente Barack Obama antes da morte de seu inimigo número 1, é que o controle da segurança será entregue definitivamente às forças afegãs em 2014. “A morte de Bin Laden dá a Obama um aval e uma maior cobrança para a transição no Afeganistão com a retirada das tropas ocidentais. Se a razão propalada pelos EUA para a ocupação era achar Bin Laden, não há motivo para continuar”, ressalta.