O presidente da Bolívia, Evo Morales, conquistou no domingo (12), de acordo com resultados extraoficiais, o terceiro mandato consecutivo – um feito em país marcado por história de instabilidade política e econômica. A vitória era esperada: em nove anos de governo, Morales erradicou o analfabetismo, reduziu a pobreza e a desigualdade e garantiu alto índice de crescimento econômico, mantendo a inflação e os gastos públicos sob controle. O líder sindical dos cocaleros (cultivadores da coca), que chegou ao poder com um discurso anti-imperialista, é hoje elogiado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial – organizações que ele criticou.
Leia Também
“O FMI elogia nossa estabilidade econômica, mas essa não é um patrimônio do FMI, nem dos economistas neoliberais”, diz o ministro da Economia da Bolívia, Luiz Arce, em entrevista à Agência Brasil. “Chegamos aos resultados que eles pedem, mas sem usar as fórmulas deles. Usamos nosso modelo, que tem ingerência do Estado e investe dinheiro na área social”.
Segundo Arce, o desafio dos primeiros dois mandatos de Evo Morales foi recuperar as riquezas naturais da Bolívia (minérios e gás natural), que ele nacionalizou para poder investir em educação, saúde e planos sociais. “O petróleo rende US$ 6 bilhões ao ano, que equivalem a cerca de um quinto do nosso Produto Interno Bruto, de US$ 31 bilhões. Agora, 85% desse dinheiro ficam no país e apenas 15% com as transnacionais”, explica Arce.
Os altos preços das commodities favoreceram Evo Morales - primeiro presidente aymara, em um país onde a maioria de indígenas jamais chegou ao poder. Mas, desde 2011, elas vem caindo, afetando a economia dos países vizinhos. Ainda assim, este ano – segundo relatório da Comissão Econômica para América Latina e o Caribe – a Bolívia é o país que mais vai crescer na América do Sul: 5,5% (o dobro da média regional). De acordo com Arce, esse crescimento deve-se ao aumento do consumo interno, que compensou a desaceleração da economia de países desenvolvidos, compradores de produtos bolivianos.
“Construímos estradas, que ajudaram a aumentar a produção, porque integraram partes da Bolívia que estavam isoladas”, explicou. O consumo, no segundo país mais pobre da América do Sul (depois do Paraguai), é por produtos básicos: gás (que até recentemente era exportado, mas não chegava às casas de muitos bolivianos), supermercados e serviços. Duas obras que marcam a “modernização” da Bolívia são o Tupac Katari (primeiro satélite de telecomunicações do país, lançado em 2013) e o bondinho (ligando a capital, La Paz, à vizinha cidade de El Alto). O teleférico é o mais alto e o maior em extensão urbana no mundo.
Mas o desafio, nos próximos cinco anos, será manter o crescimento de uma economia que depende dos mercados dos países vizinhos (principalmente do Brasil) e reduzir a pobreza, que ainda afeta um quarto da população. Segundo Arce, o próximo passo é explorar novas riquezas, como o lítio (usada para fabricar desde remédios para depressão até baterias e pilhas). A Bolívia tem a maior reserva mundial de lítio, mas não está exportando a matéria-prima porque quer industrializá-la. “A ideia é fabricar pilhas aqui e outros produtos, como fertilizantes, feitos de fosfato, ou plásticos”, destacou Arce.
A dúvida é se a Bolívia terá recursos financeiros e humanos suficientes para dar esses passos ou se vai precisar de dinheiro e tecnologia de países que investiram na região e foram surpreendidos pela nacionalização de seus investimentos – entre eles, o Brasil.