Em meio à destruição causada pelo terremoto de 2010, o haiti espelha-se na vizinha República Dominicana e tenta fortalecer, com o turismo, a frágil economia. Os esforços começam a dar os primeiros sinais de sucesso. Uma pesquisa divulgada no fim do ano passado pela Organização Mundial do Turismo (OMT) mostra que o setor cresceu 32% de 2012 para 2013. O turismo internacional chega a representar, segundo o estudo, 20% do PIB de países-ilha, como o Haiti.
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Para o professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) Virgílio Arraes, a movimentação do setor pode realmente ser uma saída para a crise econômica grave enfrentada pelo Haiti. “A base seria a cooperação internacional. É preciso recuperar um pouco da infraestrutura, tentar incentivar o turismo. Projetos agrícolas poderiam ocupar também parte da população.”
A cidade de Les Cayes, a 190 quilômetros ao sul da capital Porto Príncipe, tenta atrair turistas para suas praias e ilhotas próximas. No litoral do munício haitiano pela segunda vez, o casal de canadenses Jacque Britole e Sylvie Britole vão passar férias de 15 dias no local. O pai de Sylvie gostou tanto do Haiti que resolveu comprar uma casa. “Ele viajava muito, em vários países. E já faz 30 anos que ele vem sempre [aqui], por causa de negócios. E decidiu ficar de vez. E comprar uma casa aqui.”, conta Jacque. O canadense diz gostar muito do Haiti, mas reclama do lixo espalhado pelas praias. “A população é muito gentil. É possível ver que a paisagem é muito bonita. Mas ainda digo que é uma pena tanta sujeira.”
Sylvie concorda com o marido, e diz que o que mais a atrai no país são as belas paisagens e a população local. “As praias e a temperatura são ótimas. As pessoas são gentis, hospitaleiras e se come muito bem, a lagosta é muito boa. Aqui nesta praia tem bastante sujeira, mas em outras, aqui bem perto, há lugares paradisíacos. Por isso, também quero ficar no Haiti”, diz sorrindo. “Vale a pena conhecer o Haiti. Não dá para negar que há muitos contrastes. Mas há muitos lugares lindos, paradisíacos.”
O técnico em logística Mardoche Florestal escolheu a praia para passar o réveillon com a família. Todos os anos, o haitiano troca Porto Príncipe pelo sossego de Les Cayes. “Todo fim de ano eu costumo vir. Passo aqui o Natal e o Ano-Novo. Em 2015, espero vir mais vezes durante o ano.”
Ele conta que sabe que o turismo interno não é comum. “A situação do país está complicada, muita gente não tem dinheiro, não tem emprego. Mas se tivesse emprego, todos gostariam de vir passear, passar um tempo na praia. É preciso economizar durante todo o ano para poder ter condições de ficar em um hotel [ aqui]. Então sei que está difícil pra muita gente.”
Para ele, o turismo pode sim ser uma saída para o país. Mas é preciso ter investimento. “Fortalecer as opções culturais e também a rede hoteleira. Redes de hotéis que ofereçam pacotes all inclusive [tudo incluído], com preços atrativos, para o turista comer e beber sem sair do hotel, modelo que já funciona em todo o mundo, inclusive na República Dominicana, pode ser uma ideia.”
Por causa da falta de estrutura, o caseiro Jean Michel, que cuida de uma propriedade em frente à praia, reclama que pouca gente ainda visita o país. “Não tem muito turista que vem aqui mais. O turista pensa no Haiti apenas como um lugar que enfrenta muita dificuldade, e por isso não tem interesse em visitar.”
Mas as estatísticas do hotel do arquiteto haitiano Louiser Pierre Guy contrariam o desânimo do caseiro Jean Michel. O local foi inaugurado logo depois do terremoto e está sendo ampliado. Os quartos custam entre US$ 60 e US$ 100. “Quem frequenta meu hotel são principalmente os turistas estrangeiros e alguns turistas locais”, conta. Por mês, ele afirma receber entre 100 e 120 hóspedes, tendo uma média de lucro de mais de US$ 6 mil.
Apesar de considerar o negócio rentável, Louisier pondera. “Falta muita coisa para que o turismo seja impulsionado. Falta um hospital aqui na cidade para quem vier visitar. E a cidade ainda está desorganizada, precisa melhorar para atrair mais gente.”
Perto do hotel de Louisier, está o hotel do marido de Lundi Marie Claudi. Com três anos de existência, o local é pequeno, mas já emprega quatro pessoas e vive cheio. Lundi conta que os hóspedes são variados: estrangeiros e turistas locais. “[aqui] é um lado diferente do Haiti. Quando o turista chegar a Les Cayes ele vai ficar encantado com o lugar e com a energia do povo haitiano.”