Apesar de ser o maior consumidor per capita (por pessoa) de água do mundo, com consumo médio de 215 metros cúbicos por ano para cada habitante, os Estados Unidos conseguiram estabilizar e frear o aumento no consumo de água na última década.
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Segundo a Agência Científica de Ciências Naturais (USGS, sigla em inglês), graças a campanhas educativas sobre o uso racional da água, incentivos para arquitetura “inteligente” em novas construções e a adoção de tarifas mais altas pelo serviço de fornecimento, o país conseguiu brecar o crescimento do consumo.
“Até os anos 1980 o consumo aumentava velozmente ano após ano. Mas conseguimos reverter essa tendência, apesar do aumento populacional registrado no período”, disse à Agência Brasil, Brian McCallumm, supervisor de Hidrologia da USGS em Atlanta, Georgia.
Ele explicou que, apesar de não ter conseguido reduzir o consumo em todas as regiões, manter o consumo estável já é um fator positivo. O volume gasto por pessoa (215 metros cúbicos) equivale a um gasto diário de 80 a 100 galões de água por dia por habitante.
Atualmente, os estados e as grandes cidades norte-americanas têm investido em regulação, políticas de restrição de uso e um trabalho de conscientização para uso da água.
A crise hídrica na Costa Leste dos Estados Unidos – que atingiu principalmente São Francisco – foi um fator que contribuiu para que o país começasse a se preocupar coletivamente.
A cidade enfrentou uma grave estiagem entre as décadas de 1980 e 1990 e por isso passou por racionamentos e mudou seu modelo de gestão de água. Atualmente, segundo o USGS, apesar das estiagens recentes, como a do ano passado, a cidade mantém cerca de 50% da capacidade de seu reservatório.
“Em São Francisco, o lema é poupar água, e isso pode ser feito de muitas maneiras”, explicou Brian.
A população de São Francisco, cidade mais afetada pela seca, foi incentivada a trocar equipamentos domésticos e eletrodomésticos, como máquinas de lavar e chuveiros, por modelos mais eficientes com descontos para a aquisição de novos aparelhos e substituição de vasos sanitários.
A água das chuvas também é coletada nas casas para irrigação. Edifícios “inteligentes” são projetados para gastar menos e reaproveitar o recurso, com captação da água das chuvas, por exemplo.
O governo investiu massivamente em campanhas publicitárias sobre o uso consciente, com vídeos e reportagens publicados na internet e disponibilizou um portal institucional só para tratar de água.
A mudança também surtiu efeito no pensamento das pessoas e na cultura sobre o uso da água. O desafio do “Balde de gelo”, por exemplo, que viralizou na internet no ano passado, foi modificado em São Francisco para evitar o uso da água.
O “Ice Bucket Challenge”, desafio difundido nas redes sociais em meados do ano passado, foi copiado globalmente para dar visibilidade a uma doença chamada esclerose lateral amiotrófica.
Mas tão logo a campanha se espalhou pela internet, a prefeitura de São Francisco lançou um alerta desestimulando a prática. Ao mesmo tempo, moradores da cidade resolveram aderir à campanha de outra maneira e postaram vídeos nas redes sociais explicando que o balde de gelo deles era diferente para poupar água.
“Eu resolvi aderir ao balde de gelo à maneira de São Francisco, por minha conta. Então eu vou pular na água. Este é meu balde de gelo”, diz um dos participantes de centenas de vídeos postados na cidade. Quem aderiu trocou o balde por um salto no mar ou em piscinas.
Para Brian McCallum da USGS, o estado da Califórnia é um exemplo de sucesso na luta contornar a crise de falta de água.
O hidrólogo, que esteve em São Paulo há duas semanas para uma reunião sobre estiagem, disse que vê semelhanças entre o Brasil e os Estados Unidos com relação ao consumo de água.
“Brasil e Estados Unidos têm dimensões e população semelhantes. Ser grande e ter abundância de recursos alimenta uma ideia falsa de que os recursos são ilimitados”, destaca. “São Paulo está vivendo hoje o que São Francisco viveu anos atrás”, conclui.
No ranking mundial de consumo de água, em números absolutos, os Estados Unidos aparecem em terceiro lugar, depois da China e da Índia. Em quarto lugar, aparece o Brasil.
McCallum acredita que a conscientização tem um papel fundamental no médio e longo prazos. No curto prazo, entretanto, ele acredita que adoção de altos preços nas tarifas seja o jeito mais fácil de “ensinar” a população a poupar.
Com o alto preço da água, a orientação no comércio é economizar. Gerente de um restaurante brasileiro em Atlanta, Caio Pereira conta que o gasto mensal por uso da água chega a US$ 300.
“Nós sempre evitamos gastar água, deixamos as vasilhas de molho para usar menos água na hora de lavar, colocamos o mínimo água nas estufas de banho-maria do buffet da comida. A orientação é gastar pouca água”, diz.