A presidente Dilma Rousseff denunciou nesta sexta-feira ante a comunidade internacional reunida na ONU para a assinatura do acordo do clima o "grave momento" que vive o Brasil, assegurando que "o povo brasileiro saberá impedir qualquer retrocesso", em referência ao processo de impeachment que pesa contra ela.
Dilma, que não mencionou um "golpe de Estado" como vem fazendo nos últimos dias, agradeceu a todos os líderes que manifestaram solidariedade por sua situação.
"Não posso terminar as palavras sem mencionar o grave momento que vive o Brasil. É um grande país, com uma sociedade que soube vencer o autoritarismos e construir uma pujante democracia. Nosso povo é trabalhador e com grande apreço pela liberdade. Não tenho dúvidas de que saberá impedir quaisquer retrocessos", declarou a presidente no discurso que durou nove minutos e no qual dedicou apenas 30 segundos para tratar da situação política do Brasil.
No fim, ela se disse "grata" aos líderes que expressaram solidariedade a ela.
Com a ausência de Dilma, o governo do Brasil ficou sob o comando do vice-presidente Michel Temer, que deve substituí-la caso o Senado aprove em maio a abertura de um julgamento por impeachment, já aprovada na Câmara dos Deputados, por conta das chamadas "pedaladas fiscais".
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Segundo o Partido dos Trabalhadores (PT), Temer e o presidente da Câmara de Deputados, Eduardo Cunha, levam adiante uma tentativa de "golpe de Estado", acusação que a presidente não mencionou na ONU.
Dilma não participou no mês passado da cúpula sobre segurança nuclear em Washington, mas decidiu estar presente na cerimônia de Nova York.
Entre aqueles que manifestaram apoio à Dilma, o presidente boliviano Evo Morales afirmou que "há pouco conversei com a presidentes @dilmabr e expressei todo o meu apoio e solidariedade na defesa da democracia", escreveu em sua conta no Twitter.
Depois da cerimônia do acordo sobre o clima, Dilma Rousseff participou de um almoço com outros líderes e o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon. Sua agenda para o restante do dia não foi detalhada, assim como a data de retorno do Brasil.
Ao sair da ONU, Dilma elevou o tom em uma entrevista coletiva para jornalistas brasileiros, retomando o discurso de "golpe" e dizendo que "gostaria que o Mercosul e a Unasul observassem este processo".
"Eu alegarei a cláusula (democrática do Mercosul) inexoravelmente se caracterizar de fato, a partir de agora, uma ruptura do que eu considero um processo democrático. Agora, quando isso ocorrerá, depende de fatos que eu não controlo".
O Mercosul tem uma cláusula democrática que pode ser invocada quando um governo eleito é destituído em qualquer um dos países-membros, como aconteceu recentemente no Paraguai.
"Sou vítima de um processo totalmente infundado. Não se pode tapar o sol com a peneira", disse Dilma na entrevista, reafirmando que o que ocorre no Brasil "tem todas as características de um golpe".
A oposição criticou duramente a decisão da presidente de apresentar sua versão dos fatos em um fórum internacional. O senador Cassio Cunha Lima, do PSDB, chegou a chamar a atitude de "crime de lesa pátria".
Temer afirmou em uma entrevista ao Wall Street Journal que "cada passo do impeachment está em concordância com a Constituição". "Como isto é um golpe?", questionou.
O Brasil enfrenta uma recessão que entra pelo segundo ano e uma crise política que paralisa o país.
Se Dilma for declarada culpada após o julgamento político, deixará o poder em definitivo e perderá os direitos políticos por até cinco anos.
Cada vez mais isolada politicamente, a presidente "dá como certo" que o Senado aprovará o impeachment, segundo fontes próximas ao governo citadas pela Agência Brasil.
Marina Silva também criticou a viagem da presidente e afirmou que "dizer que nós estamos vivendo um golpe de Estado, em nome de arranjar apoio e legitimidade para permanecer no poder, é agravar a crise".
Marina propõe como saída para a crise a convocação de eleições antecipadas. Mas essa possibilidade só ocorreria se a justiça eleitoral determinar que a campanha de Dilma/Temer recebeu dinheiro proveniente da corrupção da Petrobras em 2014.
Neste contexto, Dilma nomeou os substitutos de dois ministros que na semana passada apresentaram sua carta de renuncia, acatando a ordem do PMDB de romper com a coalizão governista.