Desvinculação de receitas

Entre o engessamento das contas públicas e o investimento obrigatório

Mudanças em curso no governo interino de Temer dividem economistas e quem atua na saúde e educação

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Publicado em 05/06/2016 às 11:16
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Mudanças em curso no governo interino de Temer dividem economistas e quem atua na saúde e educação - FOTO: Guga Matos/ JC Imagem
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A mudança nas regras dos gastos pblicos gerou embate entre as áreas de saúde e educação com economistas que defendem a Desvinculação da Receita da União (DRU) por entenderem que o País precisa controlar mais as suas despesas, sair do vermelho e voltar a crescer. A discussão foi alimentada pelo presidente interino Michel Temer (PMDB), quando propôs um teto para as despesas do governo, que passariam a ser corrigidas pela inflação do ano anterior. Paralelo a essas intenções, tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado propostas de emenda à Constituição que recriam a DRU e estabelecem algo semelhante para Estados e municípios. 

Na madrugada da quinta-feira (2/6) a Câmara aprovou, em primeiro turno, o substitutivo do deputado Laudívio Carvalho (Solidariedade - MG) às Propostas de Emenda Constitucional 4, 87 e 112 ampliando a proporção da Desvinculação da Receita Líquida da União para 30% – anteriormente era 20% –, num prazo maior, retroativo a janeiro de 2016 e indo até 2023. Isso dá ao governo liberdade para usar de R$ 117 bilhões a R$ 120 bilhões este ano. Também criou as desvinculações nas receitas de Estados e municípios.

Segundo a proposta, nas contribuições sociais, o governo federal só não poderá descontar o arrecadado do salário-educação. Já Estados, o Distrito Federal e os municípios não poderão desvincular da receita de taxas, impostos, multas os recursos destinados à saúde e desenvolvimento da educação. O substitutivo, que pode implicar em menos recursos repassados pela União à saúde estadual e municipal, teve a aprovação da maior parte da bancada pernambucana. Só votaram contra os deputados Luciana Santos (PCdoB) e Wolney Queiroz (PDT). Havia orientação contra o substitutivo das seguintes legendas: PT, PSOL e da Rede. Tramita no Senado outra PEC, a 143, que também aguarda votação em segundo turno. Nessa, a desvinculação seria de 25%, mas foi feito um acordo para proteger o investimento em educação.

O ex-deputado Paulo Rubem Santiago (sem partido), que propôs sem sucesso o fim da DRU quando representava o Estado na Câmara Federal, considera a desvinculação um desvio da arrecadação para a conta única do Tesouro: “Vai servir às despesas com a dívida pública. Quem ganha? Bancos, fundos e grupos financeiros internacionais”. O deputado federal Tadeu Alencar (PSB-PE), que votou a favor do substitutivo, argumenta que 86% do orçamento fica engessado pelas vinculações, mas reconhece a necessidade de pensar uma solução para o financiamento da saúde.

Já os economistas defendem que a desvinculação é importante para que o País tenha flexibilidade maior no seu orçamento. “Precisamos de mais recursos em saúde e educação, mas o orçamento não comporta. Os ajustes são necessários para sobrar dinheiro. Não há espaço político para aumentar a carga tributária e o gasto público brasileiro está elevado”, defende o professor da Escola Nacional de Administração Pública, José Luiz Pagnussat. Ele argumenta que 90% do orçamento da União é formado por gastos obrigatórios e, por isso, defende a desvinculação de algumas receitas. Atualmente, o País está gastando mais do que arrecada. Com isso, investidores deixam param de investir resultando em queda da atividade econômica.

“O problema com o gasto público brasileiro são os desperdícios e a própria corrupção”, comenta. “A flexibilização do orçamento pode melhorar a gestão num período de queda da arrecadação”, acrescenta. A arrecadação de tributos está caindo devido à queda na atividade econômica. “Na saúde, há indicadores que mostram a má gestão”, aponta o especialista em finanças públicas, Pedro Jucá Maciel.

O CONTRIBUINTE USUÁRIO 

Quem paga a conta duas vezes – quitando  impostos  e na desassistência  dos serviços públicos – tem motivos de sobra para se preocupar com  decisões políticas que podem mudar  regras dos escassos investimentos em saúde e educação. “Já desconto mais de 50% da aposentadoria para gastar todo mês R$ 500 com medicamentos. Se faltar mais verba no SUS,  pagarei valor maior”, conta Antônio Carvalho, portador de doença de Chagas, cardiopata e morador de Sertânia, a 300 quilômetros do Recife.

Na capital também há problemas. A vendedora Maria Angélica Albuquerque, mãe de quatro filhos, não consegue vaga em creche pública para os dois menores, uma menina com menos de dois anos e um garoto com dois meses de vida. “Vou ter que pagar uma pessoa para ficar com as crianças quando acabar a licença-maternidade”.  

Os exemplos mostram que cumprindo ou  ultrapassando o mínimo constitucional em saúde e educação, os governos ainda não conseguem atender plenamente às necessidades da comunidade.

O Tribunal de Contas do Estado disponibiliza  dados sobre investimentos públicos e indicadores nas duas áreas básicas, nem sempre mostrando sintonia entre eles. “A vinculação deve ser  mantida como está. Reconheço que há mal uso em determinados casos, motivo da luta diária dos Tribunais de Contas e do Ministério Público, mas isso  não significa que devem ser retirados os investimentos”, avalia o procurador-geral do Ministério Público de Contas, ligado ao TCE, Cristiano Pimentel.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação e a 141/2012, da saúde, definem onde devem ser empregados os recursos. E a população deve fiscalizar.

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