Enquanto o governo interino de Michel Temer (PMDB), deputados federais e senadores tentam desvincular a receita dos impostos pagos pelos cidadãos para dar mais liberdade ao Executivo no uso dessa verba pública, gestores, trabalhadores e usuários da saúde e da educação temem cortes e cobram prioridade a essas áreas, com indicadores distantes do ideal. O Brasil precisa ampliar a educação infantil (de 0 a 5 anos), diminuir a evasão nas classes seguintes, ao mesmo tempo que necessita vencer a mortalidade infantil e materna, preservar avanços na atenção básica e ampliar a saúde especializada. Antes de futuros cortes, o SUS já amarga déficit de R$ 50 bilhões (quase 50% do seu orçamento), conforme ex-gestores do Ministério da Saúde. E nunca recebeu os 30% da seguridade social que lhe cabem desde a Constituição Federal de 1988.
“Somos contra a retirada de qualquer recurso da saúde. Os previstos em lei já são insuficientes. Reduzir a participação da União nessa conta só agrava a situação dos municípios. A desvinculação, em todos os níveis de governo, é prejudicial”, avalia Gessyanne Paulino, presidente do Conselho dos Secretários Municipais de Saúde de Pernambuco. Ela lembra que desde o início da década de 2000 houve expansão da rede SUS, com abertura de novos hospitais, das Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs) e de postos de saúde.
O secretário estadual de Saúde, José Iran Júnior, também considera perigoso ao SUS desvincular receita e mudar a base de cálculo dos repasses federais. “Pernambuco já investe 16,25% do seu orçamento em saúde. São R$ 2,8 bilhões este ano que, somados aos repasses do Ministério da Saúde, chegam a R$ 4,3 bilhões. Segundo cálculo do Conselho Nacional dos Secretários Estaduais de Saúde (Conass), o déficit, em cada estado, é da ordem de 40% a 50%”, explica. Por causa do valor insuficiente transferido pela União, Pernambuco banca sozinho sete das nove UPAs de especialidade em funcionamento.
O Conselho Nacional dos Secretários Municipais de Saúde (Conasems) e o Conselho Nacional de Saúde (CNS) – fórum que reúne gestores, usuários, trabalhadores e prestadores de serviço do SUS– defendem a manutenção dos percentuais definidos pela Constituição e ampliação da receita federal. O Conselho Nacional de Saúde defende, em vez da desvinculação, a redução da renúncia fiscal para alimentar as receitas públicas. Há também manifestos contrários à desvinculação assinado por diferentes entendidades, inclusive de tribunais de contas.
O aposentado Carlos Freitas, representante dos usuários do SUS no Conselho de Saúde de Pernambuco, lembra que faltam remédios nos serviços básicos e especializados, leitos foram fechados e que a fila de espera só aumenta. “Mais uma vez quem pagará a conta são os mais pobres, que dependem unicamente do sistema público”, avalia. Gil Brasileiro, presidente da Federação dos Hospitais Filantrópicos de Pernambuco, conta que existe um movimento local para evitar que a bancada de Pernambuco aprove medidas no Congresso que venham a reduzir os recursos da saúde. “Com a inflação em alta, não conseguimos pagar as contas”, explica. Islândia Carvalho, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) na área de economia da saúde, explica que se o orçamento do Brasil na saúde é muito baixo, a tendência é piorar com as propostas que mexem na obrigatoriedade de investimento. Sem vinculação é assinar o fim da saúde”.