Novos laudos elaborados pelos peritos da Polícia Federal na Lava Jato identificaram pela primeira vez a "tendência" de as doações eleitorais das empresas do Grupo UTC nos Estados coincidir com os candidatos e siglas que estão a mais tempo no poder nestes locais.
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Até então, a Lava Jato ainda não havia relacionado as doações eleitorais das empresas investigadas aos contratos que elas possuem nos Estados e os candidatos regionais.
Além de constatar que as maiores doações das empresas do Grupo foram para as siglas com as maiores bancadas no Congresso, o que vai de encontro à delação do dono da UTC Ricardo Pessoa, que afirmou que as doações eleitorais buscavam "abrir portas" no Legislativo, a Polícia Federal tentou confirmar também o trecho da delação do empreiteiro que liga o interesse da empresa em obras nos Estados e municípios às doações em épocas de campanha
Ao mapear todas as doações das empresas do Grupo de 2006 a 2014, os peritos identificaram que, dentre as maiores doações, logo abaixo dos repasses nacionais (cuja maior parcela vai para o PT, que esteve 13 anos à frente no governo federal) aparecem as doações para candidatos e diretórios estaduais de São Paulo (há mais de 20 anos comandado pelo PSDB) e Bahia (há mais de oito anos comandado pelo PT).
Ao todo, no período, foram R$ 22,3 milhões para políticos e partidos paulistas, dos quais a maior parcela foi destinada ao PSDB (R$ 5,6 milhões), seguido pelo PT (R$ 3,7 milhões), DEM (R$ 3,5 milhões) e PC do B (R$ 3 milhões).
Já na Bahia, as doações somaram R$ 14 milhões, sendo que mais da metade disso foi abocanhada pelo PT (R$ 7,5 milhões) ficando a segunda maior parcela com o DEM (R$ 1,8 milhão).
Nem o governo estadual da Bahia e nem os diretórios nacionais do PT e do PSDB quiseram comentar a relação. O diretório estadual do PT baiano não retornou os contatos da reportagem.
Em nota, o diretório estadual do PSDB de São Paulo informou que o laudo da PF não é "conclusivo" e que o Estado de São Paulo é o "maior da Federação" e por isso terá sempre um grande volume de obras e doações eleitorais "independentemente da relação entre as duas coisas".
A assessoria do governador Geraldo Alckmin informou que "nenhuma empresa privada assina contrato com o Governo de São Paulo sem que tenha precedido de processo de licitação pública (...). Em São Paulo, as licitações podem ser acompanhadas pela internet e passam pelo crivo não só de agentes públicos, mas de órgãos de controle externo como o TCE (Tribunal de Contas do Estado) e do próprio Ministério Público". Disse, ainda, que "na delação a que se refere a reportagem, não há qualquer menção de doações irregulares às campanhas de Geraldo Alckmin, que teve todas as contas declaradas e aprovadas pela Justiça Eleitoral".
A assessoria de Fernando Haddad afirmou que "manifestações de Interesse Privado são comuns na Prefeitura" e que a "UTC jamais apresentou qualquer proposta ou projeto à Prefeitura na gestão Haddad."
A Polícia Federal apontou as conclusões ao cruzar os dados das duas principais empresas do Grupo e que estão sob investigação na Lava Jato: a UTC Engenharia e a Constran. Enquanto a primeira atua principalmente na área de Óleo e Gás tendo seus principais contratos com a Petrobras, a segunda atua na área de engenharia civil, com contratos milionários com diferentes órgãos públicos federais, estaduais e até municipais para obras como estradas, ferrovias e até habitacionais.
Além de relacionar as doações por Estado, os peritos descobriram que as empresas do Grupo UTC utilizavam a conta contábil "Fornecedores Diversos" para cuidar das doações eleitorais. A prática não é ilegal, mas chamou a atenção dos peritos por indicar justamente que as doações estariam relacionadas ao fornecimento de "bens e/ou serviços futuros e/ou pretéritos por parte dos agentes políticos".
A relação contraria o que disse Pessoa em sua delação. Questionado sobre o porquê do aumento das doações das empresas do Grupo nos períodos eleitorais, o empreiteiro foi claro: "o declarante (Ricardo Pessoa) tomou conhecimento das prioridades de cada governo durante a campanha e depois das eleições realiza propostas de negócios de interesse do Estado ou do Município e também da UTC", afirmou.
Mato Grosso do Sul
Ao mesmo tempo em que identificaram a "tendência", os peritos da Lava Jato apontaram que, no caso do Mato Grosso do Sul, 57% de todas as doações das empresas do Grupo para candidatos e partidos daquele Estado foram para a campanha ao governo de Delcídio Amaral, então filiado ao PT.
O hoje ex-senador e delator da Lava Jato foi derrotado naquele ano para o tucano Reinaldo Azambuja, o primeiro do PSDB a assumir o governo estadual depois de 15 anos de alternância de PT e PMDB no Estado.