Desabafo

Em entrevista, presidente da OAB diz que Bolsonaro 'muitas vezes é brutal'

A declaração Felipe Santa Cruz foi dada após ser questionado sobre o episódio com Bolsonaro que afirmou saber da morte do seu pai, Fernando Santa Cruz

Da editoria de Política
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Publicado em 28/08/2019 às 16:13
Felipe Jordão/ JC Imagem
A declaração Felipe Santa Cruz foi dada após ser questionado sobre o episódio com Bolsonaro que afirmou saber da morte do seu pai, Fernando Santa Cruz - FOTO: Felipe Jordão/ JC Imagem
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Em entrevista ao Resenha Política nesta quarta-feira (28), o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, lembrou da ocasião polêmica com o presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), no último mês de julho e afirmou que irá demorar um tempo para 'digerir o episódio' que envolveu a morte do seu pai, o desaparecido político Fernando Santa Cruz. Segundo ele, muitas vezes Bolsonaro age de maneira 'brutal'. 

"O presidente é uma pessoa muitas vezes brutal, ao contrário do que ele diz do pensamento cristão, que ele professa, mas ele não exerce. A pouca solidariedade no trato dele com a vida e com o outro. Isso é normal dele", cravou. 

Ainda de acordo com o presidente da OAB, tudo começou graças ao caso de Adélio Bispo e que Bolsonaro não teria aceitado que o responsável por dar uma facada em Bolsonaro durante a campanha eleitoral "tivesse um advogado" para apoiar sua defesa. "É um episódio que vai demorar um tempo para digeri-lo, porque tem amplos aspectos. Primeiro, o presidente atacou o papel da OAB e não um tema qualquer, ele atacou porque ele não entende as prorrogativos dos advogados", acrescentou.

À frente da OAB-Rio, Felipe iniciou movimento em 2016 para pedir ao Supremo Tribunal Federal a cassação do mandato de deputado federal de Jair Bolsonaro por "apologia à tortura ". Ao votar pelo impeachment de Dilma Rousseff (PT), o então parlamentar fez uma homenagem a Carlos Brilhante Ustra, que comandou o Doi-Codi de São Paulo, centro de tortura durante a ditadura. "O presidente abriu a história, a luz dos torturadores", afirmou lembrando que todos merecem estar "atentos" e que a repercussão foi além da sua família, mas de políticos de fora de Pernambuco, como o governador de São Paulo, João Dória (PSDB). 

Avó do presidente da OAB e mãe desaparecido político Fernando Santa Cruz, Dona Elzita Santa Cruz, faleceu no dia 25 de junho deste ano. Ela ficou conhecida de lutar pela verdade após o sumiço do filho, onde chegou a percorrer prisões e unidades militares, enviar cartas aos ministros de Estado e presidentes da República, além de solicitar ajuda da Anistia Internacional e da Comissão Interamericana de Direitos Humanos em busca do filho.

Processo arquivado

Na última segunda-feira (26), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso arquivou uma petição do presidente da OAB para que o presidente Jair Bolsonaro (PSL) prestasse esclarecimentos sobre uma declaração dada em julho sobre seu pai, Fernando Santa Cruz.

Sobre isso, o presidente da Ordem explicou ao JC que o caso não seria uma ação e sim uma interpelação. "O presidente tem fórum privilegiado, por ser presidente da República. Ela (interpelação) foi assinada por 12 ex-presidentes da Ordem, mostrando a unidade do tema, que é a defesa da democracia e não a minha", contou. Felipe ainda disse que após a ser interpelado por Barroso, ele desconversou o que tinha dito sobre saber da morte de Fernando Santa Cruz. 

"As pessoas estão falando de arquivamento, mas não houve arquivamento nenhum. Ela cumpriu o seu objetivo. Ele (Bolsonaro) poderia não responder, mas respondeu", completou.  "Para mim esse passo atrás do presidente, demonstra muito o que foi esse episódio. Passou do ponto de vista pessoal, foi cruel, mas mostrou que foi uma estratégia de ataque as coisas que ele não concorda", lamentou.  

Relembre

Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira participava do movimento estudantil, seguindo uma orientação da Ação Popular Marxista-Leninista. Ele precisou sair do Recife, após ser preso em frente da Assembleia Legislativa, e foi morar no Rio. No Carnaval de 1974, Fernando foi preso e, possivelmente, torturado até a morte pelos agentes do DOI-Codi.

Inconformada com o desaparecimento do filho, Dona Elzita dedicou a sua vida à elucidação dos crimes cometidos pelo DOI-Codi durante a ditadura militar, representando a luta das famílias dos mais de 140 desaparecidos políticos. Em 1981, participou da fundação do PT, partido que é filiada até hoje, e do Movimento pela Anistia em Pernambuco. Ganhou notabilidade ao receber o Prêmio Nacional de Direitos Humanos, em 2010, concedido pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Nos últimos meses está calada. No balanço da sua cadeira, não lembra mais de tudo o que lhe aconteceu. Porém, o olhar sereno e acolhedor revela uma mãe que, apesar de todo o sofrimento, transborda amor.

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