Na madrugada do dia 14 de dezembro de 1968 foram servidos café, coca-cola e suco de caju no Palácio do Campo das Princesas. Apesar de passar a noite em claro, o governador biônico Nilo Coelho estava tranquilo e até brincou com os presentes, lembrando de causos humorísticos de quando participou do Golpe de 1964, que também aconteceu numa madrugada, em 31 de março daquele ano. Na sua companhia, estavam o estafe central do secretariado e o então deputado estadual Marco Maciel, que liderava na Assembleia Legislativa a Arena, partido de sustentação do regime militar. Mantiveram-se acordados até às 4h da manhã à espera de um comunicado oficial do ministro da Justiça, Luis Antônio da Gama e Silva, sobre o Ato Institucional de número 5. Há 45 anos, numa sexta-feira 13, a cúpula militar editava o quinto decreto, inaugurando assim o período mais duro e sangrento da ditadura.
Leia Também
O cenário descrito acima está na crônica “Uma madrugada no Palácio das Princesas”, assinada pelo colunista social Adilson Cardoso, no dia 15 de dezembro de 1964, do Jornal do Commercio. Sob a liderança do presidente militar, Costa e Silva, uma reunião se formou com 24 membros do alto escalão do regime militar no Palácio Laranjeiras, no Rio de Janeiro, na tarde do dia 13. Desse encontro saiu o decreto mais rígido da ditadura militar que possibilitava o fechamento do Congresso e acabava com o direito de habeas corpus, entre outras medidas autoritárias. O resultado, de imediato, foram 97 deputados cassados, sete senadores com direitos políticos suspensos, 500 filmes, 450 peças, 200 livros e mais de 500 letras de músicas censurados.
O professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e sociólogo, Francisco Brandão, destaca que o AI-5 foi uma resposta aos movimentos populares que começavam a ganhar novo fôlego naquele ano de 1968. “Assim que houve o golpe (64), aconteceu uma espécie de limpeza, atacando as lideranças. Só que, depois, movimentos de setores à esquerda começaram a se rearticular. O AI-5 veio então para acabar com isso. Foi a expressão mais cruel da ditadura militar, onde a linha dura da cúpula militar se sobrepôs aos mais brandos”, explica.
O ano de 1968 foi marcado por manifestações populares em todo o mundo. Em 26 de junho, cem mil pessoas foram às ruas do Rio de Janeiro, um desdobramento do assassinato do estudante Edson Luís Lima Souto, baleado aos 18 anos pela política em março do mesmo ano. A passeata é considerada o ponto alto da resistência à ditadura. Também crescia a força da mobilização sindical, que culminou com a grande greve dos metalúrgicos em Osasco (SP). Em 12 de outubro, mais de 400 estudantes foram detidos durante um congresso clandestino da UNE (União Nacional dos Estudantes) em Ibiúna, interior de São Paulo. “O AI-5 serviu para dar um teor mais definitivo à ditadura, que no discurso se sustentava no argumento de que era apenas um período necessário para acabar com a ameaça comunista. O decreto colocou muitos jovens na clandestinidade e acabou com os movimentos populares”, pontuou Brandão.