Tão logo veio à público, o relatório final da Comissão Nacional da Verdade dividiu opiniões e uniu, pela crítica, a direita conservadora e a esquerda. Um dos integrantes do colegiado, o jurista pernambucano José Paulo Cavalcanti, até brincou: “Se os dois lados nos criticaram, acho que atingimos um equilíbrio”. Brincadeiras a parte, ex-presos políticos consultados pelo JC, atuantes na luta pela memória e verdade dos tempos da ditadura militar, reconhecem o peso político que tem o documento. No entanto, fizeram questão de lembrar das limitações. Do tempo, do contexto histórico, da legislação e por se tratar de uma instituição governamental.
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Presente na solenidade de entrega do relatório às entidades da sociedade civil em Brasília, o sociólogo e jornalista Chico de Assis, ex-preso político, disse que a recepção dos amigos e militantes presentes à cerimônia foi de “satisfação”. “A unanimidade das pessoas com quem falei aprovou o resultado. Alguns que no início viram a comissão de uma forma atravessada, reconheceram que hoje havia um trabalho importante para essa busca e continuidade do processo de democratização do País”, contou.
Chico listou três aspectos fundamentais do relatório apresentado. O primeiro é a responsabilização dos cinco ditadores, de forma “clara e evidente”. A segunda, exposta nas recomendações, é a exigência de um pronunciamento político das Forças Armadas. O terceiro é o posicionamento a favor da reinterpretação da Lei da Anistia. “Atingiu o máximo de eficácia que poderia atingir, consideradas as restrições legais com que a Comissão trabalhou desde o início e a resistência de setores, particularmente militares, ainda muito fortes no governo e na sociedade”, pontuou.
O jornalista Marcelo Mário de Melo, ex-preso político, também fez ressalva às limitações de natureza legal da comissão nacional. “Não se trata de covardia, mas dos limites impostos ao seu alcance. Legalmente, na bitola da Anistia Parcial de 1979. Operacionalmente, sem poder atravessar a barreira dos comandos militares quanto ao acesso a arquivos e espaços físicos”, disse. Ele reconhece como importantes as 29 recomendações, que pedem a desmilitarização da polícia e o fim da justiça militar, por exemplo. “Mas estão num contexto onde não há nenhuma vontade política oficial de ir além. Será um documento para arquivo”, avaliou.
O sociólogo Carlos Alberto Soares, também ex-preso político, destacou a simbologia, mas diz que ainda há muito a avançar. “Agora, precisamos divulgar esse relatório para que a população conheça. As instituições devem se organizar, universidades, escolas, para dar visibilidade. O período de atuação da comissão foi curto, ainda é preciso aprofundar muita coisa”, disse.