A maioria das prefeituras tem um problema de fundo invisível para boa parte da população. São repasses que não são feitos e contas que não fecham. Mas o drama vai além dos números e bate de frente com o sofrimento de homens e mulheres que contribuíram durante décadas com as previdências municipais e hoje passam sufoco para receber a aposentadoria. Em cidades como Ribeirão e Palmares, na Mata Sul, a situação atinge níveis extremos, com aposentados e pensionistas desamparados, sem dinheiro para comprar o básico, como remédios ou a feira do mês. Com a imprevisibilidade do pagamento, outro fantasma também os atormenta - o nome sujo na praça.
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Separadas por 37 quilômetros, as duas cidades têm atrasado o pagamento. Em Ribeirão, no mesmo dia em que o prefeito Romeu Jacobina (PR), dois secretários e servidores haviam sido presos por suspeita de fraude na coleta de lixo municipal, uma multidão se reunia em frente à prefeitura em busca de informações sobre pagamento.
Em Palmares, a professora aposentada Rosilda Maria da Silva, 62 anos, passou três meses sem receber e só conseguiu ter acesso por decisão judicial, que bloqueou as contas da prefeitura. Até semana passada, a aposentadoria de outubro não tinha caído na conta. Expectativa é de que seja depositada só no próximo dia 10. Apesar das adversidades, ela conta que a situação não é pior porque conta com ajuda dos amigos para não atrasar as contas. Vizinha dela, a também professora aposentada Maria do Carmo Alcântara, 74, teve que cortar o plano de saúde.
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O constrangimento permeava a voz delas, que repetiram a palavra "humilhação" durante vários momentos da conversa. O lamento é decorrente da independência financeira que cultivaram ao longo da vida e estão perdendo em função dos atrasos. Hoje, se veem vulneráveis ao ter que pedir ajuda para manter o básico. "Até para comer a gente tem que pedir aos amigos. Essa é realidade", diz Rosilda. "Trabalhei 27 anos e a única falta que tenho foi por causa de uma 'quebradura' no braço. Nunca faltei e hoje sou tratada desse jeito", lamentou.
Seu José Justino Alves está com a aposentadoria atrasada e chegou a ficar 90 dias sem receber. Foto: Ricardo B. Labastier/JC Imagem
Arrimo de família, José Justino Alves, 79, mantém a casa com aposentadoria. Além da esposa, os três filhos estão desempregados e moram com ele em Ribeirão. Com a expressão abatida, ele estava em frente à prefeitura à espera de respostas. Os olhos marejaram quando começou a falar. "A gente dorme e acorda ouvindo a conversa do povo dizendo que vai pagar, mas o dinheiro não chega", disse.
PROBLEMAS NA PREVIDÊNCIA
O presidente do Fundo Previdenciário de Palmares, Dgerson Clécio, explica que débito em empréstimos consignados feitos pelos aposentados somam R$ 1 milhão. Atualmente, a cidade tem cerca de 500 aposentados e pensionistas. A folha chega a R$ 1,1 milhão ao mês. Além do repasse das contribuições, a gestão tem que aportar R$ 500 mil mensais para complementar o pagamento. "Não há equilíbrio financeiro nem atuarial."
Em Ribeirão, o presidente do Sindicato dos Servidores Municipais, Moisés de Souza, conta que, no mês de agosto, foi preciso entrar na Justiça para assegurar três folhas salariais e, desde então, o pagamento de ativos e inativos é feito via alvará judicial. Outubro e novembro estão em aberto.
O promotor de Patrimônio Público de Palmares, João Paulo Pedrosa, explica que o problema é porque o número de servidores ativos não cobre a folha dos aposentados nem os repasses da prefeitura estavam sendo feitos."Era, justamente, o que gerava esse problema para o fundo", explicou. Uma ação de improbidade administrativa foi movida pelo MPPE contra o prefeito, João Bezerra (PSB).
O JC tentou localizar, na quinta e na sexta-feira, algum porta-voz da Prefeitura de Ribeirão, mas o prédio estava fechado e os principais interlocutores da área financeira, presos. Em Palmares, o secretário de Finanças não foi encontrado e o prefeito não atendeu às ligações nem deu retorno às mensagens.