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Cena Política

Por Igor Maciel
Cena Política

O problema é o vigia acabar acreditando que é o dono da casa que protege

Confira a coluna Cena Política deste domingo (21)

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Igor Maciel

Publicado em 21/04/2024 às 20:00 | Atualizado em 22/04/2024 às 11:25
Alexandre de Moraes com Lula e Flávio Dino - JOESDON ALVES/AGÊNCIA BRASIL

O vigia que guarda a casa precisa ver a área como um território a ser protegido, e não como sua propriedade. Porque neste segundo caso, os invasores não serão os únicos prejudicados e ele vai acabar atacando até a família que mora ali.

O vigia é o STF, hoje na figura de Alexandre de Moraes. A casa é a democracia. A família que mora ali é o conjunto do povo brasileiro, incluindo os outros poderes daquele coletivo.

Interesses

Caso pareça muito dura a comparação, peço perdão e ofereço uma variação de “defensores”, de vigias, daquele espaço. Ele pode se chamar Joaquim Barbosa ou Sergio Moro também, entre tantos outros com menor proeminência que se arvoram a defender territórios constitucionais como se daquilo dependesse a própria vida, sem declarar nenhum interesse aparente, até se descobrir que o tempo todo eles planejavam algo muito maior do que o salário no fim do dia.

Promotor

Quem vê Alexandre de Moraes abraçado à Constituição e se emociona com essa paixão efusiva dele pela ordem democrática e pela segurança institucional pode não saber que antes de ser enviado ao STF por Michel Temer para ser ministro, ele já ensaiou ser candidato a prefeito de São Paulo.

Na capital paulista, Alexandre era muito conhecido por ter atuado em processos contra Paulo Maluf e ter virado um símbolo contra a corrupção na época. Notou alguma coincidência?

Midiático

Na época em que Maluf foi prefeito, o atual magistrado era promotor de Justiça e sabia usar a mídia para se promover, fazia sempre movimentos midiáticos para alimentar a ideia de que era um paladino da Justiça contra a corrupção.

O ex-prefeito paulistano, que não estava sendo acusado injustamente, é bom que se diga, gritava aos quatro cantos que o promotor tinha interesses políticos para persegui-lo, mas ninguém acreditava porque, afinal, era apenas o velho corrupto Maluf reclamando de perseguição. Credibilidade não era algo que sobrava por ali.

Na política

O tempo mostrou que havia algum sentido na reclamação. Pouco depois, Alexandre virou secretário de segurança pública na gestão de Geraldo Alckmin em SP, depois passou a ser um tipo de secretário especial de tudo na gestão municipal de Gilberto Kassab (PSD) e se articulou para ser candidato à sucessão na prefeitura paulistana.

Alexandre chegou a ser tratado como pré-candidato, (do jeito que Maluf havia dito). Mas se desentendeu com o chefe e deu tudo errado na época.

Ministro

Em seguida, voltou ao cargo de secretário estadual de Segurança em SP e conheceu Michel Temer, ainda vice-presidente, para quem prestou alguns favores. Ficaram próximos. Temer virou presidente e chamou Alexandre para ser Ministro da Justiça. Ele voltou à carga das ações midiáticas.

Em uma de suas primeiras ações como ministro, foi ao Paraguai e apareceu em vídeo, de facão na mão, cortando pés de maconha. Todo mundo já sabia que Alexandre estava construindo sua candidatura para ser governador de São Paulo em 2018, não era segredo.

Supremo

Só não foi às urnas mais uma vez porque o destino cruzou seu caminho. Num acidente aéreo, Teori Zavascki morreu. Temer indicou para o lugar no STF o seu ministro da Justiça. E lá está, hoje, Alexandre de Moraes, causando polêmicas.

Não sem surpresa, porque foi assim que ele sempre trabalhou, realizando atos controversos e midiáticos enquanto discursa sobre proteger o território da democracia, embora todo mundo desconfie que ele pretenda ser o dono da casa.

Barbosa

Joaquim Barbosa foi lembrado aqui neste texto porque muito se fala no desencanto com a política que começou em 2013 com as manifestações. O descrédito da política é a maior tragédia que uma democracia pode enfrentar. É claro que uma grande tragédia dessas não pode ser atribuída a um fator apenas, mas Joaquim, não se pode esquecer, baseava suas decisões no processo do Mensalão sempre em menções à política como covil de “bandidos”, generalizando e declarando que os brasileiros não se identificavam com nenhum partido político.

Demonizava a política, depois filiou-se a um partido político e negociou para ser candidato a presidente em, ao menos, duas ocasiões.

Moro

Sergio Moro também foi na mesma linha. Demonizava a política e os políticos, fez de tudo para ser visto como um símbolo do combate à corrupção no poder público. Ironizava as relações de poder, fazia questão de agir midiaticamente para se transformar em herói nacional que prende os poderosos e, depois de apontar o dedo para o mundo político por anos, hoje faz parte dele.

Já está em seu segundo partido, eleito senador, depois de tentar ser candidato a presidente e ser impedido por colegas de sigla.

Equilíbrio

O que muitos não estão observando é que, no formato em que o Supremo Tribunal Federal se coloca a funcionar atualmente, dirigindo investigações, mandando tomar depoimentos na delegacia e em contato tão íntimo com as forças policiais federais, ninguém pode parar o Supremo. O sistema de freios e contrapesos está completamente desequilibrado.

A justificativa de defender a democracia tem sido utilizada para absolutamente tudo e servido de “explicação técnica” para qualquer ação de desequilíbrio entre os poderes.

Bolsonaristas

Parte da culpa é dos bolsonaristas, que criaram o ambiente para que isso acontecesse quando organizaram os ataques em Brasília e possibilitaram a justificativa para uma reação institucional desse calibre.

Mas a situação começa a ficar esquisita, porque as operações vão se sucedendo, os métodos vão ficando mais ostensivos, menos tradicionais, e a impressão é que essa reação não vai acabar tão cedo, não por ainda haver grande risco à democracia, mas porque o estado de combate permanente é benéfico para as figuras que o sustentam.

Cronograma

Embora não haja qualquer indício disso hoje e poucos toquem no assunto, há quem faça algumas contas nos bastidores, porque ninguém acreditava nisso com Joaquim Barbosa e nem com Sergio Moro também.

Alexandre terá ainda a oportunidade de ser presidente do STF e, sendo assim, seu mandato comandando o Judiciário do país terminará em 2029, quando ele terá apenas 60 anos. Aí poderá escolher entre passar mais 15 anos no Supremo ou tentar um novo voo, finalmente, na política eleitoral.

Em 2030, lembrem-se, tem eleição para presidente da República.

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