Juro alto? E o preço da carne? Lula também reclamou. Veja o que aconteceu com sua popularidade.

Elegendo um inimigo de quem a população já não gosta, enquanto se preocupa com a "feira do pobre", o sucesso é certo. Depois vêm as consequências.

Publicado em 10/07/2024 às 20:00 | Atualizado em 10/07/2024 às 23:40

Em seu pior momento na pesquisa Genial/Quaest, Lula (PT) chegou a ver sua aprovação quase empatar com a desaprovação. Agora, houve um descolamento e uma distância de 9 pontos percentuais entre menções positivas e negativas. Chegar a 54% de aprovação é uma vitória para o petista e dá mais estabilidade política às ações do governo e ao país.

Impopularidade de presidente só é notícia boa para quem é político de oposição. O cidadão comum, que paga impostos, faz feira no mercado e depende do preço da gasolina para trabalhar, ganha mais com a estabilidade. Isto é algo lógico. A polarização eleitoral das últimas décadas, primeiro entre PT e PSDB e depois dos petistas com os bolsonaristas, é que deixou todo mundo meio cego para a lógica das coisas.

Tem método

Mas, para comemorar, é preciso que a pesquisa seja muito bem interpretada. Porque, no caso da Quaest, ela traz algumas preocupações em seus números que precisam ser observadas quando populistas ocupam o poder.

Nas últimas semanas, Lula iniciou uma estratégia bem específica. A coluna Cena Política já havia adiantado que o presidente teve acesso a uma pesquisa apontando que a “popularidade” do Banco Central não era muito boa e que as pessoas entendiam os juros como algo ruim. Foi um pouco antes de começarem os mais recentes ataques ao BC e a Roberto Campos Neto. Ele sabia o que estava fazendo.

Contra os juros

Em Brasília até o acaso é combinado com antecedência. Lula não acordou em um dia e resolveu que estava cansado dos juros. Não foi por acaso, também, que ele aproveitou o mesmo momento em que reclamava dos juros para criar a ideia da “carne que o pobre come” sem imposto.

Tudo o que Lula fez está bem fundamentado pelos números que a Quaest apresentou esta semana, onde 84% dizem concordar com o presidente que a carne deveria ter isenção de tributo.

Outro dado desta pesquisa mais recente é que 66% concordam com as críticas ao BC e 87% também reclamam que os juros são altos.

Bolsolulistas

Dentro da polarização tão forte, um dado desse levantamento é ainda mais surpreendente. É que 51% dos eleitores que votaram em Bolsonaro no ano de 2022 concordam com as críticas que Lula faz ao Banco Central.

A rejeição à instituição é algo que transcende até mesmo o acirramento político atual. Os bolsonaristas não gostam de Lula, mas gostam menos ainda do órgão responsável pela taxa de juros no país.

Sendo “advogado do diabo”, esses números são uma grande janela de oportunidade política. Dá para aproveitar isso e buscar uma sintonia entre “a luta de Lula contra os juros” e os bolsonaristas, por exemplo.

Herói e vilão

Mas o olhar do diabo é carregado de consequências éticas, morais e financeiras, por isso é preciso ter muita cautela. Aproveitando esses números, um profissional de marketing contratado apenas para dar uma guinada na popularidade do presidente pode deitar e rolar. Basta que Lula se mostre “preocupado com a feira dos pobres”, com o imposto da carne no balcão do açougue, com “três refeições por dia” e ao mesmo tempo, quase na mesma página, reclame dos juros, do mercado, dos especuladores e de Roberto Campos Neto.

Elegendo um inimigo de quem a população já não gosta, enquanto diz que se preocupa com a "feira do pobre", o sucesso é certo. Depois vêm as consequências.

Consequências

As agressões ao mercado e à política do Banco Central fazem o dólar pipocar, o dólar vai pressionar a inflação e aquele mesmo povo pobre que o presidente se arvora em defender é o que mais vai penar com a implosão do poder de compra no médio e no longo prazo. Depois de um tempo ninguém compra carne, com ou sem imposto.

É pra ter ciúme

A sensação de ter a popularidade voltando é tão boa que um político populista pode manter a estratégia e seguir prejudicando a economia apenas para ser visto como um “herói” por mais tempo. E seria assim, se ninguém tivesse convencido Lula.

O que aconteceu na semana passada, ao que parece, é que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), conseguiu fazer o chefe enxergar o prejuízo posterior. E só assim o presidente recuou um pouco, o dólar baixou e estabilizou.

Não é por acaso que a cúpula do PT tem ciúmes de Haddad. Convencer um populista a ser responsável, independente de quais tenham sido os argumentos, é um feito considerável.

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